Com beijo na boca e tudo, teve grande sucesso o recente Campeonato Mundial de Futebol Feminino. Até no Brasil, onde o futebol feminino tem ganho espaço.
Mas nem sempre foi assim.
Beijocas à parte, fica a pergunta que não quer calar: Futebol é jogo pra homem?
No Brasil o jogo da bola foi até proibido para as mulheres. Por mais de 40 anos, as brasileiras foram proibidas de jogar futebol. O veto começou em 1941, na ditadura do Estado Novo (1937-1945), quando o presidente Getúlio Vargas assinou um decreto-lei tirando das mulheres o direito de praticar esportes “incompatíveis com as condições de sua natureza”.
Já nos EUA foi, primeiro, esporte de meninas. Sobretudo nas escolas e universidades.
Seja como for, aí vai uma historinha.
Uma vez, numa tarde de sábado, nos anos 80, Jorge Sant’anna, amigo do BID e eu, voltávamos da Circuit City, uma daquelas lojas de eletrônicos de bom preço em Rockville Pike, que, naquele fim de semana, anunciava um novo vídeo-cassete da marca Panasonic. Fomos lá conferir. Na volta para casa, trafegávamos pela Old Georgetown Road.
De repente, nossa atenção foi despertada por um campinho de futebol do outro lado da rua. Era o YMCA, a nossa Associação Cristã de Moços (ACM).
Fizemos o retorno e entramos no estacionamento. E ficamos a olhar o campinho, aquela relva impecável, bem aparada, um tapete verde que encanta qualquer peladeiro que se preze, sobretudo pra nós amantes de um bom “racha” em terras estrangeiras. Na busca das chamadas “quatro linhas”, já tínhamos até jogado bola nos imensos gramados do Mall, aquele vasto espaço perto do Washington Monument. Sem nenhuma trave ou quatro linhas demarcadas, que a gente substitua por aqueles cones alaranjados de trânsito.
De volta ao campo do YWCA, transcorria uma animado jogo. Soccer, como se dizia naquelas bandas. E só meninas jogando. Jorge e eu nos entreolhamos. Estava tomada a decisão. Bola fora, chegamos na beira do campo e perguntamos se podíamos jogar também. Um em cada time.
As meninas e o “técnico” deliberaram rapidamente e toparam. Elas ficaram encantadas com nossa habilidade com a pelota. Gostaram.
Ficamos de voltar. E voltamos no sábado seguinte com mais quatro ou cinco amigos e colegas. Uma semana depois outros mais se juntaram.
Resultado: em pouco tempo tínhamos ocupado o espaço e expulsado as meninas gringas. Chegávamos mais cedo que elas. Algumas decerto lindas. Mas de bola sabiam pouco.
Tudo ia bem, com deliciosas peladas de sábado à tarde, até que as garotas resolveram reclamar da invasão e o Diretor Esportivo do YWCA resolveu intervir. Decretou que somente os sócios do clube podiam frequentar. Entre os peladeiros, claro, ninguém era sócio e tinham que deixar de frequentar as “premisses”, inclusive o campinho de futebol.
Nada a fazer. Saímos dali com o rabo entre as pernas.
Até achar o que passamos a chamar de o “Monumental de Bethesda”. Um espaço de quintal de um condomínio, na Arlington Road, onde morava um funcionário brasileiro do BID. Com traves e tudo mais.
E ali passou a ser o palco de grandes pelaras entre s comunidade brasileira, diplomatas, funcionários da Embaixada e da Missão junto à OEA e do BID e do Banco Mundial. Dos colegas da Embaixada, José Antônio Marcondes de Carvalho, o Gaúcho, e eu. Sérgio Moreira Lima e Mário Vilalva e Paulinho POC, às vezes. Da Missão na OEA, Hermano Telles Ribeiro e Gastão Coimbra, (falecido), sem falar no nosso Jorge Sant’Ana. Do Banco Mundial, Eimar Avilez (também falecido)z
E nunca mais houve ninguém que impedisse aquelas alegres tardes do jogo do chamado esporte bretão. Nem as meninas do YMCA ou qualquer Diretor ou Síndico do Condomínio. Este, de resto, era um perna-de-pau, mas, por razões óbvias, tinha lugar garantindo nos folguedos da bola de sábado.
E deixamos de pensar naquele outro campinho, onde as meninas continuavam a distribuir graciosas caneladas e pontapés umas nas outras e até mesmo, eventualmente, naquele objeto esférico do nosso desejo masculino. Entre outros, ça va sans dire.