Marco Aurélio critica Moraes e diz temer muito pelas eleições
Ministro aposentado disse que poder do presidente no colegiado eleitoral é maior que no STF e Moraes vai presidir o TSE durante as eleições
O ministro aposentado Marco Aurélio Mello teceu duras críticas às decisões e atitudes do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em relação ao caso do deputado federal Daniel Silveira (União-RJ) e do inquérito do “fim do mundo” e disse “temer muito pelas próximas eleições porque ele vai presidir o Tribunal Superior Eleitoral (TSE)”.
“O momento é de temperança, de evitar-se esses antagonismos indesejáveis presentes às instituições, a instituição que é o STF e a instituição respeitável por todos, porque os integrantes foram eleitos pelo povo, que é a Câmara dos Deputados”, disse.
Segundo Marco Aurélio, o objetivo da decisão de colocar uma tornozeleira no parlamentar ainda lhe é desconhecido e que a decisão sobre o “ato de constrição” cabe aos demais parlamentares. “Esse ato de constrição, repito porque é um ato de constrição, limita a liberdade de ir e vir, a meu ver, fica submetido ao colegiado, com a palavra os pares do deputado Daniel Silveira e que eles se pronunciem de acordo com o figurino legal”, disse, antes de completar. “Eu vejo algo até mesmo humilhante, um deputado federal ter que usar uma tornozeleira. Que período vivemos. Que tempos estranhos”.
Sobre a sessão de julgamento do deputado Daniel Silveira, marcada pelo presidente do STF, ministro Luiz Fux, para o dia 20 de abril, a reação foi de espanto. “Eu não sei que processo é esse. É apreciação do inquérito desmembrado que envolve outras pessoas também para ter-se o crivo quanto ao deputado federal? Aí será muito ruim”, disse.
Apesar disso, para ele, toda essa polêmica será em vão. “Tudo está no inquérito que eu rotulei como ‘fim do mundo’, que vai dar em nada”, cravou.
Fim do xerifado
Chegou a hora, segundo Marco Aurélio, de o ministro Alexandre de Moraes se comportar è altura do cargo que ocupa e evitar antagonismos com o presidente da República, Jair Bolsonaro. “Ambos os lados estão muito acirrados. O presidente, num arroubo de retórica atacando a instituição Judiciário e o ministro Alexandre de Moraes, esquecendo que ele hoje é integrante do Supremo e também do TSE e que, portanto, não é mais secretário de Segurança Pública, não é mais ministro da Justiça e não é mais, eu diria mesmo, xerife”, lamentou.
Questionado sobre a origem do problema, ele não titubeou e falou da origem controversa das investigações e lembrou que todo inquérito que começa errado, tende a terminar mal.
“Teria sido instaurado pela própria vítima, o Supremo, na gestão do ministro Dias Toffoli e o relator teria sido escolhido a dedo. Isso não se coaduna, não se harmoniza com ares democráticos. Não se levou o inquérito sequer à distribuição. E o relator (Moraes) aceitou essa designação para assumir o papel, e eu digo com desassombro, de verdadeiro xerife. Eu temo muito pelas próximas eleições. Porque ele vai presidir o TSE.
Temor pelas eleições
Marco Aurélio presidiu o TSE por três vezes e disse que o motivo da sua preocupação é que o presidente do TSE é mais ouvido no colegiado que o presidente do Supremo. “Então um suspiro dele (Moraes) no âmbito do TSE repercute junto aos pares. Eu não sei se os demais integrantes se oporão a uma postura que venha a ser adotada”, explicou.
Questionado sobre um exemplo em que essa situação se manifestaria, Marco Aurélio citou um caso extremo, mas plausível. “A apreciação do registro do candidato à Presidência da República era do colegiado, mas na gestão do ministro Ayres Britto se transferiu para o presidente, ou vice e versa. E aí, o indeferimento de uma candidatura do atual presidente da República, como soará? Será um rebuliço sem tamanho”, disse.
Ativismo político
Marco Aurélio também comentou outro fato inusitado, que foi o não arquivamento do inquérito que apura se o presidente da República, Jair Bolsonaro, prevaricou no caso envolvendo a compra das vacinas Covaxin.
“O PGR pediu arquivamento de um inquérito contra o presidente da República e a ministra relatora (Rosa Weber) resolveu não arquivar”, destacou.
Na sua opinião, tal atitude torna o “estado julgador” também o “estado acusador” e essa acumulação de poder é “imprópria e conflita com a CF”. Segundo ele, quando o titular de uma ação penal pede o arquivamento da investigação, “resta ao órgão que aprecia essa manifestação, esse pedido, formalizar o arquivamento e o término do inquérito”.
“Isso assusta. Toda concentração de poder é perniciosa. Não cabe ao órgão julgador assumir a postura de estado acusador”, disse durante entrevista ao âncora Felipe Vieira, do canal BandNews TV.