Passos perdidos*: em Portugal, as presidenciais de 2026 já começaram

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Pode parecer estranho, mas um dos temas políticos mais quentes tem sido as eleições Presidenciais. Parece estranho porque estas eleições são só em janeiro de 2026, porque ainda temos eleições autárquicas em 2025 e porque o Presidente, em Portugal, tem poderes muito reduzidos.

Portugal, ao contrário do Brasil, França ou Estados Unidos da América, tem um regime semi-presidencialista. O Presidente tem muito tempo de antena nos media, tem alguma influência, mas o seu único poder efetivo é dissolver o Parlamento e convocar novas eleições – só em casos muito extremos. É a primeira figura do Estado, mas o seu poder é mais simbólico que outra coisa qualquer e as candidaturas são pessoais (e não partidárias). Qual é então a importância destas eleições?

Em primeiro lugar, depois de duas décadas com Presidentes socialistas, tivemos duas décadas de presidentes sociais-democratas. Em segundo lugar porque a governo não tem maioria parlamentar e a eleição de um Presidente mais ou menos favorável pode condicionar a queda do governo. E finalmente porque estas presidenciais podem contribuir para (re)arrumar o xadrez político em Portugal.

As candidaturas são pessoais. Mas o apoio dos partidos é muito importante. E os principais partidos (PS e PSD) apoiam um determinado candidato. Também é possível ter candidatos independentes. E os partidos não vão ter vida fácil.

O Partido Socialista tem tido uma tradição de apresentar um candidato “oficial” e de ter candidatos “rebeldes”. Foi assim nas últimas duas presidenciais. Divisões que o prejudicam eleitoralmente. Pedro Nuno Santos tudo fará para evitar que isso aconteça, mas não é fácil. Tudo estará combinado para que Mário Centeno – ex-ministro das finanças e atual Governador do Banco de Portugal – avance. Mas o antigo secretário-geral socialista, António José Seguro voltou à televisão e mostrou interesse no lugar. Os socialistas ainda têm Ana Gomes, que já foi candidata rebelde, e o histórico António Vitorino, à espreita de uma oportunidade. De fora fica o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, que não tem interesse no lugar. Tendo em conta o ambiente vivido dentro do PS não é de excluir ter dois militantes candidatos. Um oficial e outro rebelde.

O PSD, partido principal do governo, também tem algumas opções. O antigo líder, e atual comentador televisivo, Luís Marques Mendes, parece ser a escolha mais óbvia. Marques Mendes tem um espaço de opinião com mais de um milhão de pessoas de audiência. Interessa-lhe manter esse espaço durante grande parte do próximo ano. E isso significa assumir uma possível candidatura o mais tarde possível. À espreita está o antigo Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho. Tem mandado de dizer que não está interessado no lugar, mas Passos ainda é novo para se retirar da vida pública. Nas últimas semanas também tem sido avançado o nome de Aguiar-Branco, atual Presidente da Assembleia da República. E o nome de Durão Barroso, antigo Presidente da Comissão Europeia, é sempre uma possibilidade. Para já, a única garantia de Luís Montenegro – líder do PSD – é que o candidato apoiado será sempre militante do partido. Uma forma elegante de excluir Paulo Portas, antigo líder do outro partido da coligação, CDS, e Pedro Santana Lopes, um histórico do PSD que saiu do partido há alguns anos.

No centro de todo este processo está um outro nome de que todos falam: Almirante Gouveia e Melo. O atual Chefe de Estado da Armada, independente, que ficou conhecido, e muito popular, como o homem da “logística” da vacinação no COVID. Gouveia e Melo já comunicou que não pretende continuar na armada. Tem importantes apoios nos media e está no terreno há vários meses. Diz-se que pode apresentar a sua candidatura em fevereiro/março quando acabar o seu mandato na marinha. As sondagens dão-no como favorito à corrida presidencial.

Com estes nomes, quase todos apelando ao eleitorado do centro, o mais provável é ter eleições muito divididas, com a necessidade de uma segunda volta. E com espaço para um candidato mais radical, à esquerda ou à direita. As eleições são só em janeiro de 2026, mas o jogo há muito que começou.

*Nome antigo para “sala de espera”. E nome comum para o corredor que dá entrada à sala do plenário na Assembleia da República Os passos de quem espera são dados como perdidos.

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