Petrobras não usou regra antipropina criada 6 meses antes da Lava Jato
Cláusula não prevê punição caso regra seja violada
Envolvida em um esquema de corrupção que já resultou em prejuízo reconhecido de mais de R$ 6 bilhões, a Petrobrás adotou uma “cláusula antipropina” seis meses antes de a Polícia Federal e o Ministério Público Federal revelarem os primeiros resultados da investigação da Operação Lava Jato, em março de 2014. A medida, no entanto, não implica em rescisão contratual com quem desrespeitá-la.
Em um dos contratos a que o Estado teve acesso, a estatal diz que a empresa contratada confirma não ter oferecido e se compromete a não oferecer “qualquer pagamento, presente, entretenimento, viagem, promessa ou outra vantagem” a indivíduos ou entidades ligadas ou não à administração pública, “inclusive partido político, membro de partido político, candidato a cargo eletivo”.
Pelo contrato, a empresa se compromete ainda a informar “imediatamente” à Petrobrás sobre instauração e andamento de investigações, processos administrativos e judiciais para apuração de atos ilícitos. Ao assinar o documento, a empresa contratada assume ainda a responsabilidade por atos cometidos por suas controladas, controladoras, empregados e prestadores de serviço.
Ao contrário de outras cláusulas, no entanto, a Petrobrás não estabelece punições para casos de desobediência ao que foi acordado. No trecho que, por exemplo, determina que a empresa contratada não pode manter sócio que seja cônjuge ou parente até terceiro grau que tenha função de confiança na Petrobrás, ou que seja responsável pela contratação, consta que “o descumprimento da obrigação acima acarretará multa ou rescisão contratual”.
A Petrobrás informou que a cláusula antipropina está em todos os contratos de obra, serviço ou compra firmados há quase dois anos. “Em alinhamento com as normas anticorrupção, a Petrobrás fez constar a cláusula em questão em sua minuta contratual padrão a partir de setembro de 2013”, informou a estatal em nota.
Em balanço divulgado pela Petrobrás em abril, a estatal estimou em R$ 6,194 bilhões o prejuízo em razão de corrupção entre 2004 e 2012, ou seja, antes da vigência da cláusula antipropina. Executivos das empresas investigadas chegaram a ficar presos por até seis meses, mas foram soltos no final de abril por decisão da maioria da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal.
Estatais. Outras estatais também adotam “vacinas” contra corrupção em seus contratos. O Banco do Brasil informou que, desde agosto de 2014, traz em seus contratos cláusula em que a empresa contratada afirma ter ciência da Lei 12.846/13, conhecida como Lei Anticorrupção. O banco diz que todos os seus contratados devem assinar Termo de Compromisso de Responsabilidade Socioambiental e Combate à Corrupção.
A Caixa disse incluir nos editais de todas as suas licitações o “Termo de Compromisso de Combate à Corrupção e ao Conluio entre Licitantes e de Responsabilidade Socioambiental”.
A Eletrobrás informou ter um programa anticorrupção em andamento e que os contratos com fornecedores e acordo de acionistas firmados pela empresa têm cláusulas que previnem a prática de corrupção, conforme determinam o Foreign Corrupt Pratices Act (FCPA), lei norte-americana, e a Lei Anticorrupção.
Após denúncias de corrupção na cúpula da Petrobrás decorrentes de investigações da força-tarefa da Operação Lava Jato, a estatal criou a Diretoria de Governança, Risco e Conformidade em 19 de janeiro deste ano. A nova estrutura tem a função de assegurar a conformidade dos projetos da estatal e mitigar riscos de fraudes e corrupção. Sob o comando do novo diretor João Elek, estão três gerências executivas.
Entre as atribuições de Elek está a atuação no Comitê Especial, criado pela empresa para auxiliar e intermediar as investigações independentes realizadas por dois escritórios de advocacia contratados pela estatal. Integram o comitê a ex-ministra do Supremo Ellen Gracie e o ex-executivo da Siemens Andreas Pohlmann.
Elek foi escolhido entre 77 candidatos selecionados pela empresa Korn Ferry, especializada em seleção de executivos. Ele ficará no cargo por três anos, prorrogável pelo mesmo período. Elek atuou por mais de 20 anos no Citibank, e também passou por grandes empresas privadas na área de diretoria financeira. (AE)