ASSESSOR SEM CARGO

Suposto ‘amigo’ de chefe da Polícia diz articular operações, em Alagoas

Promessa de operação em nome de delegados sequer vira inquérito

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Sem cargo algum no Estado, um informante da Polícia Civil de Alagoas, Wellington de Lima Spinellis, disse ter o poder de articular operações policiais no Estado, ao abordar uma mulher vítima de assalto, que prestava queixa na Delegacia de Roubos de Maceió, em setembro. A Polícia Civil teve conhecimento dos fatos, oficialmente, através de um boletim de ocorrência, mas sequer abriu inquérito para investigar ao menos a queixa de difamação.

A vítima da abordagem, que é uma policial militar, negou o oferecimento de ajuda para solucionar o caso, recuperando celulares. E o homem reagiu em tom de desaforo, enviando um áudio pelo aplicativo WhatsApp, no qual dizia ser amigo do delegado-geral Paulo Cerqueira, sob o aval do qual disse articular operações policiais em Alagoas.

Na gravação que circula nas redes há quase um mês, o autointitulado “assessor” do chefe da Polícia Civil de Alagoas afirma que, sem sua ajuda, ele mandaria o delegado chefe do Núcleo de Inteligência da Polícia Civil, Fabrício Lima do Nascimento, “recolher as situações” e não incluir em operação nenhuma.

E terminou o áudio rindo da vítima de violência, depois de dizer que tinha uma equipe ao seu dispor e de duvidar que delegado nenhum iria atrás de recuperar celular roubado. 

Ouça:

POLÍCIA PERDOOU

Paulo Cerqueira e Fabrício Lima não viram crime (Foto: Ascom PC)Um boletim de ocorrência chegou a ser confeccionado pelo delegado Thiago Prado, prestando queixa de difamação contra Paulo Cerqueira e Fabrício Lima do Nascimento, a pedido deste último, que o acompanhou e relatou os fatos. Mas a queixa prestada em 16 de setembro não evoluiu para a abertura de inquérito.

Segundo a assessoria da Polícia Civil, o delegado-geral não tem relação de amizade com Spinellis, além do tratamento entre delegado e informante, em algumas ocasiões. E justificou não ter buscado responsabilizar seu “amigo” pela atitude tomada dentro de uma delegacia, utilizando seu nome, porque “não viu indício de autoria de crime”. Tal conclusão foi de ambos os delegados citados no áudio.

“Fizemos o BO, conversamos com a pessoa do áudio, que nos esclareceu o ocorrido como um mal entendido e desculpou-se pela forma que falou… Então, o BO não gerou procedimento”, confirmou o delegado Fabrício Lima, ao simplificar o resultado da ocorrência, para o Diário do Poder.

Thiago Prado não quis se pronunciar sobre o assunto, alegando estar de férias e sem informações.

Veja o boletim de ocorrência:

'SÓ FALTA O CARGO'

O Diário do Poder conversou com o bacharel em Direito, Wellington Spinellis, que confirmou ser dele a voz na gravação e se mostrou incomodado pelo fato de a vítima não ter aceitado sua ajuda. Ele reafirmou que é “amigo particular” e trabalha com o delegado-geral Paulo Cerqueira há muitos anos, sem ter cargo público no Estado. (Ouça no final da matéria)

Spinellis negou receber salário por “serviços” que disse ter prestado para Paulo Cerqueira. Ele admitiu ter errado, em dizer ser assessor do chefe da Polícia Civil. Mas, mesmo assim, diz só lhe faltar o cargo. “Eu trabalho para o doutor Paulo há um tempão. Só que ele nunca me deu o cargo de assessor. Trabalhei com ele diretamente”, admitiu ao Diário do Poder.

Wellington Spinellis disse que entre suas funções na Polícia Civil estavam “botar no sistema”, sem dar maiores explicações sobre que sistema nem quais informações. Antes disso, negou manipular dados ou interferir em interceptações telefônicas, como foi interpretado por integrantes da Polícia Civil os trechos de sua fala sobre pedir ao chefe da Inteligência para “botar dentro de uma situação, de uma operação, para resgatar os celulares” e que pediria para “recolher as situações de lá e não botar em operação nenhuma”.

Quando questionado sobre qual seria o tipo de serviço prestado, Spinellis afirmou que seria “complicado” explicar. E pediu que a reportagem procurasse o próprio Paulo Cerqueira para explicar.

Ele diz ser alvo de perseguição por estar em campanha para as eleições de 2018. E também atribui a repercussão de seu áudio nas redes sociais, porque ele teria incomodado delegados ao dizer que estes não resolviam alguns casos. “Tomei uma situação da menina, no dia, aí eu disse: vou botar uma pessoa, porque os delegados comuns não resolvem esse tipo de coisa. Ajudando a ele, a encontrar os celulares dela. Foi só isso. Aí, pegaram esse áudio aí e fizeram essa zoada toda. E eu ajudando o povo, me botando como se eu fosse um qualquer”, disse Wellington Spinellis.

CLIENTELA SEM OAB

Sem registro na Ordem dos Advogados do Brasil, o autointitulado assessor informal de Cerqueira diz ter como renda o que “seus clientes” pagam para que atue em processos assinados por outros advogados, fruto de seus plantões em delegacias e contatos com lideranças comunitárias.

Sobre a existência de um BO com queixa de delegados contra ele, relativa ao áudio enviado para a vítima do crime, Wellington Spinellis disse achar que seria mentira. Mas confirmou ter sido chamado e reepreendido pelo delegado Paulo Cerqueira.

Ouça na íntegra a entrevista de Spinellis concedida ao Diário do Poder:

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