ALAGOANOS LESADOS

Investidores vão à justiça e temem calote milionário da corretora Astra

Advogado vê crime de empresa acusada de usar nome do Bradesco

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Um grupo de pelo menos dez investidores está mobilizado para denunciar às autoridades alagoanas as dificuldades para resgatar valores de uma aplicação financeira oferecida pela Astra Investimentos. O clima de preocupação dos investidores com um eventual calote é crescente, porque denunciam a falta de respostas efetivas para pedidos por resgate de investimentos que se aproximam de R$ 2 milhões, feitos por clientes, em Alagoas.

A defesa dos investidores vê crime contra o sistema financeiro e deve levar o caso ao Ministério Público Federal (MPF). Mas a empresa descarta irregularidades e disse ter reagido com o ingresso de ação criminal por “calúnia, difamação, lucros cessantes e fraude e por dúvidas da origem dos recursos”.

Fato é que a Justiça de Alagoas já determinou dois bloqueios de mais de R$ 600 mil das contas da Astra Investimentos LTDA e da Astra Holdings LTDA, para garantir o resgate do investimento a clientes que denunciam ter adquirido um produto identificado como uma aplicação do “CDB Bradesco”, que teria sido oferecido pela Astra em um evento em São Paulo, no ano passado.

Ex-superintendente da PF vê crime da Astra (Foto: Facebook)

Os clientes foram atraídos pelo vantajoso retorno de 1,4% ao mês, com liquidez e possibilidade de resgates diários, e, ainda, com a cobertura do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), tendo como garantia adicional os nomes dos sócios da Astra, Ashley Charles Jenner, com credibilidade no mercado, e de seu filho e sócio Andrew Charles Jenner. Agora, denunciam o descumprimento contratual, tanto pelo atraso de resgates, como pelo condicionamento do resgate à assinatura de termos de quitação com cláusula de confidencialidade, que impediria a judicialização do caso e divulgação sobre irregularidades.

Em um desses casos, a defesa dos investidores afirma que uma cliente investiu R$ 350 mil reais, que rendeu cerca de R$ 50 mil. Mas relata que o pedido de resgate feito em dezembro de 2017 não foi atendido, “porque a Astra o condicionou à assinatura do termo de quitação, não previsto no contrato”.

'PILAR' CAIU FORA

O advogado do grupo de investidores é o ex-superintendente da Polícia Federal em Alagoas, o delegado aposentado José Pinto de Luna, que vê no nome de Ashley Charles Jenner usado pelo seu sócio e filho Andrew Jenner como o principal pilar de confiança para passar a sensação de segurança e atrair investidores.

Mas Ashley Jenner, deixou de ser diretor de gestão de carteira de valores mobiliários da Astra investimentos no dia 07 de fevereiro deste ano de 2018, quase um ano depois de renunciar à função, em uma reunião com seu filho e sócio Andrew Jenner, em 16 de março de 2017. Ashley havia sido eleito diretor de gestão da carteira da empresa em reunião datada de maio de 2016, efetivada em agosto daquele ano na Junta Comercial do Estado de São Paulo. Fator que assustou ainda mais os investidores defendidos pelo advogado, em Alagoas.

“Quando pediram o resgate, o que era para durar um dia e entrar na conta, vem se alongando há mais de meses. Nessa toada, a gente entende que houve um crime contra o sistema financeiro. Mas ainda não estamos lidando com o aspecto criminal. O objetivo é recuperar o dinheiro dessas pessoas lesadas. Depois dessa descoberta aí [da saída de Ashley da gestão da carteira], mostramos para a juíza que pode estar havendo má-fé. Entendemos que seja má-fé. A gente pode levar uma notícia crime ao MPF de São Paulo, que tem procuradores especialistas em crimes contra o sistema financeiro. Aí a gente vai sentar o pau”, disse Pinto de Luna, citando um dos processos que tramitam na Justiça de Alagoas.

SEM PARCERIA COM O BRADESCO

O Diário do Poder perguntou ao Banco Bradesco se a Astra estava autorizada a oferecer o investimento utilizando a alusão ao "CDB Bradesco" e perguntou se o banco garantia o cumprimento dos termos dessa transação e se estaria havendo dificuldades do Bradesco em atender eventuais pedidos de resgate de valores deste produto comercializado pela Astra. E o banco negou qualquer relação com a transação.

“O Bradesco esclarece que não tem nenhum acordo com a Astra Investimentos para a comercialização de seus produtos e/ou serviços. Informa ainda que os CDBs Bradesco são distribuídos em sua Rede de Agências”, respondeu, ao Diário do Poder.

Veja como o nome do produto aparecia no extrato disponibilizado pela Astra para consulta dos clientes:

OUTRO LADO

O Diário do Poder também enviou perguntas sobre a situação para a Astra Investimentos e para seus sócios. E obteve o retorno de sua assessoria de imprensa, que negou ter havido qualquer situação fora do trâmite normal dos resgates dos investimentos contratados. E ainda negou ter vendido os seus produtos como se fossem “CDB Bradesco”.

