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Ministro do STj critica decreto que regulamenta Lei Anticorrupção

Para ele, acordo de leniência traz mais problemas que vantagens

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O decreto assinado pela presidente Dilma Rousseff que regulamenta a Lei Anticorrupção, parte do pacote anunciado pelo governo federal na semana passada, foi alvo de críticas por parte do ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp. Para ele, que foi um dos mentores das varas especializadas na temática de lavagem de dinheiro, o decreto "extrapola" a própria lei e traz mais questionamentos ao texto. "Se a lei era questionada, com o regulamento será mais questionada ainda. E quem vai dar a última palavra será o Judiciário", afirmou o ex-ministro na segunda-feira, 23, durante seminário sobre a Lei Anticorrupção no Tribunal de Contas da União (TCU).

Na avaliação de Dipp, "atores indesejados" pela Lei são trazidos atualmente ao debate atualmente por conta da Operação Lava Jato, como o Ministério Público e o Tribunal de Contas. O atraso na regulamentação da lei "contaminou" a discussão com os fatos concretos da Lava Jato, nas palavras do ex-ministro.

A Lei 12.846, conhecida como Lei Anticorrupção, foi sancionada em agosto de 2013, entrou em vigor em janeiro de 2014 e foi regulamentada apenas na última semana. "Estamos colocando essa lei casuisticamente. Estamos examinando frente ao quê? À Operação Lava Jato, o que causa distorção na aplicação da lei, que já é complexa por sua própria natureza", disse o ministro.

O ministro-chefe da CGU, Valdir Simão, saiu em defesa da regulamentação e rechaçou a possibilidade de tanto a lei como o decreto terem sido afetados pelo caso de corrupção na Petrobras. "A Lei (Anticorrupção) foi aprovada em 2013 e quem estabelece as multas é a lei. Ela foi encaminhada ao Congresso em 2010. Então não foi direcionada à Lava Jato. Nem a regulamentação. A regulamentação foi feita com base em critérios técnicos", defendeu Simão, que participou do mesmo evento do ex-ministro do STJ.

Dipp defende a não participação do MP e do TCU na celebração de acordos de leniência entre empresas envolvidas em esquemas de corrupção e desvios e Poder Público. "O MP quer participar do acordo de leniência. Não deve. Já participa da colaboração premiada. Sobre o TCU, onde está a possibilidade na lei de intervenção do TCU?", questiona Dipp.

A Lei Anticorrupção e o decreto que a regulamenta apontam que a prerrogativa para celebrar os acordos é da CGU. O ex-ministro do STJ diz que o decreto que regulamenta a Lei Anticorrupção concedeu um "protagonismo exagerado" à controladoria, ao prever a possibilidade de o próprio órgão instaurar os processos administrativos de responsabilização.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Alexandre Camanho, criticou a falta de participação do Ministério Público nos acordos. "Não deixa de ser curioso que quem mais têm externado preocupação em relação à autonomia do Executivo (na celebração dos acordos) são as próprias empresas por medo de, sejamos claros, achaque", disse o procurador no evento.

No caso da Operação Lava Jato, a leniência com empreiteiras envolvidas é defendida pelo governo federal como uma solução para evitar a paralisação de obras públicas no País e a quebra de empresas. Há cerca de um mês, contudo, procuradores envolvidos na investigação foram ao TCU pedir que a Corte evitasse que os acordos fossem fechados. A alegação é de que o Ministério Público tem acesso a informações sigilosas do caso e os acordos não seriam benéficos para o avanço das investigações.

O acordo de leniência traz para as empresas "muito mais problemas do que vantagens", afirma Gilson Dipp Ele menciona que um acordo com o Poder Público no âmbito administrativo não exclui ação penal se o ato configurar crime, tampouco exime a ação administrativa fiscal – por parte da Receita Federal.

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