Reflexões sobre a engenharia nacional

Na última semana, o Clube de Engenharia, centenária instituição que reúne os engenheiros brasileiros, elegeu Francis Boghossian como seu presidente, por significativos 76% dos votos. É um justo reconhecimento para um grande engenheiro civil, professor da UFRJ e líder de diversas associações profissionais.

O Clube atravessa uma difícil situação financeira, a exemplo de muitas empresas de engenharia vitimadas por um sistemático desmonte que essa importante atividade para o desenvolvimento nacional vem sofrendo desde os anos 90.

Entre 1940 e 1990, a engenharia brasileira cresceu ao ponto de projetar-se no cenário internacional, com nossas empresas atuando nos cinco continentes e com uma brilhante geração de engenheiros formados no Brasil e pós-graduados no exterior implantando cursos de mestrado, doutorado e pós-graduação nos mais variados campos da engenharia. Desde então, assistiu-se a um progressivo declínio dessa atividade, provocado por políticas equivocadas e, mais tarde, por uma desastrada forma de reprimir a corrupção, que, não vitimando os corruptos, acabou por quase eliminar as nossas empresas e muito do nosso saber tecnológico acumulado.

Deve-se repensar o novo ciclo de desenvolvimento da engenharia a partir de condicionantes diferentes daqueles do ciclo anterior. Comentamos, a seguir, alguns desses novos condicionantes.

Primeiro, o novo grande cliente é o planeta, ou seja, toda a engenharia deve se direcionar para soluções sustentáveis, tanto nos seus processos específicos, construtivos ou industriais, quanto no judicioso emprego de materiais.

Segundo, a engenharia deve reivindicar um papel mais ativo na concepção das estratégias de desenvolvimento nacional e melhoria das condições de vida das populações, especialmente as urbanas, passando a priorizar tanto as suas obras, quanto o impacto que elas devem produzir na redução de desigualdades sociais.

Terceiro, a automação, a digitalização e o uso generalizado da IA são novos domínios em que o nosso atraso tecnológico está se mostrando evidente, o que resulta não apenas na falta de competitividade na nossa produção voltada ao mercado interno, como o pouco valor agregado que os produtos da nossa pauta de exportação vêm apresentando. Desenvolver a engenharia do agronegócio, da mineração, da indústria de bens de capital e de transformação, do campo dos serviços em geral e dos equipamentos para o progresso da medicina, é algo que tem que ser feito concomitantemente, olhando-se os aspectos econômicos e sociais da nossa população.

Quarto, o investimento nos setores de inovação, criatividade, pesquisa e desenvolvimento, além da melhoria da educação, desde o ciclo fundamental até os níveis de graduação e pós-graduação, é um aspecto vital nesse esforço coletivo, ainda que os seus resultados possam levar um período de duas décadas para maturação.

Quinto, o Estado tem um papel fundamental no sucesso de um novo ciclo virtuoso de desenvolvimento, cabendo começar pela meritocracia no serviço público, banindo o fisiologismo que tem imperado nos últimos tempos e voltando-se a uma competência nas abordagens de longo prazo que acabem com o desperdício de dinheiro em sucessivas improvisações, como hoje vemos na área de energia e em vários segmentos das obras públicas.

Evidentemente, não pretendo esgotar no artigo o tratamento para um problema tão grave e urgente quanto esse. Apenas lembrar à sociedade e, em particular, aos engenheiros, nesse momento que se abre com a eleição de Francis Boghossian, importantes pontos de atenção para que o Brasil retome a sua trajetória de avanços tecnológicos.

José Luiz Alquéres é conselheiro do Clube de Engenharia.