STF e a CPI da pandemia
Antes de ser instalada, a CPI da Pandemia já alvoroça a política nacional.
O presidente do senado, Rodrigo Pacheco, acolhe a investigação, reconhecendo a legalidade da liminar do ministro Luís Roberto Barroso, porém acha que não se deveria apurar o passado, se não conseguimos defender o presente e o futuro, com ações concretas de combate ao vírus.
Correto o entendimento do Eminente Senador.
Posição idêntica é a do senador petista Jacques Wagner (BH), figura expressiva da oposição, que conclama as “energias voltadas para garantir a vacina e depois responsabilizar os culpados”.
Não se nega a legalidade da liminar, que tem respaldo em julgados anteriores, nas CPIs dos Bingos e do Apagão Aéreo, no período de Lula.
Entretanto, a Corte já admitiu entendimento diverso, em casos de “situações atípicas”, o que não anula a regra de que toda ofensa legal é reprovável.
Apenas, define o alcance e os limites dos agentes do estado, inclusive os juízes.
Diante da existência de “situações atípicas”, o STF tem preservado os princípios constitucionais, sem prejuízo de ponderar os valores, riscos envolvidos e aplicado os critérios da “proporcionalidade, razoabilidade, conveniência e oportunidade”.
Na realidade atual, a crise sanitária é indiscutivelmente uma “situação atípica”.
Tais circunstancias justificariam, que fosse arguido no julgamento do plenário, sem nenhum demérito para o Ministro-relator, a existência de questão não examinada na liminar, a ser considerada pela Corte.
Para isso, as partes teriam que ser intimadas, no prazo de cinco dias.
Essa via processual permitiria o exame do que hoje é público e notório, ou seja, a pandemia em ascensão e a possibilidade dos prejuízos decorrentes da CPI afetarem indiretamente as ações de combate ao vírus, além de antecipar o debate eleitoral de 2022.
Desde 1993, a Corte legitimou essa jurisprudência (Adin n° 855-2? PR), ao interpretar o parágrafo 2º, art. 5º, da Constituição, que abrange as partes não-escritas dos direitos e garantias constitucionais.
Caso o plenário do STF revisasse a liminar, continuaria a tramitação na Corte e na Polícia Federal das investigações em curso, o que não beneficiaria os presumidos culpados.
Os Tribunais se engrandecem, quando se afastam de decisões que provoquem danos desproporcionais aos benefícios esperados pelo interesse público.
Veja-se, que o simples anuncio da liminar provocou nociva efervescência política.
De um lado, o presidente acusa o STF de interferência no poder executivo e atiça governadores e prefeitos.
De outro, Lula monta palanque para o 1° de maio, com o objetivo evidente de lançar-se candidato. Divulgou até slogan do evento: “Democracia, Emprego, Vacina para Todos”, típica plataforma eleitoral antecipada.
Por mais que o governo disponha de argumentos, seria heresia e inexperiência política admitir que a CPI enseja a oportunidade de esclarecimento.
Ao contrário.
A radicalização, de parte a parte, incendiará o país.
Conheço bem a tramitação de CPIs. Fui relator de várias delas no Congresso.
Não se nega que contribuem para a democracia, por assegurar o sagrado direito das minorias. Todavia, a investigação é de natureza essencialmente política, o que assume maiores proporções, se considerada a instalação numa antevéspera de eleições gerais.
A CPI não tem competência para punir os investigados. Ela investiga e aponta sugestões.
A nação espera que os ânimos se acalmem, diante do risco iminente da CPI contribuir indiretamente para a propagação da Covid19, além do surgimento de verdadeira “praça de guerra político-eleitoral”, onde tudo poderá acontecer.
Nunca será sonho inatingível, a esperança de que predomine o discurso do apelo à unidade nacional, através da diplomacia da reconciliação, que envolve até a arte de pedir desculpas.
O ex-chanceler da Alemanha Ocidental Willy Brandt prostrou-se de joelhos, no asfalto molhado do Memorial aos Heróis do Gueto de Varsóvia e pediu perdão pelas atrocidades do nazismo. Anos depois, recebeu o Nobel da Paz e caiu o Muro de Berlim.
A história demonstra não ser vergonhoso reconhecer erros.
A principal lição deixada pela pandemia será o dever da escolha consciente nas urnas de 2022, dos líderes responsáveis pela tarefa de reerguer a nação, da maior crise de sua história.
Só alcançaremos esse futuro, se desde já, os poderes constitucionais agirem com bom senso e espírito público.
Do contrário, os falsos cânticos do populismo demagógico, ou do autoritarismo, levarão a Nação ao sacrifício das liberdades democráticas.