A higiene íntima e o papel do Estado

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Estamos terminando o mês de outubro, de cuidados com a mulher, de campanhas de prevenção, de políticas públicas pra tentar garantir dignidade e proteção às mulheres. Nesse contexto, uma expressão nunca foi tão propalada: pobreza menstrual. A dificuldade de acesso a absorventes, essenciais para a higiene íntima da mulher, deixou de ser apenas uma questão pessoal. É agora um problema de saúde pública e também de educação.

No Brasil, 13 Estados e o Distrito Federal já contam com projetos para distribuição gratuita de absorventes para estudantes e mulheres em situação de vulnerabilidade. Sergipe e Tocantins também estão elaborando propostas.

O problema é sério, mas nunca foi tratado com o devido respeito e preocupação. A maioria da população sequer havia ouvido falar dessa expressão.

Pesquisa feita por uma indústria multinacional do setor de higiene pessoal revelou que 40% das mulheres são afetadas ou conhecem alguém que sofre com a pobreza menstrual. Sem acesso ao pacote completo que garante uma higiene adequada, como absorventes, papel higiênico, água tratada e banheiros, muitas mulheres colocam a própria saúde em risco ao utilizar algodão, toalhas de papel, toalhas de tecido, jornal e até miolo de pão para conter a menstruação. A mesma pesquisa mostra que no período de um ano 28% das mulheres tiveram infecções urinárias ou cistite, 24% foram diagnosticadas com candidíase, 11% com infecções por fungo e 7% com infecções bacterianas.

Debater esse assunto sem meias palavras já pode ser considerado um avanço. A criação de leis estaduais para combater esse mal então, é motivo de comemoração.

O tema ganha espaço no mundo inteiro. Para o Fundo de População das Nações Unidas e o Fundo das Nações Unidas para a Infância, olhar para a pobreza menstrual é fundamental para contribuir para a promoção da saúde e dos direitos sexuais e reprodutivos, do direito à água e saneamento e da autonomia.

Considero alarmante o cenário brasileiro, que aponta para o fato de que cerca de 13,6 milhões de habitantes (cerca de 6,5% da população) vivem em condições de extrema pobreza, ou seja, sobrevivendo com menos de U$ 1,90 por dia (o equivalente a R$ 151,00 por mês segundo cotação vigente em 2019) e cerca de 51,5 milhões de pessoas estão abaixo da linha de pobreza (1 a cada 4 brasileiros vivendo com menos de R$ 436,00 ao mês). A necessidade de enfrentamento da pobreza e redução das desigualdades incorpora urgência ao tratamento do problema da pobreza menstrual e seu impacto nas futuras gerações.

O fenômeno da pobreza menstrual demonstra que negligenciamos as condições mínimas para a garantia da dignidade da pessoa humana ignorando as necessidades fisiológicas de cerca de metade da humanidade, as meninas e mulheres. A partir dessa negligência, pode surgir a urgência de remediar os problemas que seriam facilmente prevenidos com os devidos investimentos em infraestrutura e acesso aos produtos menstruais. Além disso, necessitamos de políticas públicas que garantam mais do que doações de absorventes às mulheres, mas que determinem o suporte necessário do Estado para que elas tenham independência financeira para comprar o que precisam – ou o que desejarem- sem depender de ninguém.

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