Operação Casmurro

PF combate desvio milionário do ensino de Alagoas, na pasta do vice de Renan Filho

R$ 8,5 milhões foram desviados do transporte escolar,e dano pode superar R$ 21 milhões

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Em conjunto a Controladoria Geral da União (CGU) e o Ministério Público Federal (MPF), a Polícia Federal deflagrou em Alagoas, na manhã desta terça-feira (10), a Operação Casmurros, nas cidades de Maceió, Arapiraca, Boca da Mata, Rio Largo e São Miguel dos Campos. O objetivo da ação que reuniu mais de 100 policiais para prender 15 suspeitos é combater desvios estimados em R$ 8,5 milhões, que podem superar R$ 21 milhões, em recursos federais para o ensino público, através de contratos fraudados, com superfaturamento e pagamentos ilegais, na Secretaria Estadual da Educação (Seduc) do governo de Renan Filho (MDB), comandada pelo seu vice Luciano Barbosa (MDB).

A investigação sobre contratos com empresas que se revezaram entre 2017 e 2019 apurou desvios de recursos públicos do Programa Nacional de Apoio ao Transporte do Escolar (PNATE) e do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação Básica (FUNDEB), entre o primeiro e este início do segundo mandato de Renan Filho.

Segundo a PF, a apuração começou em abril de 2019, após fiscalização da CGU identificar que a organização criminosa fraudou licitações para obter contratos com a Secretaria de Educação do Estado de Alagoas para execução do serviço de transporte escolar da rede pública estadual de ensino.

Os processos administrativos que antecederam contratos celebrados com as empresas, apresentam indícios de dispensa indevida de licitação, direcionamento da contratação, fraude e manipulação processual, sobrepreço, subcontratação irregular, pagamentos sem cobertura contratual e pagamentos sem documento hábil para liquidação e fraudes com superfaturamento na execução dos contratos.

Sem citar nomes, a PF relatou ainda que a participação de servidores públicos, por ação ou omissão, era condição necessária para o sucesso do esquema criminoso e se materializava na inobservância de requisitos exigidos para contratação das empresas, ausência de fiscalizações adequadas das execuções de contratos e até mesmo mediante falsidades ideológicas, em atestados e ou declarações inseridas em processos de pagamento e de dispensa emergencial de licitação.

R$ 110 milhões em contratos emergenciais 

Na execução dos serviços, os alunos foram prejudicados pela precária condição de segurança de parte da frota, situação provavelmente decorrente do repasse insuficiente de recursos aos efetivos transportadores por parte da contratada. Também há registro de superlotação em algumas rotas e ausência de veículos em outras, o que resulta em faltas e abandono escolar.

Os prejuízos sociais são potencializados pelos frequentes protestos dos transportadores, que alegam atraso e falta de pagamentos, e pelo não recolhimento de tributos, incluindo contribuições previdenciárias dos motoristas.

A soma dos valores pagos em decorrência das contratações emergenciais desde janeiro de 2017 alcança um montante de cerca de R$ 110 milhões, dos quais já foram identificados pelos investigadores exatos R$ 8.515.467,60 em superfaturamento. O prejuízo total estimado aos cofres públicos pode ultrapassar R$ 21 milhões.

Estão sendo cumpridos 26 mandados de busca e apreensão, 15 mandados de prisões temporárias, bem como de afastamento temporário do cargo ou função pública de sete servidores da Secretaria Estadual de Educação e da Agência de Modernização da Gestão de Processos (Amgesp), expedidos pela 13ª Vara Federal do Estado de Alagoas.

Apreensão de dinheiro pela Polícia Federal na Operação Casmurro, em Alagoas. Foto: Ascom PF

Participam da Operação Casmurros 114 Policiais Federai e 11 auditores da CGU. E a PF explicou que o nome da Operação Casmurro, embora remeta imediatamente ao apelido do personagem Bentinho da obra de Machado de Assis, qualifica o sujeito teimoso, obcecado, turrão etc. Mesmas característica observadas em alguns dos servidores públicos envolvidos, que a despeito de pareceres contrários da Procuradoria Geral do Estado (PGE) para contratação das empresas investigadas, resistiam e insistiam em busca de brechas no processo administrativo que permitissem a contratação.

Defesa

Procurado pelo Diário do Poder, o vice-governador e secretário da educação de Alagoas, Luciano Barbosa, disse que está se inteirando da situação, para poder fazer uma nota com o inteiro do teor dos acontecimentos. “O que posso te dizer por hora é que eu sempre trabalhei para acabar com esse contrato e municipalizar o transporte. Acabamos de comprar 100 ônibus para a capital. Se houvesse qualquer interesse no contrato com uma empresa não haveria essa compra. E quem conhece o dia a dia da secretaria sabe que a gente prioriza e quer a municipalização como única forma de ter uma fiscalização mais de perto sobre a necessidade de transporte para os estudantes”, declarou, em mensagem pelo aplicativo Whatsapp, enquanto se deslocava de Arapiraca para Maceió, pela manhã.

A Seduc divulgou a seguinte nota de esclarecimento:

A Secretaria de Estado da Educação (Seduc) vem a público informar que a empresa de transporte escolar Bioética, investigada pela Polícia Federal, foi desabilitada de processo administrativo pela Amgesp (Agência de Modernização da Gestão de Processos) em 2017. Entretanto, decisão judicial obrigou o Estado a reincluí-la no certame. Adiante, em dezembro de 2018, com o processo licitatório do mesmo ano em curso, a empresa Bioética mais uma vez foi à Justiça e conseguiu decisão em caráter liminar para obrigar o Estado a manter o seu contrato. Em março, foi proferida uma decisão judicial em 1ª instância determinando, novamente, a manutenção do contrato (processo nº 0700295-34.2018.8.02.0066), sob pena, em não cumprimento, de pagamento de multa diária. Vale ressaltar que a Procuradoria Geral do Estado recorreu de todas as decisões, buscando defender o interesse público. Os servidores públicos do Estado de Alagoas, no exercício de suas funções, cumpriram decisões judiciais.

Decisões judiciais à parte, vale enfatizar que desde 2015 a intenção do Estado sempre foi reduzir a dependência de empresas terceirizadas. Para tanto, iniciativas foram tomadas:

  1. Prioridade absoluta para a municipalização dos recursos do transporte escolar, o que resultou na adesão de 80% das cidades alagoanas ao Programa de Gestão Integrada do Transporte Escolar (GEITE);
  2. A Secretaria de Educação comprou 100 ônibus para o transporte escolar, com recursos próprios, reduzindo as contratações terceirizadas. A aquisição foi feita mediante adesão à ata do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), nas mesmas condições do programa federal Caminhos da Escola. Isso possibilitou o atendimento a 100% das escolas da cidade de Maceió;
  3. Além dos ônibus, um Processo Seletivo Simplificado foi realizado para selecionar motoristas para a frota própria;
  4. Outro forte indicativo é a redução da despesa com transporte escolar terceirizado: em valores atualizados, em 2014 foram gastos mais de 69,5 milhões de reais com o serviço, enquanto que em 2018 foram pagos R$ 37,6 milhões. Em 2019, foram gastos R$ 19,5 milhões até agora.

Por diversas vezes, houve paralisação de transporte escolar por parte da empresa contratada alegando atraso de pagamento, colocando os estudantes contra a secretaria como meio de chantagem para acelerar o recebimento de parcelas.

Diante do exposto – decisões judiciais, trabalho do Estado para reduzir a terceirização e a prática de chantagem por parte da empresa –, fica evidente que o Estado tem defendido o interesse público, o que significa garantir o transporte escolar público de qualidade para os estudantes.

Seguimos inteiramente à disposição dos órgãos de controle para todo e qualquer esclarecimento.

(Com informações da Comunicação Social da PF em Alagoas)

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