Petroloão

Reunião de Cardozo com advogados é 'intolerável', diz juiz da Lava Jato

Sergio Moro critica reunião do ministro da Justiça com advogado da UTC

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O juiz na primeira instância, classificou nesta quarta-feira como Foi ?intolerável? e ?reprovável? a reunião de advogados de empreiteiras com o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça), para discutir o futuro dos seus clientes presos na carceragem da Polícia Federal em Curitiba (PR). A opinião é de ninguém menos que o juiz federal CSergio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato.

Cardozo assumiu o papel de negociador com os empreiteiros envolvidos na Lava Jato, segundo a revista Veja desta semana, que revelou uma reunião do ministro em seu gabinete, em Brasília, com o advogado Sérgio Renault, defensor da empreiteira UTC, cujo presidente, Ricardo Pessoa, é um dos presos da Lava Jato e é acusado de coordenar o “clube” de empreiteiras que se organizou em cartel para fraudar licitações, combinar preços, superfaturar contratos e pagar propinas a agentes públicos.

Em uma conversa que Veja considerou absolutamente imprópria, o ministro disse que a operação da Polícia Federal ? órgão ligado à pasta de Cardozo ? mudaria de rumo “radicalmente” depois do Carnaval. O ministro ainda orientou a empreiteira a não aceitar acordo de delação premiada, um conselho seguido pelos executivos.

A confirmação do encontro de Cardozo foi o principal argumento utilizado pelo juiz para decretar nova prisão preventiva do presidente da UTC, Ricardo Pessôa, do diretor vice-presidente da Camargo Correa, Eduardo Leite, do diretor presidente da empresa, Dalton Avancini, e do presidente do Conselho de Administração da companhia, João Ricardo Auler.

?Existe o campo próprio da Justiça e o campo próprio da política. Devem ser como óleo e água e jamais se misturarem. A prisão cautelar dos dirigentes das empreiteiras deve ser discutida, nos autos, perante as Cortes de Justiça. Intolerável, porém, que emissários dos dirigentes presos e das empreiteiras pretendam discutir o processo judicial e as decisões judiciais com autoridades políticas, em total desvirtuamento do devido processo legal e com risco à integridade da Justiça e à aplicação da lei penal?, disse Sergio Moro.

?Mais estranho ainda” – destacou Sérgio Moro, numa clara referência ao ex-deputado petista e advogado Sigmaringa Seixas, que intermedio a reunão entre o ministro e o advogado da UTC – “é que participem desses encontros políticos e advogados sem procuração nos autos das ações penais. O ministro da Justiça não é o responsável pelas ações de investigações. Trata-se de uma indevida, embora mal sucedida, tentativa dos acusados e das empreiteiras de obter uma interferência política em seu favor no processo judicial?.

Interferência indevida

Para Sergio Moro, o episódio é mais uma evidência de que os empreiteiros presos na Lava Jato desde novembro tentam a todo custo interferir nas investigações. Eles já haviam tentado coagir testemunhas e apresentaram documentos falsos às autoridades. ?A mera tentativa por parte dos acusados e das empreiteiras de obter interferência política em seu favor no processo judicial já é reprovável, assim como foram as aludidas tentativas de cooptação de testemunhas, indicando mais uma vez a necessidade da preventiva  para garantir a instrução e a aplicação da lei penal e preservar a integridade da Justiça contra a interferência do poder econômico?, disse.

?Certamente a Justiça não será permeável no presente caso a interferências políticas ou do poder econômico. Qualquer indício de tentativa de interferência espúria do poder econômica, quer diretamente, cooptando testemunhas, quer indiretamente, buscando indevida interferência política no processo judicial, deve ser severamente reprimida, justificando, por si só, pelo risco à integridade do processo e da justiça, a decretação da prisão preventiva?, afirmou.

Em seu despacho, Sergio Moro disse que as empreiteiras têm várias obras em andamento e podem estar replicando o esquema do petrolão em outras obras públicas. Para ele, ?não é suficiente afastar formalmente os acusados do comando das empresas, pois não há como controlar ou prevenir a continuidade da interferência deles na gestão da empresa ou dos contratos?.

Governo responde ao juiz

A pedido da presidente Dilma Rousseff, o Ministério da Justiça rebateu em nota afirmações do juiz Sérgio Moro, que classificou em decisão como “intolerável” que advogados dos executivos presos pretendam discutir o processo judicial com autoridades políticas. Segundo o Ministério, é “dever” do ministro José Eduardo Cardozo receber os advogados.

“Em decorrência da decisão judicial proferida”, diz a nota, o Ministério da Justiça “esclarece e reitera que é dever do Ministro da Justiça e de quaisquer servidores públicos receber advogados no regular exercício da profissão conforme determina o Estatuto da Advocacia”.

O Ministério afirma ainda no texto não ter recebido em nenhum momento “qualquer solicitação” de advogados para que atuasse no sentido de “criar qualquer obstáculo ao curso das investigações em questão ou para atuar em seu favor em relação à medidas judiciais decididas pelos órgãos jurisdicionais competentes”. Caso uma solicitação desse tipo tivesse sido recebida, o Ministério afirma que teria “tomado de pronto as medidas apropriadas para punição de tais condutas indevidas”.

A reação do Ministério da Justiça responde os apontamentos de Moro que, ao decretar nova ordem de prisão preventiva de quatro executivos investigados na Lava Jato, criticou a estratégia dos advogados de construtoras que procuraram o governo.

O Ministério da Justiça reiterou que a única audiência concedida para advogados de empreiteiras envolvidas na Lava Jato foi realizada no dia 5 de fevereiro, conforme registrado em agenda pública, com defensores da Odebrecht.

“A empresa Odebrecht, na oportunidade, noticiou a ocorrência de duas eventuais irregularidades que exigiriam providências do Ministério da Justiça, não guardando nenhuma pertinência com quaisquer decisões judiciais tomadas no caso”, diz a nota do Ministério. As irregularidades geraram apresentação formal de duas representações pela empresa.

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