ALE derruba veto de Renan Filho a mais R$ 100 milhões para pacientes com câncer

Líder do governo de Alagoas votou contra veto, mas tio do governador culpou deputada

Derrotado por antecipação ainda em janeiro em suas pretensões de presidir a Assembleia Legislativa de Alagoas (ALE), o deputado estadual Olavo Calheiros (MDB-AL) resolveu nesta quarta-feira (17) creditar à sua colega de partido e de parlamento, Jó Pereira, a derrota de seu sobrinho, o governador Renan Filho (MDB), na derrubada do veto do chefe do Executivo à emenda parlamentar que destina à saúde pública 1% dos recursos do Orçamento de 2019. O tio do governador demonstrou irritação ao ironizar a “competência oposicionista” da aliada de Renan Filho em convencer outros 17 deputados, contando com o líder do governo, a garantir a vigência da emenda que carimba R$ 100 milhões a mais para reforçar o tratamento de pacientes pobres com câncer, em Alagoas.

Não bastasse a interferência do governador na eleição interna do Legislativo, retaliando em janeiro deputados aliados com exonerações de indicados em cargos do Executico, o tio do governador apeado da linha de sucessão do sobrinho centrou esforços na acusação de que a deputada integrante do clã que comanda a pasta do Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Alagoas (Semarh) se tornou “a maior oposicionista ao governo de Renan Filho no parlamento”.

O motivo é que Jó Pereira foi relatora do parecer favorável à manutenção da emenda favorável a mais recursos para doentes com câncer atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em Alagoas; de autoria da Comissão de Orçamento da legislatura anterior. E também contrariou alguns projetos de interesse do governo.

A reação do tio do governador sugere rancor pela sucessão de fatos que resultaram na rendição de Renan Filho ao clã Pereira, que reatou neste mês de abril a relação de aliado da família da deputada que rejeitou a candidatura de Olavo a presidente da ALE, articulou a vitória acachapante do atual presidente Marcelo Victor (SD-AL), e ainda conquistou cargos com a nomeação do irmão da deputada, Fernando Pereira, como secretário da Semarh.

Olavo Calheiros carregou nas tintas da ironia, depois de ouvir a parlamentar mais votada de 2018 ser apoiada por colegas como Ângela Garrote (PP-AL), que disse ter certeza de que a assessoria do governador, “ou não tem família, ou lhe falta o coração para ignorar pacientes de câncer”. E “elogiou” como brilhante a defesa do ponto de vista de Jó Pereira, mas dizendo não poder parabenizá-la, por não entender que votar pela manutenção pela manutenção do veto seja votar contra a saúde de Alagoas.

Antes de afirmar que Jó Pereira assumiu o posto de maior oposicionista na ALE, superando Bruno Toledo (PROS-AL) e Davi Maia (DEM-AL), Olavo chamou a emenda pelos pacientes oncológicos de “completamente inócua” do ponto de vista orçamentário, sugerindo que deveria ser especificado de onde virá receita para ela, e o que será cortado nesse próprio orçamento.

“Vossas excelências [Bruno e Davi] estão apenas em 2º e 3º lugar. O 1º oposicionista dessa casa é a deputada Jó Pereira e o faz com competência, tentando expor sempre que pode o governo e atirando no seu coração, que é, de um lado, tentando suprimir receitas, e do outro lado, aumentando despesas”, disse Olavo Calheiros, citando outra posição de Jó, em defesa do não recolhimento da previdência sobre o pagamento de rateio do Fundeb aos professores; e dizendo que ninguém conhece mais o orçamento do Estado de Alagoas do que seu sobrinho governador.

“Deputada Jó, me perdoe, mas o seu discurso aqui é político, tentando se aproximar de determinados segmentos da sociedade e fazendo discurso fácil”, concluiu o tio do governador.

