Chefe da ONU culpa 'machismo à brasileira' por abusos

'Cultura impõe vontades do homem de forma 'cruel''

A existência de uma cultura do estupro no País é explicada pela representante da ONU Mulheres no Brasil, Nadine Gasman, como um machismo à brasileira: aparece de forma ambígua, mascarado pelo carinho de uma relação, mas, "quando as coisas não são feitas do jeito que o homem quer, vem a crueldade".

Para Nadine, esse comportamento é dúbio. "Você acha que as pessoas são liberais com as mulheres, mas quando pergunta sobre como elas devem se comportar, sair e vestir, não são. A sociedade não se reconhece tão machista como é."

Essa cultura inverte papéis. "Há um longo histórico não apenas de mulheres culparem a si mesmas, mas de meninas e mulheres serem 'culpabilizadas'. Continuamos a perpetuar essa atitude", diz Tracy Robinson, relatora sobre os Direitos das Mulheres da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Tracy defende a educação para mostrar às meninas que elas não têm culpa e, desse modo, promover a prevenção. "O momento para começar a atuar na prevenção, em mudar a cultura, é na escola. Os alunos precisam ser apresentados a outras maneiras de pensar sobre gênero, o que inclui forte ênfase em igualdade", diz a relatora.

Com leis aprovadas sobre o tema – a Maria da Penha, em 2006, e a do Feminicídio, em 2015 -, o Brasil busca punir agressores, mas pouco tem feito para ensinar igualdade de gênero nas escolas. "Os três garotos (acusados de estuprar a aluna na escola) precisam ser responsabilizados. A responsabilização, seja de garotos, seja de homens, precisa acontecer. A questão aparece nessa escola, mas acontece com frequência", diz Jacira Melo, diretora do Instituto Patricia Galvão.

Para ela, o pedido de desculpas feito pela vítima tem a ver com "a ideia de que as mulheres precisam ser recatadas, estar em lugares onde não vai acontecer um estupro e, de alguma maneira, elas são responsáveis". "Uma menina que está na escola e foi estuprada tem de pedir desculpa? Nada disso. Nós, a sociedade, a escola, o Estado é que deveríamos pedir desculpa e dizer 'você não deveria estar exposta a esse absurdo'." (AE)