Veja as respostas da Astra aos questionamentos:

O Bradesco afirma não ter acordo com a Astra para comercialização de seus produtos, a exemplo do CDB Bradesco, distribuídos nas agências do Bradesco. A Astra vendeu o produto sem autorização do Bradesco?

A Astra não vende, não intermedia ou oferece produtos em nomes de terceiros. Ela faz gestão de fundos ou de carteiras administradas que investem em diversos ativos, conforme a legislação. Suas operações são lícitas, regulares e não conflitam com qualquer regra legal. Todo o investidor é informado dos riscos das carteiras, assim como das suas características, além de contar com apoio, na tomada de decisão, de um agente autônomo.

Por que a Astra tem demorado a efetivar os resgates solicitados e passou a condicionar a liberação à assinatura de um termo de confidencialidade não previsto no contrato?

Não há exigência de qualquer documento específico na forma de Termo de Confidencialidade. Exige-se sim termo de quitação/recibo, o que é natural quando ocorrem pagamentos entre partes de um negócio. Os resgates demandados estão programados e ocorrendo no prazo acordado, com exceção de um caso em que a Astra ajuizou pedido para efetuar o pagamento.

A revelação sobre o descumprimento contratual que está sendo denunciado preocupa a Astra e motivou a exigência de assinatura de tais termos para liberar os resgates?

Não. A Astra é uma empresa experiente em gerenciamento de estratégias de investimentos, foi criada em 2005 e está credenciada junto à CVM. Ao longo de seus 13 anos, a Astra construiu um nome respeitado e reconhecido pela ética, competência e responsabilidade social no mercado nacional. Não há exigência de qualquer documento específico na forma de Termo de Confidencialidade. Exige-se sim termo de quitação/recibo, o que é natural quando ocorrem pagamentos entre partes de um negócio. Os resgates demandados estão programados e ocorrendo no prazo acordado, com exceção de um caso em que a Astra ajuizou pedido para efetuar o pagamento.

Clientes temem ter sido alvo de um golpe, uma pirâmide. A Astra assegura a legalidade da transação e capacidade para cumprir os termos dos investimentos firmados com seus clientes?

Não há qualquer ligação com pirâmide. Há lastro real e as operações executadas são todas regulares, lícitas e legais. Em seus 13 anos, a empresa nunca teve qualquer problema do gênero.

A Astra passa por alguma crise que tenha causado essa situação?

Não. A Astra é uma empresa experiente em gerenciamento de estratégias de investimentos, criada em 2005 com o propósito de trazer investidores internacionais ao Brasil. Foi a primeira gestora brasileira a aderir aos padrões de investimento responsável das Nações Unidas. A Astra está credenciada junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que é o órgão federal capacitado para fiscalizar, normatizar, disciplinar e desenvolver o mercado de valores mobiliários no Brasil. Ao longo de seus 13 anos, a Astra construiu um nome respeitado e reconhecido pela ética, competência e responsabilidade social no mercado nacional.

Sobre o temor da existência de uma pirâmide, a assessoria da Astra esclareceu ainda que, numa pirâmide, os pagamentos dos investidores vêm das aplicações feitas pelos novos membros e há necessidade de constante crescimento da base de investidores, o que ela nega ser o caso da Astra.

“Não há obrigação dos investidores de continuar com a oferta da carteira a mais pessoas, formando vários níveis ou cadeias como numa pirâmide. Não é isso que acontece neste caso”, garantiu a Astra.

'CALÚNIA'

Após o recebimento das respostas, o Diário do Poder voltou a entrar em contato com a Astra, para que comentasse a respeito dos bloqueios de mais de R$ 600 mil já determinados pela Justiça de Alagoas nas contas da Astra. E ainda sobre a disposição dos investidores em recorrer ao MPF de São Paulo sobre para que apure eventuais indícios de crimes contra o sistema financeiro.

Esta outra resposta veio por meio de nota em que a Astra cita a situação dos dois clientes, a empresa Cetos e Luiza Barcellos Sobral, que pediram e obtiveram na Justiça a determinação dos bloqueios das contas da empresa.

Leia a íntegra da posição da Astra:

NOTA:

A Astra investimentos informa que o processo da Cetos nem mesmo chegou a ser  encaminhado porque o crédito do resgate já havia sido processado bem antes de se ter ciência do mesmo. O crédito não estava relacionado a nenhum processo.

Já a reclamação de Luiza Barcellos Sobral foi indeferida pela 2ª Vara Cível de São Miguel dos Campos, onde ela havia dado entrada. Segundo a decisão da Justiça isso ocorreu porque ela não apresentou provas e precisava anexar mais argumentos.