Deputado Olavo Calheiros e deputada Jó Pereira. Foto: Ascom ALE

Honra pela causa

Jó Pereira lamentou o rótulo que Olavo insiste em lhe atribuir e ressaltou ter postura de coerência no parlamento, desde o mandato anterior, em todas as pautas e causas que defende. E considerou que o deputado enfraquece o papel do Legislativo, ao afirmar ser “inócua” uma emenda parlamentar que, defende, não criou novas despesas para o Estado, porque as fontes de receita que foi buscar para emendar, foi o próprio governo que lhe apresentou.

A deputada disse que, na emenda, apenas foi direcionada a despesa para aquilo que o alagoano sente na pele, no dia a dia. E disse que, nessa causa, é uma honra estar ao lado do deputado Davi Maia, do deputado Bruno Toledo, e dos demais deputados que apoiam a derrubada do veto, citados nominalmente.

“É uma honra estar ao lado de todos eles. Porque estou lutando não politicamente; mas por uma causa que acredito que é maior do que todos nós. Não é uma causa política. É maior do que isso, deputado Galba [Novaes]. Para mim, é a saúde. Muitos passarão vivos por muitos apertos que o Estado pode passar. Mas, deputada Fátima, vossa excelência sabe que quem tem câncer tem pressa. Se não socorrermos esses alagoanos e alagoanas, muitos morrerão, como já morreram, por falta de atendimento, por ineficiência, por falta de gestão, como o ex-secretário Christian Teixeira falava e o atual secretário Alexandre Ayres fala. Minha busca aqui não é expor o governador, porque foi ele que escolhi nas urnas. Essa Casa, ao derrubar o veto, fará história junto com o governador Renan Filho. Porque ele disse aqui no discurso de posse que saúde é prioridade. Com apenas o mínimo de 12% é impossível. Meu discurso nessa Casa nunca foi fácil, deputado; foi coerente”, respondeu Jó Pereira.

Placar da derrubada do veto de Renan Filho à emenda para mais recursos para doentes com câncer

Líder votou contra

O líder do governo de Renan Filho na ALE, deputado Sílvio Camelo (PV-AL) reforçou as críticas de Olavo, mas acabou sendo um dos 18 deputados a votar contra o veto do governador. “Todo mundo aqui sabe como é a política. Vossa excelência não está sendo independente, está sendo de oposição. E isso não lhe envergonha em nada”, disse Camelo para Jó Pereira, antes de votar.

Olavo comentou a resposta da deputada, ressaltando que o problema da saúde é nacional e o clã Pereira saberia disso porque administra prefeituras alagoanas, ao justificar que, por isso, a emenda vetada pelo governador para direcionar mais recursos foi chamada por ele de “inócua”.

“Por conhecer a administração de muitos municípios, talvez vossa excelência não tenha atentado para esse dado, que gastam de 25% a 30% dos seus orçamentos com saúde, é que estamos propondo aumentar 1% do orçamento do Estado de Alagoas. Pernambuco aqui perto já aporta 16% com saúde”.

A deputada recordou ainda que, durante uma das audiências públicas realizadas por ela sobre o tema, na Assembleia Legislativa, foi mostrado um vídeo comparando o tratamento de uma mulher com câncer de mama pelo SUS e de outra pelo plano de saúde: “É estarrecedor, injusto e cabe a nós mudarmos essa realidade… Aquela que precisou do SUS, infelizmente morreu um dia antes da audiência pública, porque não conseguiu o tratamento adequado, enquanto que aquela tratada pelo plano de saúde conseguiu uma sobrevida e a cura monitorada do câncer”.

Jó lembrou também que os municípios já investem de 25% a 30%, quase o dobro de percentual mínimo, de seus orçamentos com saúde, sendo responsáveis pelo diagnóstico e rastreamento da doença, sem o apoio mínimo dos outros entes federados para realização dos exames necessários para esses diagnósticos.

Assista ao debate que tomou conta de mais de 40 minutos da sessão: