Bom Dia. Veja só: começou mais uma guerra.

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Abra os olhos. Não dá pra desejar Bom Dia. Fomos dormir e na madrugada, distante, mas como se fosse bem ao nosso lado, a festa de música eletrônica é interrompida por bombardeios e ataques de todos os lados. Estamos em guerra também, de alguma forma.

Não consigo parar de pensar naquela turma toda que se divertia na rave baticundum, colorida, lisérgica, animada.  À altura do ataque, muitos já deviam estar se preparando pra voltar para casa, cansados. Outros, possivelmente estavam tão embriagados ou drogados que talvez nem tenham percebido o que ocorria, não tenham se dado conta, sem condições de correr, fugir, pensar. Encontros desfeitos, amores perdidos. Não se fez silêncio. Os sons do horror, imaginamos.  Centenas de mortos, tantos outros sequestrados e ainda em poder do Hamas, o grupo terrorista que abriu, na verdade, escancarou, a boca do inferno ao atacar Israel, começando pela festa mais próxima que encontraram do território que dizem defender.

A partir daí, da manhã do sábado, 7 de outubro de 2023, ninguém mais pode ter paz ao redor do mundo, que agora acompanha, alarmado, minuto a minuto, a escalada do conflito. Seja por ter alguém ainda ali por perto, seja por esperar que este alguém seja resgatado em segurança, seja por saber que ali na verdade nada mais pode ser considerado seguro, em qualquer dos lados, nenhum lugar. As bestas foram soltas, e não sabemos o que fazer para que retornem. No fundo, no fundo, intuímos que não há mais, mesmo, volta. Mísseis cruzam os céus, exércitos de drones furam bloqueios, milhares de jovens agora são convocados para fronts de sons malignos, atendendo a ordens de vida e morte.

Elementos que conhecemos, polarização, religião, violência, raivas históricas, se misturam. Líderes totalitários lutando pelo poder, mesmo que nem sempre – quase nunca – representem a vontade de seus liderados, e serão eles, nós, os atingidos. Os fatos se repetem em escala maior ou menor ao redor do planeta, e nem todos percebem sua real gravidade, repetindo um mantra de que é coisa de lá de longe.

Mas esse longe se aproxima. E a diferença é que acompanhamos a realidade como quem vê filmes no streaming.  As imagens são abundantes e, ainda, além, das produzidas pelas máquinas de guerra onde a primeira vítima é sempre a verdade.

Se foram mortos decapitados, dentro de suas casas, nos bunkers onde se abrigavam pensando que todos os ataques viriam apenas do céu. Se estão morrendo de fome, sede, em seu êxodo, mulheres e crianças, ouvimos seus choros, os gritos, vemos corpos espalhados, funerais coletivos, vilas e cidades inteiras arrasadas. Como é possível apoiar qualquer um desses lados? O que ataca se foram atacados, o que reage, e nesse caso em uma correlação de forças praticamente desleal, e foi inacreditavelmente a parte mais fraca a que botou fogo no pavio. Como descrever o turbilhão de sentimentos que afloram nos povos envolvidos que também passam a se debater além daquelas fronteiras?

Viramos imediatamente, além de técnicos em futebol, especialistas em guerra, geopolítica, ideologias, uns cobrando aos outros posições, como se estas pudessem extinguir o mal maior dos extremistas.

As redes sociais repletas de imagens como se todos estivessem na cobertura aguardando – em suas salas seguras – invasões, explosões, a destruição de entradas e saídas, as ainda inúteis tentativas diplomáticas.

As informações desencontradas, os apelos de familiares em busca de desaparecidos. E, ainda, completando, as ridículas brigas entre jornalistas procurando palavras com lupa em matérias e  comunicados oficiais, mais uma vez certificando a polarização, a identificação como terroristas ou não, quando tudo isso já está tão claro diante de nossos olhos. Sempre esteve, mas estamos com o terrível hábito de justificar guerras, muitas empurradas pelo tempo, ódio acumulado, esquecidas pelos continentes. Até que nos atinjam, como esta agora, contrapondo dois povos com direito a viver e em paz, cada um em suas terras.

Embora não exista mais qualquer lugar seguro – e isso é evidente.

Marli Gonçalves – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon) marligo@uol.com.br marli@brickmann.com.br

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