MP de Alagoas rejeita moratória milionária do IR da ALE

Legislativo tenta parcelar dívida de quase R$ 100 mi com IR

Ficou apenas na tentativa o esforço do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ/AL) para conciliação entre a Assembleia Legislativa do Estado (ALE) e o Ministério Público Estadual (MP/AL) sobre a dívida milionária em recursos do Imposto de Renda (IR) que o Poder Legislativo, historicamente, não repassa para os cofres do Estado. Na reunião da tarde desta quinta-feira (14), mediada pelo desembargador Tutmés Airan na sede do TJ, o procurador-geral de Justiça Sérgio Jucá foi intransigente com a proposta da Mesa Diretora presidida pelo deputado estadual Luiz Dantas (PMDB), sob o argumento de que o repasse é um direito indisponível dos alagoanos, sobre o qual não pode haver qualquer transação.

“Esses são recursos que pertencem ao Tesouro do Estado, recursos que a lei considera indisponíveis e que deveriam estar sendo aplicados, por exemplo, nas áreas da Saúde e Educação. O que está ocorrendo é uma sangria inqualificável ao erário em prejuízo dos interesses da sociedade. É por isso que o Ministério Público não vai transigir. Queremos que se restaure o império da lei violado há longos anos pela Assembleia Legislativa, que se apropria indebitamente dessa fortuna”, reagiu Jucá.

Presente à tentativa de conciliação, o coordenador do Núcleo de Defesa do Patrimônio Público do MP, promotor José Carlos Castro afirmou que o Legislativo acumula uma dívida de R$ 77 milhões de IR, entre 2009 e 2014, que será alvo de uma ação futura de improbidade administrativa contra os gestores responsáveis. Mas o MP prefere afirmar que a dívida é de quase R$ 100 milhões, devido à falta de transparência na Assembleia.

“O que pretendemos agora é que aconteça o recolhimento a partir de 2016. Já há uma decisão de 1º grau obrigando esse repasse. A Assembleia recorreu da sentença do Juízo da Fazenda Pública Estadual e então propôs esse acordo. Mas nós não vamos aceitar”, reforçou José Carlos Castro.

Confiança

Do outro lado da negociação frustrada, o deputado Luiz Dantas saiu confiante em uma decisão favorável dos outros poderes. “Queremos encontrar um caminho que concilie os interesses do Poder Legislativo com o Poder Executivo. O Estado não pode abdicar de receita e a Assembleia reconhece a dívida e tem interesse em pagar, mas precisa de um entendimento que se chegue a uma forma de operar esse pagamento viável para a Casa, mediante estabelecimento de prazos, a partir do próximo ano”, defendeu o presidente da Assembleia.

A confiança tem razão de ser, se for analisada a postura da Procuradoria Geral do Estado (PGE), cujo titular Francisco Malaquias alega não poder permitir que o Estado abra mão das receitas, mas posiciona-se da seguinte forma: “Não vamos renunciar a receita mas também não vamos inviabilizar a Assembleia Legislativa de Alagoas. Vamos tentar uma solução negociada que viabilize o Órgão e ao mesmo tempo que mantenha o Estado com suas receitas”.

A postura do governo de Renan Filho (PSDB) irritou os servidores da educação, que aguardam uma proposta de reajuste, enquanto o Estado encaminha para abrir mão de repasses de um poder protagonista contumaz de escândalos. 

Indecência

Diante da falta de transparência nas suas contas e da série de escândalos que sangram os cofres da Assembleia, a moratória sugerida pelo Mesa pode ser considerada indecente. Pois consiste na abertura de mais de um ano de “carência” para começar a recolher os recursos do Imposto de Renda para os cofres do Tesouro Estadual, esticando a responsabilidade da atual gestão para a da próxima Mesa Diretora. Permitindo, assim, que continue sendo feita a apropriação indébita da retenção do Imposto de Renda dos servidores e deputados estaduais. Tributo que representa um montante mensal de R$ 1,7 milhão.

Caso o Judiciário ceda, estará institucionalizado o calote histórico de um poder que sempre alega aperto financeiro, mas sempre conquista suplementações financeiras nos finais de exercícios, sem nunca expor o destino dos recursos.

A Assembleia propôs que, deste mês de julho até agosto de 2017, seja autorizada a não dar a destinação determinada por lei ao IR. Somente em setembro do ano que vem começaria a fazer o repasse a partir daquele mês, parcelando ainda em 96 parcelas o montante acumulado de janeiro de 2016 e agosto de 2017. Achou moleza? O presidente Luiz Dantas não ficou satisfeito. E também quer que a primeira prestação seja quitada somente a partir de janeiro de 2018 com a última parcela a perder de vista, no distante mês de dezembro de 2020.

“Por enquanto vamos aguardar a decisão do desembargador Tutmés que foi intimar a PGE para que ela se manifeste expressamente sobre os valores propostos”, disse o procurador da Assembleia, Diógenes Tenório Júnior.

Engasgando e sangrando

Na saída da reunião, Luiz Dantas demonstrou constrangimento ao ser questionado pela imprensa sobre o destino do dinheiro do imposto, apropriado indebitamente pela sua gestão. Após um longo silêncio, disse não saber para onde vai o dinheiro que deveria financiar políticas públicas para o alagoano.

“Não sei lhe responder ao certo, porque a Assembleia não estava repassando. Porque o volume de recursos do duodécimo não dava condição de devolver esse Imposto de Renda, tendo em vista uma nova carga de imposto que a Assembleia assumiu pagar desde 2015, que não estava sendo pago”, reagiu Dantas, após se engasgar com a pergunta do jornalista Marcos Rolemberg, da TV Gazeta.

As contas do presidente do Legislativo de Alagoas foram alvo de um bloqueio de R$ 61 mil, determinado pela Justiça, em junho. Mas a medida não pôde ser cumprida porque, na ocasião, o saldo bancário de Dantas era de apenas R$ 1,7 mil. Decisão que o deputado considerou “injusta e exagerada”, por entender que “a dívida é do Estado”, não dele.

O desembargador Tutmés Airan antecipou que vai revogar a determinação de bloqueio das contas do deputado, oficializar o Estado de Alagoas e o Ministério Público para que se pronunciem sobre a proposta que consta nos autos e decidir. “A perspectiva é de construir a melhor decisão para o povo de Alagoas”, disse o magistrado.

O que se sobressai dessa história toda é o protesto do chefe do Ministério Público, Sérgio Jucá, em defesa dos interesses de quem mais precisa: “Existe uma lesão aos cofres públicos. A Assembleia se apropria dos recursos que deveriam ser aplicados na saúde, na educação. É uma sangria inqualificável”.