Renan diz que depoimento de Marconny é o mais “cínico” desde o início da investigação

O relator da CPI afirmou que a proposta de relatório, cuja entrega está prevista para a semana que vem, deve incorporar as contribuições de um grupo externo de personalidades

Os senadores presentes à reunião da CPI da Pandemia desta quarta-feira (15) mostraram indignação com o depoimento de Marconny Albernaz de Faria, acusado de fazer lobby na negociação de contratos da Precisa Medicamentos com o Ministério da Saúde. Em diversas respostas, Marconny foi evasivo, alegou esquecimento ou invocou o direito ao silêncio obtido em habeas corpus do Supremo Tribunal Federal. Isso levou o relator Renan Calheiros (MDB-AL) a qualificar o depoimento como o mais “cínico” desde o início da investigação.

Duas semanas atrás, Marconny havia apresentado um atestado médico para não comparecer à CPI, levando a comissão a ameaçar trazê-lo “sob vara” (coerção judicial).

O depoente foi vago em relação à sua atividade profissional, limitando-se a dizer que tem uma “empresa de assessoramento técnico-político” que faz “análise de estudos de viabilidade política” para empresas privadas.

— Pelo fato de eu ser de Brasília, fiz uma análise de viabilidade técnico-política para a Precisa, que tinha como objetivo aquisição de testes rápidos para detecção de covid-19 — limitou-se a explicar.

Marconny negou ser lobista, dizendo que seria péssimo na função, o que levou o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), a gracejar, comparando-o a Coiote, personagem de desenho animado que persegue em vão o Papa-Léguas.

Irritado com as evasivas do depoente, Omar Aziz lembrou um vídeo da internet em que Marconny aparece discursando em tom veemente em manifestações pró-governo:

— Para subir em caminhão para falar mal de político, aí é macho. Mas quando o calo aperta, aí o cabra não é mais macho. Vai ao Supremo, tem diarreia, pede atestado médico. Chega aqui, a conversa é diferente.

Marconny pertenceria a um grupo, formado pelo deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), pelo ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias, pelo ex-secretário da Anvisa José Ricardo Santana e outros, suspeitos de operar em licitações.

Em mensagens de julho de 2020, obtidas pela CPI, Marconny conversa com Santana sugerindo “a arquitetura ideal”, aparentemente para direcionar um processo de licitação de compra de testes rápidos contra covid-19, eliminando concorrentes para atingir um resultado desejado. A licitação foi abortada pela Operação Falso Negativo, do Ministério Público do Distrito Federal.

O depoente disse não ter “nenhuma relação” com Roberto Ferreira Dias, embora o chamasse de “Bob” e o tenha recebido em sua casa para tratar da licitação, como demonstram as mensagens.

Visitas ao Senado

Em determinado momento, Marconny afirmou não conhecer nenhum senador da República, embora nas mensagens de seu celular ele faça referência a conversas com um “senador”. Para esclarecer a questão, Leila Barros (Cidadania-DF) pediu que a Polícia Legislativa levantasse o registro de todas as entradas de Marconny nas dependências do Senado.

Respondendo a Alessandro Vieira (Cidadania-SE), Marconny admitiu ter comemorado seu aniversário no camarote de Jair Renan Bolsonaro, filho do presidente da República, no Estádio Mané Garrincha, em Brasília. Quando ressalvou que a festa não era ilegal, Alessandro rebateu:

— A ilegalidade não está na festa, está no que se consegue nas festas. Elucida-se por que vale a pena contratar o Marconny. O Marconny é o cara que vai para o churrasco com a advogada do presidente [Karina Kufa] e que faz a sua festa de aniversário no camarote do filho do presidente.

Jean Paul Prates (PT-RN) ameaçou o depoente de prisão por seu comportamento:

— Não abuse da paciência dos senadores, não zombe da legitimidade dos que o povo elegeu.

Relatório

O relator Renan Calheiros não descartou a possibilidade de estender as apurações da CPI caso apareçam fatos novos. Ele afirmou nesta quarta que a proposta de relatório, cuja entrega está prevista para a semana que vem, deve incorporar as contribuições de um grupo externo de personalidades, coordenado pelo jurista Miguel Reale Jr., autor do pedido de impeachment de Dilma Rousseff. (Agência Senado)