São Paulo altera a geografia dos festivais
Ainda é cedo para análises mais profundas, mas já é possível dizer que o The Town São Paulo introduziu um novo modelo de festival de música, com capacidade de ultrapassar os limites nacionais e criar uma marca de apelo mundial.
Uma montagem que, na estreia, fez frente a sua gênese veterana, o Rock in Rio — no tamanho dos palcos já largou em vantagem. O evento carioca, ao longo de décadas, colocou o Brasil no roteiro internacional de festivais, o paulistano, mais diversificado, fará com que artistas efetivamente globais tenham que vir para São Paulo.
Já estive em festivais em doze países. O que vimos no The Town não tem paralelo nos Estados Unidos ou Canadá, para citar dois destinos norte-americanos de destaque. O único padrão de comparação é com alguns europeus, já com diversas edições de estrada e, portanto, de correções e aprimoramentos.
Nenhum havia utilizado o Autódromo de Interlagos de forma tão ampla e intensa. A participação da Prefeitura de São Paulo ao fazer obras permanentes – que a partir de agora estão à disposição de qualquer evento, incluindo as de automobilismo – foi determinante para este sucesso. Sim, o poder público investiu no equipamento deixando-o em condições de melhor receber montagens que se revertem em empregos, renda para a população e em impostos que, restituídos à Prefeitura, serão aplicados em outras áreas, principalmente as sociais.
Segundos os organizadores, o The Town teve um impacto, global, de R$ 1,7 bilhão e 17 mil postos de trabalho diretos e indiretos. Esse resultado inclui os investimentos na montagem, os ingressos, as ativações dos patrocinadores e o impacto turístico, por exemplo. Neste último caso, vale exemplificar o ocorrido na hotelaria: 85% de média no feriado prolongado de 7 de setembro quando, em períodos normais, ficaria abaixo de 50%.
O The Town também fez apropriações bastante interessantes e que, com o tempo, serão mais bem compreendidas. A primeira foi assimilar e usar com riqueza de detalhes a “arquitetura embalada para o consumo”: montagens efêmeras, como as encontradas nos parques temáticos e que dão concretude a lendas e histórias fantasiosas. Se a line-up precisava de uma moldura, foi feita com ícones da cidade de São Paulo: o Mercadão, a Catedral da Sé, a silhueta de prédios, de fábricas e com telões adornados com obras de diversos artistas — para ficarmos em apenas um exemplo, os paulistanos Gêmeos.
Alargando as fronteiras dos espetáculos de música, a segunda apropriação tem um pendor fortíssimo de diversão. Roda-gigante, montanha-russa, megadrop (queda livre) e tirolesa compuseram um ambiente de lazer que fez sucesso. Atrações presentes em outros festivais, como o próprio Rock in Rio e o Lollapalooza, porém envoltas por 235 horas de shows e plateia de 500 mil em cinco dias.
O evento não foi imune a falhas, é fato, como praticamente nenhum é, mormente com números superlativos e inédito. Críticas garimpadas e quase envergonhadas — filas, banheiros mal localizados, chuva forte (um dia!), muito sol, trechos de terreno com lama, operação de transportes sendo ajustada — eram contrapostas a manifestações de satisfação da maioria do público e imagens da multidão espalhada pelos palcos. Não por outro motivo, 90,5% do público pretende retornar em 2025.
O The Town dá início a uma nova fase dos megaeventos de música. Sua montagem provisória certamente estará eternizada na memória do público e servirá de inspiração – e desafio – para os próximos e os concorrentes. As imagens, a reação do público e dos artistas ajudarão na fixação da cidade como um dos polos mundiais de grandes eventos.
Gustavo Pires é presidente da São Paulo Turismo/SPTuris, empresa da Prefeitura de São Paulo