Arte

Indiano Anish Kapoor faz no Porto sua primeira exposição em Portugal

Kapoor é o mais premiado artista contemporâneo do mundo

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“Sky Mirror” (Espelho do Céu), em aço, espelho côncavo que reflete imagens conforme a posição de cada um.

Porto – Trazer o céu para a terra, contemplar um buraco azul intenso como quem olha para o limbo, a exemplo do Cristo de Dante descendo às profundezas, fazer uma viagem como se estivesse no interior do corpo humano e conversar com os pássaros em cima de uma torre, num bosque. Tudo isso é possível e se viu ontem quando Anish Kapoor, o mais premiado artista contemporâneo do mundo, apresentou sua primeira exposição individual em Portugal, no Museu de Serralves, no Porto, projetado pelo pritzker da arquitetura portuguesa, Siza Vieira.
Simpático, franzino, cabeleira branca flutuando a cada gesto e vestido simplesmente, com T-Shirt e calças pretas desbotadas, Anish Kapoor apresentou rapidamente sua exposição à imprensa local e estrangeira ainda no interior do museu,mas ainda sem conversar com os jornalistas. Denominada “Anish Kapoor: Obras, Pensamento, Experiências”, a exposição é composta por quatro grandes obras instaladas nos jardins, uma no museu, onde ainda estão 56 maquetes de obras realizadas pelo artista ao longo dos seus 40 anos de trabalho artístico.

Anish Kapoor durante coletiva no Porto.

Anish nasceu em Mumbai em 1954, mas mudou-se para Londres, onde desenvolveu sua carreira e vive até hoje. Possui obras nos mais importantes museus do mundo e sempre surpreende pelo ineditismo de suas criações. Desta vez não foi diferente. Ele mesmo guiou pelos jardins do museu um batalhão de jornalistas com sua parafernália para registrar tudo o que ele faria e diria pelo caminho, percurso ao sol, à sombra das imensa árvores, cruzando lagos, pequenos riachos e, às vezes, saltando de pedra em pedra.
Incansável nos seus tênis prateados, Anish fez a primeira parada em frente ao “Sky Mirror” –Espelho do Céu. Construído em aço inoxidável, o enorme espelho côncavo refletia diferentes imagens conforme a posição de cada um. Ora contemplava-se um límpido céu azul, com nuvens em marcha, ora bandos de pássaros cruzando o espaço ou as copas das árvores flutuando na brisa fria da manhã. Todos encantados e concentrados na peça, aproveitando a experiência de ver o céu tão perto, repousando na imensidão dos verdes jardins.
A caminhada continuou em direção à obra “Language of Birds” – Linguagem das Aves – uma torre com uma escada em espiral, inspirada no minarete da Grande Mesquita de Samarra, para conversar com os pássaros da região. Mas, desta vez, quem se surpreendeu foi o artista. No alto da torre, estava Pedro Henrique, um chamador de pássaros, que se conectou com oito deles, como o Carriças, considerado o Pavarotti das aves. Anish ficou de boca aberta, fotografou os vários momentos da apresentação, destacando haver na sua obra uma idéia xamânica de que as espécies são capazes de se comunicar umas com as outras.
Depois do espetáculo inédito, o grupo deu meia volta em direção à terceira obra.”Descent into Limbo” – Descida para o Limbo – a mais antiga do conjunto, inspirada na obra homônima do pintor renascentista Andrea Mantegna, é um buraco azul intenso, dentro de uma construção quadrada de concreto – que infelizmente será derrubada no término da exposição. Imediatamente pensei no buraco de 200 metros aberto no museu de Inhotim, pelo artista Douglas Aitkel, chamado “Sons da Terra”, que as crianças adoram ouvir. Mas, neste caso, Anish buscou o jogo formal e metafórico entre a luz e a escuridão, o exterior e o interior, o conteúdo e o infinito.
A última obra apresentada nos jardins, espalhados por 18 hectares, foi o grande cubo vermelho e preto, intitulado “Corpo Seccional”, que propõe uma reflexão sobre o corpo. Devido à falta de espaço, o grupo entrou aos poucos, onde o cinzento do exterior se transforma em objetos vermelhos no interior. É como se viajássemos por dentro do corpo humano. Em seguida, todos retornaram ao museu, onde está a peça “White Out”, escultura monolítica branca e 56 maquetes de suas obras, mas não todas, realizadas ao longo do anos como artista.
Depois, sempre acatando pedidos de fotos e selfies, Anish dirigiu-se para uma sala de imprensa montada ao ar livre, nos jardins, para conversar com os jornalistas. Confessou acreditar mais na prática contínua do artista do que na inspiração. Revelou que freqüenta diariamente seu ateliê, repetindo o mesmo ritual de acordar, vestir-se, tomar o café da manhã e sair para trabalhar. “Às vezes,tenho idéias estúpidas na minha cabeça”, revelou com um tímido sorriso.
A exposição de Anish Kapoor mostra que o Porto não é apenas a cidade dos vinhos do Douro, dos passeios pelo rio, da contemplação dos seus palácios, igrejas,monastérios e edifícios históricos, da livraria Lelo, mas também capital da cultura. Por exemplo, no Centro Português de Fotografia do Porto, antiga cadeia, estão expostas neste momento 241 fotos de autoria de Frida Kahlo, refletindo sua intimidade, interesses e vida atribulada que ela resumiu com graça da seguinte forma:
“Na minha vida tive dois acidentes, um foi aquele em que fui atropelada por um elétrico… O outro é o Diego.” Ele se referiu ao marido mulherengo, o artista Diego Rivera, por quem nutria verdadeiro fascínio. Mas ainda há muita mais para se conhecer no Porto, a três horas de trem de Lisboa pelo Alfa Pendular.

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