LUOS

Projeto de uso e ocupação do solo pode desconfigurar Brasília

Luos, como é chamada, deve transformar áreas verdes em comércio

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Um suposto equívoco do Governo do Distrito Federal sobre a destinação de uma área pública às margens da Ponte JK causou receio e indignação em moradores do Lago Sul. Em reunião no último 23 de novembro para debater a Lei de Uso e Ocupação do Solo (Luos), o local reservado para a construção do Parque Nelson Mandela foi apresentado como possível sede de comércios e empresas. O anúncio provocou alvoroço da comunidade.

O terreno em questão, de aproximadamente 124 mil m², fica próximo à QL 24 e à Ponte JK, e deveria ser transformado no parque, segundo acordo firmado entre GDF e governo federal em fevereiro do ano passado. No espaço, está prevista a construção do Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira.

Entretanto, na apresentação do GDF do dia 23, o local estava classificado como “Comercial, Prestação de Serviços, Institucional e Industrial (CSII)”, com possibilidade de utilização para estes fins. A informação consta no próprio portal do projeto da Luos, que apresenta o mapa reproduzido abaixo. Segundo os parâmetros da lei, tal categoria poderia abrigar lojas, escritórios e outros empreendimentos.

O novo projeto em construção no GDF que está enfrentando críticas pretende criar regras para uso e ocupação de solo. A proposta foi enviada em 2013 à Câmara Legislativa do DF, mas enfrentou resistência, forçando o atual governo a retirar a pauta e criar outro para tentar passar à revelia.

A ideia está sendo discutida na Secretaria de Gestão do Território e Habitação. Segundo a pasta, a Luos define os usos e atividades que podem ser desenvolvidos nos lotes das áreas urbanas que abrange, bem como os índices urbanísticos que as edificações nesses lotes devem atender, tais como altura, afastamentos, área máxima de construção, taxa de permeabilidade. "Esse tipo de definição é importante para garantir que as construções residenciais, comerciais ou industriais estejam em conformidade com o planejamento urbano para cada região administrativa incluída na Luos", garante a secretaria.

Para o presidente da Associação Amigos do Lago Paranoá (Alapa), Marconi de Souza, a Luos pode desfigurar Brasília. "Eu cheguei aqui em 1964. Tinha 150 mil habitantes. Desde sempre é uma cidade projetada. Quando Lucio Costa fez Brasília fez tudo por setores. Isso é muito bacana. É uma cidade diferente e prática. Há setores para hotéis, hospitais, comércio. Agora o governo quer implantar 'goela abaixo' ao longo da orla uma área turística, na QL 12. Isso é vergonhoso".

"O governo não teve competência para criar setores residenciais para vender lotes para o povo e hoje temos mais de 500 condomínios irregulares porque o governo não observou, não teve agilidade para isso", critica.

Outro ponto negativo apontado pelo morador é a audiência pública realizada pelo governo para supostamente ouvir a população. "Essas audiências não têm poder de notificar. Apenas complementam. É lei que o GDF é obrigado a cumprir. Nessas audiências a opinião da sociedade não modifica as coisas, a proposta", diz. "Essas audiências são tudo para dar legitimidade. mas a opinião do povo não é ouvida", completa.

"Nós não devemos destruir a cidade com essa Luos. A nossa salvação é ir depois na Câmara Legislativa do DF 'trabalhar os deputados'", disse. O texto, depois de passar pela Casa Civil, seguirá para a CLDF.

Na Câmara, o projeto deve ser analisado pela Comissão do Meio Ambiente, atualmente presidida pelo deputado Cristiano Araújo (PSD). O distrital adiantou ao Diário do Poder que é favorável à lei. "Ela é legalmente necessária. A cidade é dinâmica, vai se desenvolvendo. As normas têm muito importância para definir o eixo da cidade. Ela vai ajudar a organizar os condominios e novas áreas", comenta.

O deputado acredita que sobre a abertura para especulação imobiliária, 'sempre vai ter alguém que vai ganhar em detrimento de alguma mudança'. "A gente pode entender que houve especulação, mas também precisamos entender que a cidade mudou e precisa avançar. O Park Way, hoje, por exemplo, não tem comércio, academia, drogaria… Já na Asa Sul tem tudo. Se o comércio tem à disposição para que se faça um comércio eu não vejo prejuízo nisso. Temos que olhar com maturidade esse projeto. A gente tem que encarar. Não podemos ficar presos a uma questão conceitual", declara.

Em relação às audiências públicas em que a população não é ouvida, Cristiano Araújo é enfático: "Se o governo não ouve a população, eu não posso fazer nada. Eu ouço sempre".

Para Célio Melis Jr., conselheiro do Instituto de Arquitetura do Brasil no DF (IAB-DF), que está acompanhando o texto junto ao GDF, a proposta é bem vinda, mesmo enfrentando críticas da sociedade. "O projeto ainda está no início da discussão. Há muita estrada pela frente. A gente está observando que há uma intenção do governo de tentar arrumar todo o arcabouço legal de planejamento urbano do DF. A Luos vem ajudar nessa construção", disse.

Mais um

Criado na última quinta-feira (8) por decreto, o projeto Orla Livre quer a participação popular. Pelo site www.orlalivre.df.gov.br, qualquer morador pode enviar sugestões de como ocupar a orla do Lago.

O plano estabelece ações de curto, médio e longo prazos. Uma delas, em andamento, é a construção da trilha de 14 quilômetros que vai do Parque da Asa Delta, na QL 12 do Lago Sul, ao Deck Sul. Ela é toda pavimentada, sinalizada e será dividida entre ciclistas e pedestres. Ainda estão previstos banheiros públicos, postes de iluminação e revegetação. As obras estão a cargo da Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap) e vão custar em torno de R$ 3 milhões.

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