Afastado pelo CNJ

Presidente do TJ é acusado de tentar matar juiz em AL

Washington Luiz é acusado de assassinato após cassação de irmão

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Afastado no final de junho pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o desembargador presidente do Tribunal e Justiça de Alagoas (TJ/AL) Washington Luiz Damasceno Freitas teve reveladas, nesse domingo (10), histórias que vão além do fato de ser campeão de processos disciplinares no órgão que julga infrações de magistrados. Reportagem do Fantástico mostrou que um dos seis processos no CNJ apura em segredo se o mais político dos desembargadores alagoanos realmente se envolveu em três homicídios, um deles encomendado para dar fim à vida de um juiz por ter cassado o mandato de um prefeito em 2008.

O delegado da Polícia Federal (PF) José Fernando Chuy disse à reportagem da Rede Globo que o juiz Marcelo Tadeu Lemos de Oliveira teve a vida preservada porque pistoleiros o confundiram com um advogado, Nudson Harley de Freitas, trucidado em um orelhão ao lado da farmácia onde o magistrado teria acabado de entrar, com roupas parecidas com as da vítima.

“Um os meliantes teria referido que ‘opa, matamos a pessoa errada’. Para nós é muito claro que o advogado Nudson não era a vítima. Ele foi justamente confundido com o juiz”, disse o delegado ao Fantástico.

“O Nudson recebeu a carga porque estava também com roupas muito próximas das que eu estava na ocasião. E estávamos ao lado. Parei o carro ao lado do orelhão. E eu estava no orelhão”, lembrou Marcelo Tadeu na reportagem.

Juiz aponta local do crimePoder como estopim

A suspeita de envolvimento em homicídio é muito mais grave que as acusações de favorecimento de prefeitos acusados de corrupção e de participação na Máfia da Merenda. Mas tem a mesma raiz: a suposta sede de poder político e econômico.

Ao Fantástico, Washington Luiz negou ter mandado matar o juiz que cassou seu irmão Wellington Damasceno Freitas, conhecido como Xepa, da Prefeitura de Olho d’Agua do Casado, no sertão de Alagoas. Mas Marcelo Tadeu demonstrou convicção da relação entre suas decisões e o crime.

“Essa decisão de cassação de um mandato e o cancelamento de títulos [cerca de 12 mil] nessa ordem, isso não agradou a pessoa do desembargador”, afirmou Marcelo Tadeu.

O comerciante Kleber Malaquias de Oliveira relatou ainda que testemunhou conversa entre Washington Luiz e seu irmão Xepa em um restaurante, na qual teria dado a ordem para matar Marcelo Tadeu. “Manda passar que a gente resolve” foi o que a testemunha disse ter ouvido.

“Tão pequeno”

Na entrevista, o desembargador-presidente afastado do TJ de Alagoas negou a participação na trama criminosa. “Sou um homem de paz. Sou um homem temente a Deus. Razão nenhuma eu ia… E eu acredito que ninguém no Estado fez isso”, disse Washington Luiz.

O magistrado acusado de ser mandante de assassinato e corrupto afirmou ter pouca influência na tramitação dos seus processos nos órgãos superiores da Justiça Mas interceptações telefônicas decorrentes do inquérito da PF expuseram tentativas de mobilizar autoridades com esse intento de impedir ou atrasar o julgamento da ação sobre sua suposta participação na Máfia da Merenda, cujo processo estava desde setembro de 2015 em andamento e foi julgado há duas semanas.

Em uma das escutas exibidas pelo Fantástico, Washington Luiz fala com o juiz Orlando Rocha Filho, desembargador do Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE-AL), que de acordo com o relatório da Polícia Federal seria a pessoa designada para “buscar informações, ajuda (…) junto ao CNJ”.

“Na verdade, o que a gente quer no momento é tentar obstacular o máximo possível, responde Orlando. Para tentar impedir que isso abrevie, né?”, diz Orlando Rocha, no áudio gravado com autorização judicial.

O desembargador do TRE enviou nota ao Fantástico afirmando não ter relações de aproximação com os políticos da terra em Brasília e não se vê com capacidade e força, ao negar que os contatos telefônicos objetivariam obstacular julgamentos.

Até mesmo a presidente da Associação Alagoana dos Magistrados (Almagis), juíza Fátima Pirauá foi flagrada em suposta atitude de orientação para que se conseguisse pedir vistas do processo disciplinar a que Washington Luiz responde.

“Se não tiver logo essas garantias de votos, que pelo menos seja pedido vista, né?”, diz Pirauá ao então presidente do TJ. Para a PF, ela estaria querendo garantir votos favoráveis e falando sobre outra estratégia de pedir vistas para que o julgamento fosse adiado. A juíza negou qualquer tipo de envolvimento.

Na opinião do ex-corregedor do CNJ Gilson Dipp, “quando há tentativas de protelar decisões e um processo, é porque algo grave está acontecendo”.

“Como é que eu posso agir dessa forma? Eu sou tão pequeno. Sou presidente de um tribunal talvez do menor Estado… Eu interceder? Não tenho essa força”, disse Washington Luiz, ao Fantástico.

Força na política

No voto que motivou o afastamento do presidente do TJ de Alagoas, a corregedora nacional de Justiça, ministra Nancy Andrighi, entendeu haver indícios de que a Justiça de Alagoas teria sido a arma utilizada por Washington Luiz para intimidar adversários e proteger seus aliados, entre eles um ex-genro prefeito de Marechal Deodoro, Cristiano Matheus Sousa e Silva (PMDB), acusado de um desvio de R$ 1,3 milhão em esquema de fraudes entre 2009 a 2013.

No caso da suposta proteção do presidente afastado do TJ de Alagoas a outro prefeito acusado de corrupção, suspeita-se que o objetivo seria fortalecer politicamente seu outro irmão, o deputado estadual Inácio Loiola Damasceno Freitas (PSB). Toinho Batista, de Joaquim Gomes, é aliado do parlamentar do clã do desembargador. E teve cassação revertida por liminares, após ser denunciado por pagar mensalinho a vereadores, flagrados em outro escândalo da política de Alagoas, que também já foi objeto de reportagem do Fantástico.

A reportagem do fantástico do último domingo também lembrou das acusações de que Washington Luiz teria usado o cargo para proteger a filha Mellina Freitas, ex-prefeita de Piranhas e secretária estadual da Cultura, das acusações de cometer mais de 400 crimes e desviar R$ 16 milhões do município sertanejo, onde a Rede Globo filma a novela Velho Chico, que conta a história do domínio coronelista da região.

Washington Luiz também responde por fraude processual e o caso sobre o assassinato decorrente da caçada ao juiz Marcelo Tadeu tramita sob sigilo e relatoria do ministro João Otávio Noronha, no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os casos dos homicídios somente deverão ser tratados pelo CNJ após a conclusão do processo no STJ.

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