A Astra respondeu com uma reconvenção, que é quando um acusado propõe uma ação contra o autor – neste caso por calúnia, difamação, lucros cessantes e fraude e por dúvidas da origem dos recursos.

A Astra também ajuizou pedido para efetuar o pagamento a Luiza, corrigindo o valor a um maior do que o solicitado na ação dela, pois a rentabilidade foi maior. Ressaltamos que a empresa é que teve a iniciativa de pedir judicialmente para concluir o crédito.

‘SEM RECONVENÇÃO’

Diante da nota da Astra, o advogado José Pinto de Luna encaminhou as seguintes informações, em que evidencia a ausência de reconvenção da ação da cliente Luiza Barcelos Sobral. em acusação de calúnia e outros crimes, como afirmou a Astra.

Quanto à parte da Cetos, nós pedimos a desistência da ação, pois eles pagaram após inúmeros contatos e tentativas de reaver o valor “aplicado”.

Note-se que o valor resgatado foi em três depósitos em dias distintos e mais de 40 dias após ser solicitada a devolução do dinheiro.

Diante da demora e inércia da Astra, a Cetos ajuizou a ação e desistiu dela após receber o valor integral.

Neste processo o Juiz concedeu a liminar para bloqueio de ativos, mas pedimos a reconsideração da decisão pelo fato de ter sido efetuado o pagamento. A isso dar-se o nome de lealdade processual por nossa parte.

Quanto à ação ajuizada por Luiza Barcellos Sobral perante a 2a Vara Cível de São Miguel dos Campos, a qual foi autuada sob número 0700072-23.2018.8.2.0053, vale destacar que a magistrada a princípio não reconheceu a tutela de urgência, sendo que numa segunda oportunidade, após a emenda da petição inicial e o pedido de reconsideração, a Juíza deferiu a tutela de urgência e determinou o bloqueio de ativos financeiros da Astra Investimentos Ltda e da Astra Holdings Ltda.

As decisões estão livres para consultas no sítio do TJAL. Nele não consta qualquer menção à alegada reconvenção ou qualquer outro processo incidental, conforme mencionado na nota da empresa embusteira, a qual repudia-se neste ato por não ser verdadeira quanto ao prejuízo causado à Luiza Barcellos Sobral, bastando, reitera-se, uma simples consulta aos autos no sítio do TJAL para se constatar a inverdade contida na nota em questão.

Esta é a realidade do fato em apreço.

José Pinto de Luna

Advogado OAB/AL 9820-A

DIREITO À INFORMAÇÃO

Após a publicação desta matéria, a assessoria da Astra quastionou o uso das imagens dos sócios da empresa, encontradas pela reportagem nas redes sociais de Andrew Jenner. E ainda solicitou a retirada das fotos, evocando o direito de preservação da imagem pessoal dos responsáveis pela empresa. Mas o Diário do Poder decidiu manter as fotos publicadas, diante do interesse público do tema, bem como do direito à liberdade de informação a respeito de quem são os responsáveis pelas aplicações questionadas pelos clientes.

A Astra ainda tratou da negativa da existência do pedido de reconvenção, pelo advogado dos clientes, que ainda não estava disponível no sistema de consulta pública do Tribunal de Justiça de Alagoas, no domingo (25). A empresa esclareceu que a movimentação foi atualizada e tornada pública pelo TJ/AL e enviou o documento ao Diário do Poder.

"Por motivos que só o Tribunal pode lhe explicar, houve um atraso entre a entrada dos papeis e a atualização no sistema, que não sabemos se comum ou pontual. O fato é que a existência do pedido dos advogados está comprovada, contrariando a fala do advogado. E embora tenha subido no sistema para o público somente hoje [segunda], a documentação foi entregue aos representantes do Tribunal na terça-feira da semana passada, dia 20 de março de 2018", disse a Astra. 

A empresa destaca trecho em que afirma disposição em fazer o pagamento à cliente Luiza Barcellos Sobral: “… requer nos moldes do art. 540 e ss do Código de Processo Civil, o depósito nos autos da quantia equivalente ao valor investido de R$ 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil reais), corrigidos pelos índices de remuneração previstos no contrato firmado entre as partes totalizando R$ 394.761,31 (trezentos e noventa e quatro mil, setecentos e sessenta e um reais e trinta e um centavos)”.

E reforçou que não funciona como uma “representante autorizada” ou “concessionária” de outra instituição financeira, ao citar a referência ao "CDB Bradesco". "Como gestora de investimentos credenciada pela CVM, tem o poder de comprar ativos de outras instituições para formar os fundos e carteiras que administra sem que isso necessite de autorização. Suas operações são lícitas, regulares e não conflitam com qualquer regra legal A publicidade da Astra para aquisição de clientes está ancorada na competência de seus profissionais e de mais de 13 anos de vida no mercado financeiro, sem que jamais tivesse se valido do nome de qualquer instituição financeira para validar ou robustecer sua atividade".

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