Tese da mineradora

Consultor diz que abalos sísmicos envergaram poços da Braskem, em Maceió

Geólogo contratado pela Odebrecht alega causa natural para afundamento em bairros

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Uma falha na placa tectônica – cientificamente identificada como “Lineamento BR 01”, entre os estados da Bahia, Sergipe e Alagoas, desde 1954 – provoca uma onda de energia que causam abalos (tremores) em diversas cidades dos três estados. A partir de 2016, os tremores intensificaram. Em março do ano passado chegou a 2,5 graus em Maceió (AL). Segundo a tese divulgada na véspera da revelação de estudos oficiais sobre danos na área urbana de mineração da Braskem na capital alagoana, o fenômeno “envergou” alguns dos 35 poços de extração de sal-gema da mineradora subsidiária da Odebrecht, que teve R$ 2,6 bilhões bloqueados pela Justiça, por ser suspeita de causar afundamento em três bairros da capital alagoana: Pinheiro, Mutange e Bebedouro.

A informação foi revelada com exclusividade ao jornal Gazeta de Alagoas pelo mestre da cadeira de Hidrologia do Centro Universitário Cesmac, geólogo Ricardo Queiroz, contratado em janeiro pela indústria petroquímica da Odebrecht, junto com outros especialistas, para estudar as causas do afundamento do solo no bairro do Pinheiro. O resultado oficial dos estudos do Serviço Geológico do Brasil (CPRM) será divulgado nesta terça-feira (30).

Com base em estudos do Centro de Sismologia da Universidade de São Paulo (USP) e do Observatório Sismológico da Universidade de Brasília (UnB), o professor Queiroz demonstrou o trecho da falha geológica que corta os estados atingidos pelos abalos. “Defendo que está ocorrendo um lineamento e que esta é a origem dos problemas no Pinheiro”, disse Ricardo Queiroz.

Segundo o professor, há registros de abalos sismológico em Alagoas desde 1954. “Nos últimos quatro anos, esses abalos intensificaram em camadas muita profundas”. Queiroz repetiu a tese já divulgada pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM) de que tais falhas geológicas provocam movimento na terra. “O Pinheiro está se movimentando. O Serviço Geológico do Brasil já demonstrou isso. Por conta da depressão na placa tetônica, existe uma bacia que sente os efeitos da depressão. Os abalos provocados pelo lineamento BR 01, registrados a partir de 2016, movimentaram a gelatina geológica (camada de sedimentos)”, afirma o pesquisador.

A solução para o Pinheiro, segundo o professor Queiroz, é de engenharia. “É impedir que a água continue penetrando no solo do bairro, onde há uma fenda. O local onde ocorre a penetração da água já foi identificado pelo Serviço Geológico do Brasil”, disse o professor.

Desastre atinge solo do bairro do Pinheiro, desde 2018. Foto: Marco Antônio/Secom Maceió/Arquivo

‘Sem afundamento nas cavernas’

Na reportagem do jornalista Arnaldo Ferreira, o consultor contratado pela Odebrecht garante que, apesar dos envergamentos, os poços danificados da Braskem não cederam. “Isto comprova que não há colapso (afundamento radical) das cavernas afetadas. Comprova também que existe uma força horizontal que envergou alguns poços. As sondas (contratadas pela Braskem para avaliar a integridade dos poços) constataram o problema. Alguns poços ficaram empenados”, disse Queiroz.

Ele garantiu que “não há risco de colapso no bairro do Pinheiro porque o problema está bem acima das cavernas, numa camada rígida, que chamamos de conglomerado de granito, que protege as minas e fica a 400 e 500 metros de profundidade”. As minas estão a 1.200 metros de profundidade, na área urbana cortada pela falha geológica.

O professor Ricardo Queiroz é formado em Pernambuco. Desde 1982 ele desenvolve estudos sobre águas subterrâneas em Maceió. Neste período iniciou as pesquisas relativas aos aquíferos da cidade. Naquela época ele disse ter percebido que no subsolo da capital havia várias depressões a uma profundidade de 150 e 300 metros. A observação dele ocorreu durante investigações sobre a exploração de poços particulares da Casal, Braskem e Petrobras.

Segundo ele, na separação dos continentes, houve um “rift” (fenda gigante) nesta região. A fenda teria sido detectada, a primeira vez, pela Petrobras em 1989.

Rachaduras em residência do bairro do Pinheiro foram agravadas por tremores em 2018. Foto: Serviço Geológico do Brasil

Afunda dois centímetros por ano

Ainda a respeito dos poços na mina de sal-gema, o professor afirma que não deve haver um afundamento, um abatimento repentino (colapso) de grande monta na região do Pinheiro. Com base em estudos de interferometria (ciência e técnica da sobreposição de duas ou mais ondas) do Serviço Geológico do Brasil, disse que o bairro se desloca numa velocidade de dois centímetros por ano.

