FALHA GRAVE

Órgão internacional expõe negligência contra tortura em Alagoas

APT volta a cobrar Renan Filho por mecanismo contra tortura

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A negligência do governo de Renan Filho (PMDB) quanto à instalação do Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura (MEPCT) voltou a ser evidenciada com mais uma cobrança da Associação para a Prevenção da Tortura (APT), feita ao peemedebista no final de março. A organização internacional de Direitos Humanos, que atua juntamente com Organização das Nações Unidas (ONU) cobrou, pessoal e oficialmente, o cumprimento e adequação da Lei Estadual nº 7.414/2009, que foi pioneira no País durante governo de Teotonio Vilela Filho (PSDB), mas jamais foi efetivamente cumprida. 

Após uma série de contatos via ofícios, sem resposta efetiva desde 2015, a delegada da APT para o Brasil, Sylvia Diniz Dias, foi recebida pelo governador Renan Filho em 15 de março e reforçou a cobrança e a tentativa de conscientização do chefe do Executivo do Estado. Diante da protelação do envio do anteprojeto de adequação da lei à Assembleia Legislativa, a delegada enviou mais um ofício, em 29 de março, reiterando o pleito, tendo como signatária a diretora do Escritório da APT para a América Latina, Audrey Olivier-Muralt.

O anteprojeto de lei foi enviado ao governo em 2016 e começou a tramitar por iniciativa da secretária de Direitos Humanos, Cláudia Simões, como processo nº 1101 4336/2016, que se encontra na Secretaria de Estado do Planejamento, Gestão e Patrimônio. Ele visa adequar a lei anterior aos preceitos do Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, instituído em data posterior à legislação estadual, através da Lei Federal nº 12.847 de 2013. Sua aprovação garantirá os meios necessários, incluindo a criação dos cargos correspondentes, para viabilizar o estabelecimento e a composição do MEPCT.

“Conforme enfatizado na audiência de 15 de março, Alagoas teve um caráter pioneiro ao promulgar a primeira legislação no país que incorporava ao ordenamento jurídico interno os compromissos contidos no Protocolo Facultativo da Convenção da ONU contra a Tortura, tendo ganhado inclusive repercussão na comunidade internacional. Contudo, passados mais de sete anos da promulgação da referida norma, o MEPCT ainda não foi operacionalizado na prática e a norma estadual segue sem ser cumprida”, dizem as dirigentes da APT, no ofício enviado ao governador.

Presidente da CDHM vê reincidência em Alagoas (Agência Câmara)‘FALHA GRAVE’

A APT destaca que, quando efetivamente instalado, o MEPCT terá a atribuição de realizar visitas periódicas e regulares a todos os locais de privação de liberdade para verificar as condições de detenção, velar pelos direitos fundamentais das pessoas que ali se encontram, e desta forma, gerar um ambiente mais seguro para todos que ali se encontram, internos e funcionários, assim como para a sociedade em geral.

O presidente da Comissão dos Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados, Paulão (PT-AL), vê como “falha grave” o fato de Alagoas não aderir aos parâmetros do Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura.

“É uma falha grave. Alagoas que continua detendo um dos maiores índices de violência a décadas, deveria aderir à proposta da APT. Até porque, a nossa Constituição Federal já define a tortura como crime hediondo e o Brasil ratificou várias convenções internacionais contra a tortura. A pergunta que não quer calar: ‘Por que até os vários governadores que tiveram oportunidade de instalar esse mecanismo não subscreveram?’. Perpassa vários governos estaduais”, opinou Paulão.

Um dia depois da reunião da delegada da APT com Renan Filho, a procuradora-chefe do Ministério Público Federal em Alagoas, Roberta Barbosa Bomfim , recebeu Sylvia Diniz Dias e ressaltou também aguarda que o governador  envie a matéria ao Legislativo com brevidade. “É urgente e necessária a efetiva instalação e funcionamento do Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura no Estado, em respeito à legislação vigente e ao acordo internacional que o Brasil se obrigou a cumprir”, defendeu a chefe do MPF/AL.

A APT trabalha mundialmente para prevenir a tortura e outros maus-tratos, promovendo visitas de monitoramento preventivas. E, na mesma semana que esteve com Renan Filho, obteve da Escola da Magistratura de Alagoas (Esmal) o compromisso de promover, ainda no primeiro semestre deste ano, um curso voltado para a detecção e enfrentamento da tortura, destinado aos juízes da área criminal, de execução penal e infância e juventude, além dos novos magistrados aprovados no último concurso do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ/AL).

Renan Filho resiste em fortalecer combate à tortura (Foto: Márcio Ferreira)NEGLIGÊNCIA

Desativado no início do governo de Renan Filho em 2015, o Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura só foi reativado, em setembro de 2016, após pressão da imprensa e de entidades. Mas se reúne esporadicamente. A situação enfraqueceu o controle e possibilitou a proliferação de casos de torturas como os que fizeram as unidades de internação de crianças e adolescentes infratores de Alagoas serem chamadas de “Castelo de Pedras da Tortura”.

Inquéritos do Ministério Público Estadual apuraram denúncias de mães de socioeducandos, após relatos de constantes espancamentos de adolescentes dentro do sistema socioeducativo. E o MP determinou a extinção do Grupamento Operacional de Agentes Socioeducativos (Goase).

Foram noticiadas ao MP de agressões, tais como: “golpes de cassetete, murros e chutes”, “ferimento em um dos calcanhares produzido por um dos agentes socioeducativos mediante o emprego de uma faca”, “ameaças de morte”, “espancamento de adolescentes por integrantes do Goase”, “queimadura no rosto de adolescente, com cigarro, por integrante do Goase”, “presença e provocações de integrantes do Goase, com armas de fogo, no interior de alojamentos”, “adolescente obrigado a passar por um corredor formado por 27 integrantes do Goase, apanhando de todos eles”, “tentativa de um dos integrantes do Goase de introduzir um cassetete nas partes íntimas de um adolescente”, “dente quebrado e nariz sangrando”, “hematomas produzidos por mascarados do Goase”, etc.

Na manhã desta quinta-feira (13), o Diário do Poder entrou em contato com a assessoria de comunicação do Governo de Alagoas, que pediu um tempo para checar a posição do governo e não retornou o contato até a publicação desta matéria. Sempre que trata do caso, o Governo exalta obras feitas nas unidades de internação de crianças e adolescentes infratores, mas precisou da intervenção do CNJ e do MP para fazer mudanças pontuais que ainda mantém o sistema vulnerável e sem controle.

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