Hospitais em crise em Alagoas deixaram de receber R$ 26 milhões do governo estadual

Reitor da Uncisal obtém R$ 2 milhões para contornar crise ampliada por Renan Filho, após herança do governo Téo

Cortes de verbas estaduais para três hospitais ligados à Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal) acumulam déficit de cerca de R$ 26 milhões, em quatro anos, e foram responsáveis pelo problema crônico de desabastecimento nas unidades e atraso salarial de até seis meses de terceirizados. Esta é a conclusão do reitor Henrique de Oliveira Costa, que graças à Defensoria Pública Estadual obteve nesta quinta-feira (12) um acordo para o Estado liberar R$ 2 milhões, para a Uncisal garantir o abastecimento por 90 dias.

O reitor que está há apenas oito meses no cargo descarta abrir mão da gestão das unidades em crise, ao ser questionado pelo Diário do Poder sobre a “solução” sugerida pelo governo de Renan Filho (MDB), de entregar à Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) a gestão dos hospitais Helvio Auto e Portugal Ramalho e da Maternidade Santa Mônica, que tratam de doenças contagiosas, transtornos mentais e gestações de alto risco, respectivamente.

A possibilidade surgiu depois de o titular da Sesau, Christian Teixeira, tentar atribuir os problemas que desgastam o governo de Renan Filho à subordinação das unidades à Uncisal. “O Helvio Auto é um cachorro com dois donos”, chegou a dizer o secretário em entrevista ao jornalista Ricardo Mota, do TNH1, em uma referência de que o futuro seria a morte do “animal”.

Mas o gestor da universidade que também atua com ensino e pesquisa nas três unidades estaduais revelou ao Diário do Poder que o diagnóstico para a crise crônica é a herança de descumprimentos do Termo de Compromisso nº 133/2010, que fixou em R$ 24 milhões anuais a parte que cabe ao Tesouro Estadual no custeio dos atendimentos. O déficit médio anual seria de cerca de três a quatro milhões, desde 2010.

Priorizando a vitrine

Antes de Renan Filho anunciar que investiria R$ 308 milhões para garantir uma vitrine para sua reeleição com obras de novos hospitais em Alagoas, no primeiro ano do atual governo, o Estado deixou de repassar R$ 13 milhões para manter os hospitais, quando a secretária da Saúde era a então reitora licenciada da Uncisal, Rozangela Wyszomirska. Tudo isso depois de o último ano do governo de Teotonio Vilela Filho (PSDB) deixar de liberar R$ 14 milhões.

“Em 2014 foi mais grave ainda, quando repassaram só R$ 10 milhões. Em 2015, passaram R$ 11 milhões. E esses dois anos foram cruciais. Tanto que em 2016 começou a ter problema grave de abastecimento. Porque o que tinha de estoque provavelmente foi consumido e não pôde ser reposto. Em 2017 voltou a ter problema, apesar de todos os nossos esforços, porque tinha um déficit muito grande. E apesar de ter melhorado o repasse, não atingiu aqueles R$ 24 milhões. Só em 2016 que foi para R$ 25 milhões. Mas o déficit que vinha anteriormente, junto com esse déficit maior de 2014 e 2015, deixa a Uncisal com um desfalque que chega a beirar R$ 26 milhões”, relatou o reitor Henrique Costa.

Além disso, o desequilíbrio das finanças nos hospitais estourou, porque os serviços e complexidades ofertadas aos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS). “A equação relacionada a medicamentos e correlatos aumenta, e esse valor de R$ 24 milhões nunca foi aumentado. Esse é o histórico de um subfinanciamento que impacta de qualquer forma na situação.

Reitor Henrique Costa e secretario da Saúde Christian Teixeira, na Defensoria Pública do Estado. Foto: Ascom Defensoria

Matando o “cachorro” de fome

Se o problema seria “um cachorro ter dois donos”, o relato do reitor Henrique Costa sinaliza a origem do descuido. Ainda mais quando mostra que a burocracia também foi ampliada, condicionando a liberação dos valores, mesmo pactuados em termo de compromisso, a “análises técnicas” que não seriam necessárias, segundo o reitor da Uncisal.

“Começou a ter uma burocratização no repasse e começou a ter atraso no pagamento. Começou sendo pago no começo do mês, depois foi para o meio do mês; foi dividido com parte no começo e outra no final. E de maio para junho, a primeira metade saiu no final de um mês e a segunda no meio do outro mês. E começa a desorganizar, com o argumento de que é preciso analisar a documentação enviada por nós à Sesau. Mas, se é pactuado que deve passar R$ 24 milhões, o que se tem mais a questionar? Se tiver identificado algum equívoco, corrige-se no mês seguinte”, concluiu o reitor.

Na reunião de hoje na Defensoria Pública, o Secretário de Saúde Christian Teixeira garantiu que avaliará a demanda apresentada da Uncisal acerca do repasse de recursos federais provenientes da reclassificação de leitos de UTI do Hospital Helvio Auto, de acordo com as Portaria MS 867/2015 e 1.444/2015.

Também ficou acordado que o secretário publicará portaria designando comissão composta por representantes da Sesau e Uncisal para repactuar o Termo de Compromisso de nº 133/2010, bem como editar novo Plano Operativo Anual (POA), incluindo a rediscussão de valores a serem repassados pelo Tesouro Estadual à Uncisal. E tal comissão apresentará novos parâmetros de valores para repasse em razão da produtividade do CPML e revisará os termos da Portaria n°2622/2018 da Sesau.

Em 9 de agosto, a Polícia Federal deflagou a Operação Correlatos, contra uma suposta organização criminosa que fraudou R$ 180 milhões em compras da Secretaria de Saúde para os demais hospitais não ligados à Uncisal, no governo de Renan Filho.

Decisão judicial

O novo acordo celebrado hoje atende a decisão judicial proferida em fevereiro deste ano em ação civil pública ingressada pela Defensoria Pública, que determinou que a Uncisal e a Sesau garantam o abastecimento ininterrupto dos medicamentos, insumos, materiais e produtos médicos, cirúrgicos e hospitalares necessários para tornar viável o atendimento e tratamento aos pacientes do hospital.

Após a liminar, o Hospital Helvio Auto foi abastecido, no entanto, no começo deste mês, a Defensoria Pública constatou novo desabastecimento e recebeu denúncias de atrasos nos pagamentos dos funcionários. (Com informações da Ascom da Defensoria Pública de Alagoas )