“Verificamos que o deslocamento se dá por conta de uma falha lístrica (falha gravitacional ou extensional curva, com mergulhos variando de muitos fortes, ao alto, a subhorizontais, na base, e com concavidade para cima onde desliza o teto sobre o muro) que atingiu o bairro, provocou rachaduras no solo, nos imóveis e danificou alguns poços da Braskem”.

A questão agora, de acordo com o professor Queiroz, é buscar a solução para o bairro mais afetado, no caso o Pinheiro. Evitar que a água de chuva continue penetrando no solo é uma das medidas imediatas. Ele acredita também que a penetração da água no solo faz aumentar a falha e o rebaixamento de parte do solo na região.

No próximo dia 5, o Ministério de Minas e Energia, através da Agência Nacional de Mineração e do Serviço Geológico do Brasil, promete divulgar estudos que realizou no Pinheiro desde novembro do ano passado, para identificar as causas do “afundamento do bairro”.

A reportagem da Gazeta questionou o professor sobre o resultado e se por acaso apontar que a origem de tudo seria extração de salmoura sem estudos prévios na área de exploração, sem avaliação precisa dos impactos ambientais no local onde está a planta industrial e as minas, o professor disse acreditar que os estudos devem apresentar fenômenos naturais como causa e efeito. A tese do consultor sustenta os argumentos dos diretores da empresa, que nega o envolvimento da exploração industrial com os problemas do bairro.

Minas de sal-gema da Braskem na Lagoa Mundaú, próximo do bairro do Pinheiro. Foto: Reprodução Abel Galindo/TV Gazeta

Indústria garante integridade das minas por meio de estudos

Neste momento, sondas investigam as condições das minas desativadas e ativas que extraem sal-gema entre os bairros do Pinheiro e Bebedouro. O gerente de Relações Institucionais da Braskem, Milton Pradines, assegura que “os sonares realizados até agora mostram que os fenômenos geológicos na região não impactaram diretamente as cavernas de sal, que estão localizadas de 900 a 1.200 metros”. Os engenheiros da Braskem atestam também que as minas estão seguras.

Existem rumores nos bastidores da própria indústria dando conta de que os engenheiros não estariam confortáveis em assinar os laudos dos estudos realizados até agora. Mílton Pradines disse, por intermédio de sua assessoria de comunicação, que “todos os estudos realizados possuem ARTs (Anotação de Responsabilidade Técnica), tanto da Braskem quanto dos consultores externos, e estão sendo emitidas e assinadas conforme a previsão legal”.

Segundo Pradines, “os estudos técnicos de assuntos específicos são de responsabilidade dos consultores que os realizam. A responsabilidade técnica dos engenheiros da Braskem é sobre a gestão da operação como um todo”.

O Conselho Regional de Engenharia (CREA) informou à Gazeta, por sua assessoria, que a indústria não pode executar nenhum tipo de exploração ou obra sem as ARTs. As empresas contratadas para os serviços foram: Flodim (francesa); Schlumberger (francesa); Sonawire (americana); Panamerican (americana); Telespázio (italiana); Groundprobe (canadense); Great (brasileira); Conterp (brasileira); Perbrás (brasileira). Além de consultores independentes especializados para análise de dados: Sabine (Operation and Storage); GEOPET (geologia e geofísica); MODECOM (geomecânica); Consalt (dissolução subterrânea e hidrogeologia).

Justiça

A Justiça negou pedido da Braskem para reverter o bloqueio da divisão de R$ 2,6 bilhões dos lucros com acionistas de 2018. A empresa recorreu da decisão judicial. “Não há estudo e nem laudo conclusivo que demonstre haver relação entre as atividades da empresa e as ocorrências no bairro do Pinheiro”, observou o diretor Milton Pradines ao acrescentar que “a Braskem está e sempre esteve à disposição das autoridades, com a divulgação transparente de seus estudos e trabalhando para ajudar a identificar as causas dos problemas. Além disso, a empresa está realizando ações emergenciais no bairro nos termos do Acordo de Cooperação Técnica firmado com o Município, os Ministérios Públicos Federal, Estadual e do Trabalho, e o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-AL)”, afirmou o diretor.

Com relação aos resultados das investigações feitas por técnicos federais e que devem sair dia 30, se a empresa for apontada como a causadora, Pradines disse que “a Braskem acredita que os problemas no Pinheiro não têm relação com as suas atividades. Os estudos realizados pelos consultores especializados até o momento não apontam qualquer indício nesse sentido. Entretanto, caso fique comprovado que suas atividades causaram os eventos, a empresa assumirá sua responsabilidade com a sociedade alagoana, como tem feito em mais de 40 anos de atuação no Estado”. (Com informações da Gazeta de Alagoas)

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