Suspeição evidente

Zanin não deve julgar ação bilionária do governo de ex-cliente em Alagoas

Ministro já defendeu Paulo Dantas, cliente de sua esposa, e herdou Relatoria de ação que disputa R$ 2 bilhões de outorga em Maceió

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Governador de Alagoas, Paulo Dantas (MDB), cumprimentou seu ex-advogado, Cristiano Zanin, após a posse do novo ministro do STF. Foto: Divulgação/Agência Alagoas

Um dos primeiros conflitos éticos resultantes do histórico profissional do novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Cristiano Zanin, deve resultar em sua autodeclaração de suspeição na ação em que a Prefeitura de Maceió tenta redistribuir R$ 2 bilhões de uma outorga de saneamento paga ao Governo de Alagoas. O motivo é o fato de o ex-advogado Zanin ter herdado a relatoria deste processo de interesse direto do governador Paulo Dantas (MDB), que foi seu cliente e hoje é defendido pela sua esposa, Valeska Martins.

Zanin atuou na defesa de Dantas, no caso em que o político é acusado de liderar um esquema de corrupção que desviou R$ 48 milhões da Assembleia Legislativa de Alagoas, quando reverteu a decisão que afastou o governador em plena campanha de reeleição, em 2022.

Advogada Valeska Martins e seu marido e ministro Cristiano Zanin posaram com governador de Alagoas, Paulo Dantas, entre convidados para a posse no STF. Foto: Divulgação/Agência Alagoas

O indiciamento do  govenador aliado do presidente Lula (PT) e afilhado político do senador e ministro dos Transportes Renan Filho (MDB) foi oficializado pela Polícia Federal em 19 de julho, no âmbito da Operação Edema. Ocasião em que a esposa de Zanin emitiu nota em defesa de Paulo Dantas. 

O dever de imparcialidade imposto pela legislação brasileira a qualquer magistrado deve ser objeto da reflexão de Zanin, podendo ele concluir ser suspeito para julgar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 863, por causa de sua antiga relação contratual com o governador interessado na causa, ou do fato de sua esposa Valeska ser a atual defensora de Paulo Dantas. Tudo isso previsto pelo Artigo 145 do Código de Processo Civil (CPC).

“Zanin é um jovem e talentoso advogado, defensor do estado democrático de direito, que, por meio da sua idônea carreira, mostrou ter total competência para ocupar esta cadeira. Desejo sucesso ao novo ministro”, elogiou Paulo Dantas, em declaração divulgada oficialmente pelo site do Governo de Alagoas.

Disputa bilionária

Um dos mais de 500 processos herdados por Zanin do ministro aposentado Ricardo Lewandowski, a ADPF 863 foi ajuizada em 2021 pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), que era liderado pelo rival de Paulo Dantas em Alagoas, o prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, o “JHC” (PL). À época, Renan Filho governava Alagoas. E o próprio Município administrado por JHC figura como parte da ação, como amicus curiae.

Em maio do ano passado, quando Paulo Dantas era governador-tampão após a renúncia de Renan Filho, o Plenário do STF concluiu, por unanimidade, que os R$ 2 bilhões da outorga deverias ser redistribuídos entre todos os municípios da Região Metropolitana de Maceió, deixando de se concentrar totalmente dos cofres estaduais.

A decisão que segue sendo questionada no STF retirou do governador de Alagoas o poder de definir a destinação de investimentos resultantes da outorga paga pela BRK Ambiental, para exploração dos serviços de saneamento na região.

Os ministros seguiram o entendimento do relator Edson Fachin, que já havia bloqueado R$ 1 bilhão do montante, em 26 de novembro de 2021, ao reconhecer o direito das prefeituras da Região Metropolitana de Maceió de ter acesso aos recursos. A conclusão foi de que contrariam a Constituição Federal, tanto o convênio entre o Estado de Alagoas e a Região Metropolitana de Maceió, quanto o Contrato de Concessão firmado entre o governo estadual e a BRK Ambiental.

A Corte modulou os efeitos da decisão para que tenha vigência em 24 meses, a fim de que a repartição das receitas deva aguardar a reformulação do desenho institucional da Região Metropolitana de Maceió, pelo Legislativo de Alagoas. A matéria foi analisada no julgamento conjunto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6573 e 6911, ajuizadas, respectivamente, pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e pelo Progressistas (PP).

Após aposentadoria de Lewandowski, o caso seguiu tramitando no STF, tendo a ministra Cármen Lúcia como relatora, nas últimas movimentações.

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