Famílias sem-teto acampam em prefeitura de cidade controlada por Renan
Prefeito tenta despejar mais de 300 famílias de área de Murici
Sob ameaça de serem despejadas de barracos construídos à margem da rodovia BR-104, representantes de mais de 300 famílias sem-teto estão acampadas desde ontem (26), diante da Prefeitura de Murici, berço político do senador Renan Calheiros e de seu herdeiro político, o governador de Alagoas Renan Filho, ambos do MDB.
O movimento coordenado pela Frente Nacional de Luta (FNL) denuncia desvios na entrega de casas para vítimas das enchentes de 2010 e o corte de pagamentos de aluguéis sociais para as famílias pobres, a partir do mandato do prefeito sobrinho de Renan, Olavo Calheiros Neto (MDB), iniciado no ano passado.
Um dos coordenadores do FNL em Alagoas, José Alves, afirmou que o prefeito se nega a desistir do pedido de reintegração de posse da área de propriedade do município, ocupada pelas famílias há oito meses, nem sinaliza para a viabilização de casas ou outro local para abrigar as famílias. A Justiça determinou a reintegração de posse da área, que tem prazo de 48h para ser cumprida.
“As famílias são da cidade de Murici, vítimas das enchentes de 2010 e que não ganharam as casas, porque desviaram as casas. E o aluguel social o prefeito cortou. O ex-prefeito Remi Calheiros pagava, mas desde que entrou o Olavo Neto, não se pagou mais. E tem investigação no Ministério Público sobre a distribuição das casas”, disse José Alves.
Veja o apelo feito pela liderança da FNL para que o clã dos Calheiros intercedam junto às famílias:
ARCA DE NOÉ
O líder da FNL se refere à Operação Arca de Noé, deflagrada em abril de 2017 pelo o Grupo Estadual de Combate às Organizações Criminosas do Ministério Público de Alagoas (Gecoc) e a Polícia Civil, contra assessores de Olavo Neto suspeitos de integrar uma organização criminosa que vendeu casas em conjuntos habitacionais erguidos com recursos federais, após as enchentes de junho de 2010.
O MP divulgou que, mesmo após receber o dinheiro pela venda das casas, integrantes da organização criminosa nunca entregaram unidade alguma aos pagadores, que passaram a exigir o valor de volta.
‘IMIGRAÇÃO’
Ao demonstrar não ter sequer um projeto para solução do déficit habitacional em Murici, o prefeito Olavo Neto alegou para o Diário do Poder que as famílias de sem-teto vieram de outra cidade e que não há vítimas das enchentes ou de fatos relacionados à Operação Arca de Noé entre elas.
“É uma justificativa que o José [Alves] usa para alimentar essa mobilizações que eles estão fazendo. Esse pessoal que está lá não absolutamente tem nada a ver com a questão das casas [das enchentes]. Inclusive, lá, tem gente de outras cidades, que não são de Murici. E muita gente da mesma família”, disse Olavo Neto.
O prefeito de Murici disse que não pode se comprometer a construir novas casas, por causa da situação de crise econômica. E negou a acusação de que teria fechado o canal de negociação com as lideranças do movimento.
O sobrinho de Renan afirma que o líder do FNL, identificado como Paulo, teria pedido um tempo para conseguir as 350 casas para Murici, junto ao Ministério das Cidades, em Brasília. E o prefeito se comprometeu a firmar parceria, caso houvesse verbas federais para a construção. Mas afirmou que não avançou nesse sentido, porque o FNL não obteve nada de concreto junto ao governo de Michel Temer, de seu partido.
Olavo Neto confirmou que nunca pagou aluguel social em sua administração e disse não saber se seu tio e antecessor pagava o benefício social. “Não se o Remi pagava e como pagava. Eu nunca paguei. Não que eu seja contra a causa. Pelo contrário”, disse o prefeito.
O prefeito disse que o número de famílias na área aumentou, desde o início das negociações com a FNL. E considerou injusto que as pessoas fiquem “amontoadas” na área invadida. Mas deu a seguinte resposta sobre qual o destino que ele sugere para as famílias: “Essas pessoas vieram de algum lugar, não é verdade? Foi isso que coloquei para eles”.
Olavo disse ter entrado em contato com o Governo Federal para saber sobre o “aceno” de Temer feito no fim de 2017, para a construção de mais 100 mil casas para o Brasil inteiro. Sem sucesso. Foi quando admitiu não ter feito projeto para obter os recursos federais. “Projeto, a gente não tem. Estamos em busca de buscar os recursos”, respondeu ao Diário do Poder.
A FNL é ligada ao Partido dos Trabalhadores do ex-presidente Lula, aliado do senador Renan e do governador Renan Filho. E tem como coordenador nacional o ex-líder do MST, José Rainha.