Reconstrução, quando?
Cláudio Hemb é um amigo da nossa mocidade que se mudou para New Orleans em 1977 e lá se encontra até hoje. Aproveitou-se de um segmento até então inaproveitado. Naquela época, 50% da população era de negros, a grande maioria descendentes africanos. Montou uma loja para vender objetos e outras bugigangas das religiões afro da Bahia. Faz sucesso.
Falei com ele para colher informações sobre o Katrina, furacão que destruiu New Orleans em 2005, para compará-lo à nossa enchente de maio.
Em suma, ele disse o seguinte:
“Tenho acompanhado e ajudado ai no que posso. No espírito de clareza, no good deed goes unpunished, melhor exemplo Brad Pitt. Falar com uma só voz. O governo federal procura qualquer desculpa para lavar as mãos de vocês. Fome e falta de teto são incríveis motivadores de violência. Tudo que pode dar errado dará e com alto custo. Vocês não têm um governo federal que consiga gastar uma fração de 600 bilhões de dólares que foram direcionados para toda área atingida no Golfo do México, sendo que New Orleans abiscoitou 125 bilhões de dólares dessa fatia. A tragédia humana em todos os sentidos é difícil de grasp (entender). Foram tantas vozes gritando sem cessar que muita decisão saiu via default. Só em 2019, a economia da cidade voltou ao patamar anterior à tragedia de 2005. Ou seja ,14 anos depois.”
Aqui, o otimismo de reconstrução rápida é uma balela. Não temos aquela montanha de dinheiro. A governança é lenta e tripartida entre as Prefeituras, Estado e União. Municípios paupérrimos, Estado pobre. O dinheiro grosso está em Brasília. E já se nota um jogo de empurra, com um ente passando a responsabilidade para outro.
E a burocracia? Desesperadora! Qualquer transferência de recursos ou a mera aplicação deles tem que passar pelo suplício de licitações, pareceres da PGM, PGE e ou da PGU. Sem contar com os malfadados Tribunais de Contas.
Dou três exemplos para embasar o que digo. O primeiro, é sobre o aeroporto Salgado Filho. Há mais de 4 meses e meio sem operar e com a promessa de reinício parcial só no final de outubro. Num país moderno, o Governo Federal tinha que antecipar, no curtíssimo prazo, os tais 500 milhões de reais para a Fraport e depois acertar a conta com as seguradoras e a própria concessionária. O prejuízo dessa encrenca para a nossa economia é incalculável.
O segundo, é o financiamento federal, a baixo custo e com prazo de carência, para tapar o buraco aberto nas contas do Grêmio e do Internacional, cujos estádios foram alagados. Porém, o BNDS não pode financiar clubes de futebol. O estatuto deste banco é do tempo em que os clubes não pagavam as contas, nem as promessas…Agora, essa restrição é inaceitável.
O terceiro, mais simples mas de repercussão mediática importante, é o que está acontecendo com o Cais Embarcadero, novo cartão postal de visita de Porto Alegre. A enchente reduziu suas instalações a pó. Rapidamente, com recursos próprios, os gestores limparam o local para receber de volta os antigos e os novos locatários. Do contrato original que o Estado assinou com o grupo operador por 5 anos, já se passaram 2 anos e meio. É obvio que se justifica a imediata prorrogação do prazo do contrato por 7 anos e meio, para que os locatários tenham a garantia do tempo necessário para nele investirem. Nenhum empresário sério irá repor ou implantar imóveis e outros bens com o risco de exploração por apenas 2 anos e meio, sem nenhuma perspectiva de retorno do investimento. Quando escrevi esta coluna já se passavam 4 meses e meio e a burocracia (ou burrocracia) não era vencida e o processo com o aditamento contratual continuava circulando pelas mesas dos lentos advogados e funcionários do Estado, capazes de encontrar fio de cabelo em casca de ovo.
Se os problemas continuarem sendo tratados como se estivéssemos vivendo numa boa, penso que vamos levar algo como os 14 anos do Katrina para que o nosso Rio Grande volte à normalidade e ao crescimento.
Para vocês não acharem que sou um pessimista incurável, termino com o que considero uma grande notícia para os gaúchos. Acabou o tal Ministério da Reconstrução, substituído por uma Secretaria vinculada à Casa Civil. A pessoa designada para esta função foi o Maneco Hassen, ex-prefeito de Taquari e ex-presidente da FAMURS. Político de boa cepa, excelente operador e negociador, homem de decisão e que põe a mão na massa. Entretanto, o Maneco vai ter que “se virar nos trinta”, pois o Ministro Rui Costa pensa que o Brasil começa e termina na Bahia…