Interesses sem transparência

Ministério recebe lobistas do agro por ‘porteira secreta’

Portaria privativa da pasta da Agricultura é controlada apenas por uma lista escrita à mão e sem transparência

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João Henrique Hummel e Gustavo Carneiro da Action frequentaram a portaria privativa do Ministério da Agricultura (Fotos: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados e Reprodução)

Julgado por opositores como inimigo do agronegócio, o governo de Lula (PT) abriu uma porteira secreta no Ministério da Agricultura para lobistas de setores estratégicos como os da soja, da madeira e do biodiesel. É o que revela reportagem da Repórter Brasil, publicada nesta quarta-feira (28).

Uma portaria privativa tem sido a porta de acesso de sócios de uma das principais consultorias de “relações governamentais”, vulgo lobby, da capital federal. A Action Relgov, fundada em 2018, tem acessado a cúpula da pasta da Agricultura do governo petista, principalmente com dois sócios da empresa, Gustavo Carneiro e João Henrique Hummel.

Foram 14 e 12 visitas, dos respectivos sócios, fora da agenda oficial, pela portaria controlada apenas por uma lista escrita à mão e sem transparência. Sendo Carneiro consultor da Associação de Produtores de Sementes de Mato Grosso (Aprosmat).

E, assim como o ministro, Hummel é um dos fundadores da Frente Parlamentar da Agropecuária, composta pela “bancada ruralista”, que reúne 340 parlamentares e é a mais ampla influente força do Congresso Nacional. Ele negou ter contato com o ministro Fávaro há anos.

Vistantes da portaria privativa do Ministério da Educação eram registrados em lista secreta (Foto: Reprodução/Repórter Brasil)

O sócio da Action já foi assessor especial da pasta nos dois primeiros governos de Lula. Mas foi exonerado por suspeitas de conflitos de interesse.

Ambos atuaram no Instituto Pensar Agropecuária (IPA), que investe em 57 organizações do agronegócio e presta assessoria técnica à bancada ruralista.

Interesses conflitantes

Os encontros que contrariam a Lei Federal 12.813/2013, contra “conflitos de interesses”, foram registrados em cerca de 4.200 registros, manuscritos em 381 páginas, sobre a movimentação de pessoas pela portaria exclusiva do Ministério da Agricultura, entre janeiro e novembro de 2023.

Segundo a reportagem, os registros obtidos pela Lei de Acesso à Informação (LAI) foram solicitados inicialmente pela organização especializada em transparência pública Fiquem Sabendo. E uma parceria com a Human Rights Watch, digitalizou e organizou os arquivos.

No grupo das dez pessoas que mais acessavam esta portaria do Ministério da Agricultura, mais da metade das 108 entradas tinham como destino gabinetes do ministro Carlos Fávaro (PSD) e do secretário-executivo da pasta, Irajá Rezende de Lacerda. E somente sete destes encontros aparecem nas agendas oficiais de compromisso do ministro e de seus subordinados.

Influência grave 

Para Marina Atoji, diretora de programas da Transparência Brasil, a prática confronta a Lei de Conflito de Interesses e decreto federal que obrigam que estas entradas sejam registradas no sistema eletrônico do Poder Executivo, e-agendas.

“Esse é um cenário muito grave”, conclui Atoji, ao argumentar que a ausência destes dados pode atrapalhar a descoberta de eventuais favorecimentos a grupos com acesso privilegiado aos detentores de poder decisão em órgãos públicos.

O advogado do Fiquem Sabendo, Bruno Morassutti, ressaltou na reportagem que acessar repetidamente o prédio por uma entrada exclusiva pode indicar quem influencia os rumos do agronegócio no Brasil, mesmo que o acesso em si não seja ilegal.

“Quanto mais próximo você está do ministro, mais valorizado é seu passe”, conclui Morassutti.

“Falhas e equívocos”

O Ministério da Agricultura atribuiu a “falhas humanas” e “equívocos dos colaboradores” a falta de dados e transparência sobre os visitantes secretos e seus destinos na sede da pasta .

“As orientações para anotar os registros tanto na portaria principal e privativa são repassadas aos funcionários durante o treinamento inicial e em reciclagens”, argumentou o Ministério, sem explicar o motivo de os visitantes não aparecem na agenda oficial dos servidores. (Com Repórter Brasil)

 

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