O Ocidente viveu milênios em que a guerra foi o estado natural dos agrupamentos humanos. Quem visita as mais antigas cidades europeias encarapitadas no topo de elevações pode observar as engenhosas e robustas fortificações que as envolviam. Seus habitantes não trocavam o conforto das planícies pelos panoramas que se descortinam desde seus mirantes, mas pela segurança que a ampla visibilidade dos arredores proporcionava. Em sua origem, não eram cidades “com vista”, mas cidades com “melhor detecção de agressores externos”. Os ataques eram possíveis, prováveis e recorrentes.
Havia guerras de pilhagem e de conquista. Disputavam-se territórios, objetivos estratégicos, coroas que se vulnerabilizavam e os conflitos se foram tornando mais violentos e prolongados conforme se constituíam os reinos medievais. As guerras duravam anos, décadas e até um século inteiro, como a Guerra dos Cem Anos entre Inglaterra e França pela hegemonia sobre a região de Flandres.
A História, porém, reservou o nome de Grande Guerra para os dois conflitos ditos mundiais travados fundamentalmente na Europa Ocidental no século passado. A primeira, de 1914 a 1919 e a segunda, de 1939 a 1945. A contagem das vítimas de cada uma foi às dezenas de milhões.
Escrevo sobre guerras e grandes guerras porque, na minha percepção, uma terceira guerra – grande, destrutiva, furtiva e silenciosa – também se trava no Ocidente. Singularmente, é guerra do Ocidente contra si mesmo. Para designá-la, generalizou-se a expressão “Guerra Cultural”, que parece dizer pouco para o quanto há de catastrófico na gradual destruição de uma cultura. James Burnham tratou do tema em “O suicídio do Ocidente”, mas o fez numa perspectiva pessimista. Eu creio numa vitória da vida e do Bem.
Antes que o Império Romano enfrentasse o declínio, a antiguidade arquejava uma cultura que não resistiria ao exemplo e à mensagem da Cruz. Tito Lívio, historiador romano que viveu no tempo de Jesus, escreveu: “Chegamos a um ponto em que já não podemos suportar, nem nossos vícios, nem os remédios que os poderiam curar”. Quanto essa frase, passados vinte séculos, parece falar dos dias atuais! A cultura é a alma de uma civilização. Corrompida essa alma, fatalmente se degrada e fragiliza a civilização que lhe corresponde.
Você pode esgotar todos os adjetivos do dicionário para discorrer sobre o que aconteceu em Roma. No entanto, eles serão poucos para descrever o efeito daquilo a que se dedicam os “progressistas” se conseguirem destruir a alma cultural do Ocidente, que há dois mil anos começou a ser construída. Não é por acaso que ela se reflete nas grandes declarações internacionais sobre pessoa humana, sua dignidade e seus direitos, bem como sobre família, e sociedade. Todas beberam da mesma fonte.
Essa, porém, não é uma questão religiosa! O leitor pode ter esses mesmos apreços e não ter religião alguma, mas é certificada a procedência e a longa produção desse Bem que o atraiu. Na guerra peculiar guerra que descrevo não há muro, como dizia recentemente o jornalista Júlio Ribeiro em seu programa na Rádio + Brasil. Quem ama o Bem, a Beleza, a Justiça e a Verdade, tem lado e protege aquilo que ama. Muros são o habitat natural dos omissos.
O falso humanismo dito progressista é aquele que sistematiza ataques à inocência das crianças, terceiriza para o Estado a instituição familiar, protege o criminoso e criminaliza a vítima, quer desencarceramento e liberação das drogas, exige aborto “livre, público, gratuito e de qualidade”. Onde existe a União, levam a discórdia; onde a Verdade é apreciada, levam a narrativa; onde reina o Amor, levam o ódio; onde há Esperança e Alegria, providenciam o desespero e a tristeza. Sua arte é horrenda, sua ética condena a virtude e sua justiça é perversa.