Obra do DNIT

Contrato forjado de R$ 1,2 milhão ocultou propina da Queiroz ao PP, diz delator

Quantia era de dívida da empreiteira com o partido e ex-Petrobras

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Um contrato forjado com a Construtora Queiroz Galvão, em obras do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), serviu para justificar o repasse de pelo menos R$ 1,2 milhão da empreiteira – alvo da 33ª fase da Operação Lava Jato – para o PP no esquema de corrupção e propinas da Petrobras. O doleiro Leonardo Meirelles declarou à Polícia Federal que nunca executou os serviços contratados e que o dinheiro foi lavado usando uma sistemática de falsos contratos, remessa de valores para contas na China e entregas de dinheiro vivo no Brasil.

Alvo da Operação Resta Um, nome da 33ª fase deflagrada nesta terça-feira, 2, a Queiroz Galvão assinou contrato, em 2012, com a KFC Hidrossemeaduras Ltda.. A empresa foi comprada por Meirelles para lavar dinheiro, segundo ele confessou em depoimentos prestados à força-tarefa da Lava Jato, em janeiro e junho.

Os investigadores têm no inquérito o contrato, pelo valor de R$ 1,3 milhão. Ele prevê a prestação de serviços pela KFC de “drenagem, meio ambiente e obras civis”, como subcontratada da Queiroz Galvão nas obras de ampliação e modernização do trecho da BR-101 que faz a ligação entre Florianópolis (SC) e Osório (RS).

“Não houve prestação de serviços pela KFC nesse contrato específico”, afirmou Meirelles, ouvido pela delegada Renata da Silva Rodrigues, da equipe da Lava Jato, em Curitiba, no dia 27 de julho. “As medições foram forjadas.”

Operadores. O repasse de valores, segundo apurou a Lava Jato, era um pedido de dois operadores de propinas ligados ao PP, o doleiro Alberto Youssef – parceiro de Meirelles, nos negócios de lavagem – e Henry Hoyer de Carvalho, que foi assessor do ex-senador da Paraíba Ney Suassuna.

Youssef explicou aos investigadores da Lava Jato que, em 2012, seu papel de operador oficial das propinas do PP arrecadadas via ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa havia sido assumido por Carvalho.

O doleiro disse que foi procurado naquele ano pelo sucessor, que informou que a Queiroz Galvão necessitava pagar R$ 1,6 milhão para Costa e ao PP “referente ao ‘saldo devedor’”.

Em delação premiada, o doleiro havia declarado que como operador do PP teve acesso a uma contabilidade da propina devida pela empreiteira para o ex-diretor da Petrobrás e ao partido que registrava R$ 37 milhões, em 2010. Os valores teriam relação com a corrupção nos contratos da estatal petrolífera.

A movimentação financeira entre a Queiroz Galvão e Meirelles e o contrato falso integram o rol de novas provas de envolvimento dos executivos da empreiteira no esquema sistematizado de corrupção descoberto na Petrobrás – e que teria sido replicado em outras estatais e órgãos do governo. Nele, partidos da base como PT, PMDB, PP e PTB loteavam postos-chaves para arrecadar propina nos contratos federais.

Dois ex-executivos da empresa, Ildefonso Colares Filho e Othon Zanoide Moares Filho foram presos nesta terça. Um  diretor da Quip S.A., empresa controlada pelo grupo, que está na China, tem prisão decretada pelo juiz federal Sérgio Moro.

Na Petrobrás, maior caixa de investimentos da União, o PP tinha a Diretoria de Abastecimento. Nos autos da Resta Um, a delegada informa que “Youssef teria concordado em ajudar Henry Hoyer, então operador de Paulo Roberto Costa e do Partido Progressista, no recebimento e repasse da propina”.

“Para tanto, (Youssef) buscou Leonardo Meirelles, o qual havia se tornado sócio da KFC Hidrossemeadura, empresa operante, que já mantinha contratos com a Queiroz Galvão”, informa a delegada. A KFC foi contratada em outra obra do Dnit com a Queiroz, na rodovia BR-060, em Goiás.

No pedido de prisões da Resta Um, a PF resume que “coube a Meirelles providenciar a emissão de notas fiscais ideologicamente falsas contra a Queiroz Galvão, a fim de justificar o repasse de R$ 1,6 milhão para a conta da KFC”. “Ato contínuo, Meirelles teria entregue a Youssef o valor em espécie, o qual providenciou a entrega de valores a Henry Hoyer, em favor de próprio Henry e de Paulo Roberto Costa.”

O ex-diretor da Petrobrás indicado pelo PP ao cargo foi o primeiro alvo da Lava Jato a fechar acordo de delação premiada, em agosto de 2014. Ele confessou que recebeu R$ 300 mil em espécie de Hoyer, em 2012.

Lavagem. Meirelles, que já foi preso pela Lava Jato, e passou a responder em liberdade aos processos em que é réu por auxiliar na complexas e sofisticada estrutura de lavanderia de dinheiro montada por Youssef, deu todo caminho do dinheiro para os investigadores.

“Leonardo Meirelles apresentou ainda o exato caminho percorrido pelo dinheiro: após o depósito na conta da KFC de R$ 1,285.586,22 no dia 10 de abril de 2012, o valor foi transferido para a conta de outras empresas controladas por ele (Labogen, HMAR e RMV)”, informa a PF.

A Labogen, usada no esquema, foi uma empresa do setor farmacêutico alvo de outro processo da Lava Jato.

Dessas contas no Brasil o dinheiro passou para uma corretora, a Pionneer, para fechamento de contrato de câmbio. “Tal procedimento era absolutamente corriqueiro para Meirelles, que assim efetuou diversas operações de lavagem de capitais e evasão de divisas”, registra da delegada. Os extratos dessas operações foram todos entregues à Lava Jato.

Na China os recursos chegavam em contas mantidas por ele em nome das empresas RFY Import & Export e DGX Import & Export. “Os recursos então eram enviados para contas de Meirelles na China (RFY e DGX), para possibilitar operação de dólar cabo, ou seja, a ‘internalização’ dos valores em território nacional por meio de um sistema paralelo de câmbio, a fim de que pudesse entregar valores em espécie a Alberto Youssef no Brasil, já descontados os valores cobrados a título de taxa/comissão”, explica a delegada da Lava Jato.

A complexa engenharia financeira foi a mesma usada por ele, Youssef e outra doleiro da Lava Jato Nelma Kodama para esquentar dinheiro de comerciantes da rua 25 de Março, em São Paulo – principal centro de comércio informal do País. (AE)

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