Paulo Tarso Flecha de Lima: o Brasil de luto

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O falecimento do embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima, poucos dias depois da comemoração de seu 88º aniversário –  deixa um vazio no espírito dos inúmeros amigos e admiradores que conquistou ao longo de sua vida e de sua brilhante carreira.  O mineiro Paulo Tarso, além de diplomata brilhante e homem de notável espírito público, foi um ser humano sensível e bem-humorado, sempre cativando com sua simpatia as pessoas – poderosas ou simples – com quem tratava.

A facilidade que demonstrava ao lidar com questões complicadas talvez decorresse do fato de ter, desde cedo, convivido com os intrincados desafios do poder. Apenas iniciando a carreira, foi assessor da Casa Civil de Juscelino, próximo de onde se definiam as gestões com os Estados Unidos e a formatação da Operação Pan-Americana (OPA), de cunho desenvolvimentista. Pode atestar, também, a inserção do planejamento no sistema político brasileiro, por um presidente que respeitava a democracia e pretendia transformar o Brasil, de um pais agrícola em um com densidade industrial.

Com o projeto de promoção do comércio colocou o Itamaraty, no início dos anos 1970, no centro do processo de expansão e diversificação das exportações brasileiras.  Foi, portanto, um dos artífices da transição do Brasil, país do café, para o Brasil que somos hoje: grande exportador de alimentos, de bens de alto conteúdo tecnológico e de uma variada gama de serviços.

Outras duas características de Paulo Tarso foram as geralmente boas relações que manteve com jornalista e com seus funcionários, mesmo os mais humildes. Como a jornalista Pomona Politis deixou registrado em sua coluna de 7 de maio de 1959, do Diário Carioca:  “na recepção que ofereceu para comemorar sua promoção a segundo secretário, Paulo Tarso fez questão de convidar os três contínuos, seus auxiliares no Gabinete Civil da Presidência da República”.

Paulo Tarso acompanhou seu chefe na Casa Civil da Presidência, José Sette da Câmara Filho, designado governador transitório do governo do novo Estado da Guanabara. O jornalista José Mauro, em sua coluna Hora H no jornal Última Hora, edição de 18 de abril de 1969 registrou que Paulo Tarso, no Palácio do Catete, era considerado um legítimo ‘para-raio’ de Sette Câmara, tendo atuado sempre com a maior dedicação e com toda habilidade na solução dos casos, evitando que muito deles viessem a dar ‘dores de cabeça’ ao Chefe da Casa Civil.”   

Muito aprendeu também Paulo Tarso, em Roma, seu primeiro posto na carreira, com o embaixador Hugo Gouthier. Paulo parece se autodescrever na apresentação que fez  de Gouthier, no livro deste, Presença: “Ele exercia a diplomacia da maneira mais qualificada e sofisticada, tinha geralmente uma excelente situação local sem descuidar sua retaguarda brasileira e sem perder os seus traços brasileiríssimos, tendo sempre um prazer indisfarçado de abrir as portas de sua Embaixada aos compatriotas de passagem”. Da mesma maneira, observou que “em termos de governo perante o qual o agente está acreditado a capacidade de influir em seu país de origem é quase tão relevante quanto a representação local e o Embaixador Gouthier conseguiu sempre dar demonstrações de seu imenso prestígio internacional e nacional”. Ou seja, Paulo Tarso identificou em Gouthier traços de si mesmo.

Este não é o lugar de escrever sobre toda a sua vida e carreira, mas o de deixar o registro de uma mensagem de reconhecimento de toda uma geração de diplomatas que encontrou em Paulo Tarso Flecha de Lima um modelo de profissional, de caráter e de pessoa.

A equipe e amigos do Diário do Poder tiveram durante muitos anos a oportunidade de tê-lo como partícipe em nossos almoços de análise e reflexão. Sua participação foi sempre muito rica e a todos nos ajudou a melhor compreender as complexas circunstâncias da política externa brasileira. Estamos todos de luto!

Pedro Luiz Rodrigues, diplomata e jornalista. É colaborador do Diário do Poder.

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