Do mensalão ao petrolão

Contrato de Marcos Valério levou Lava Jato a alvos da 27ª fase

PF prendeu nesta sexta o empresário Ronan Maria Pinto e o petista Silvio Pereira

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A descoberta de contrato apreendido pela Polícia Federal, em março de 2014 – quando foi deflagrada a Operação Lava Jato – no escritório da contadora do doleiro Alberto Youssef, Meire Pozza, levou os investigadores ao empresário Ronan Maria Pinto e seus negócios com o PT. O empresário e o ex-secretário-geral do partido Silvio Pereira foram presos temporariamente nesta sexta-feira, 1, alvos da 27ª batizada de Operação Carbono 14.

É um contrato de mutuo, no valor de R$ 6 milhões, de 2004 envolvendo a empresa 2S Participações Ltda, do publicitário Marcos Valério, a Expresso Nova Santo André, do empresário Ronan Maria Pinto, de Santo André – investigado na morte do prefeito petista de Santo André, em 2002 -, e a Remar Agenciamento e Assessoria. Assinam os representantes da 2S e da Remar.

No mesmo ano, 2004, o Banco Schahin concedeu um empréstimo para o pecuarista José Carlos Bumlai – preso desde novembro do ano passado, pela Lava Jato – de R$ 12 milhões. O valor, segundo admitiu o amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi tomado por ele a pedido do PT. Ele e um dos delatores dos processos citaram os nomes de Silvio Pereira e do ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares – levado coercitivamente para depor hoje – na operação.
“Constatou-se que Jose Carlos Bumlai contraiu um empréstimo fraudulento junto ao Banco Schahin em outubro de 2004 no montante de R$ 12 milhões. O mútuo, na realidade, tinha por finalidade a “quitação” de dívidas do Partido dos Trabalhadores(PT) e foi pago por intermédio da contratação fraudulenta da Schahin como operadora do navio-sonda Vitória 10.000, pela Petrobras, em 2009, ao custo de US$ 1,6 bilhão”, informou a força-tarefa da Lava Jato.

“A partir de diligências, descobriu-se que, do valor total emprestado de R$ 12 milhões a Bumlai, pelo menos R$ 6 milhões tiveram como destino o empresário do município de Santo André (SP), Ronan Maria Pinto.”

Mensalão. O Ministério Público Federal sabia, desde 2012, da existência de um negócio que envolveria R$ 6 milhões e os investigados do mensalão. O publicitário mineiro Marcos Valério, operador de propinas no mensalão, afirmou em tentativa de delação premiada naquele ano – quando seria condenado – que dirigentes do PT pediram a ele R$ 6 milhões. O dinheiro seria destinados ao empresário Ronan.

Segundo Valério, isso serviria para que o empresário de Santo André parasse de “chantagear” o ex-presidente Lula, o então secretário da Presidência, Gilberto Carvalho, e o então ministro da Casa Civil, José Dirceu – preso desde março, pela Lava Jato, em Curitiba.

Ronan tentava relacionar Lula, Carvalho e Dirceu a suspeitas de corrupção na cidade que teriam motivado o assassinato do prefeito Celso Daniel, em 2002 – a conclusão da polícia paulista é de que ele foi vítima de um crime comum, não político. Bumlai teria sido uma das pessoas que teria atuado nesse episódio de suposta compra do silêncio do empresário de Santo André.

O empresário negou qualquer relação com o caso, e disse não conhecer nem Bumlai nem Marcos Valério.

Contrato confidencial. Dois anos depois das afirmações de Valério, em delação que acabou não sendo fechada, o contrato dos R$ 6 milhões da empresa do publicitário envolvendo empresa de Ronan foi apreendido no escritório da contadora de Youssef durante as buscas da Lava Jato.

O material intitulado “Enivaldo confidencial” seria um contrato “referente a um proprietário de uma empresa de ônibus de Santo André/SP” que era guardado a “sete chaves”, contou Youssef em seu termo de delação 25, prestado em 26 de outubro de 2014.

“(Youssef) sabia que Enivaldo Quadrado tinha os documentos guardados no escritório de contabilidade de Meire Pozza, a pedido daquele, por uma questão de resguardo pessoal”, explicou Youssef. Questionado pela força-tarefa da Lava Jato sobre o que ele temia, o doleiro disse não saber, mas era algo que guardava “a sete chaves”.

“Enivaldo Quadrado disse que preparou a triangulação de pessoas que figurariam em tal contrato”, explicou Youssef. “O contrato foi feito entre a empresa de Marcos Valério, istó é, a 2S Participações Ltda, e uma outra empresa que Enivaldo indicou.” A empresa, para os investigadores, é a Remar. Para isso, o ex-dono da Bônus-Banval “receberia dinheiro ou algum outro favor”, contou.

Segundo o doleiro, quem pediu para que Enivaldo Quadrado fizesse o documento “era uma pessoa ligada ao Partido dos Trabalhadores – PT, chamada Breno Altman”. “Sabe que Breno Altman é ligado ao PT, pois o declarante (Youssef) foi a Cuba duas vezes realizar negócios e o mesmo estava presente. O pai de Breno foi um dos fundadores do PT”, registra a força-tarefa, no termo de delação.

Breno Altman é jornalista e consultor internacional, com relação próxima com o ex-ministro José Dirceu. Ele nega qualquer envolvimento no caso, diz nunca ter visto Bumlai. Ele foi levado coercitivamente para depor, nesta sexta-feira, alvo da Operação Carbono 14.

“Indagado sobre o que motivou Breno a realizar tal operação, foi o fato de que o PT estaria sendo ameaçado por conta do caso ‘Celso Daniel’, de maneira que a documentação foi preparada para atender a determinada pessoa, que seria o proprietário de uma empresa de ônibus.”

O doleiro disse que não poder especificar o tipo de chantagem estaria envolvida, mas que ela “objetivava que tal pessoa ‘ficasse quieta’ em relação ao Caso Celso Daniel”.

Os procuradores da Lava Jato afirmaram nesta sexta-feira, 1, que “para fazer os recursos chegarem ao destinatário final, foi arquitetado um esquema de lavagem de capitais, envolvendo Ronan, pessoas ligadas ao Partido dos Trabalhadores e terceiros envolvidos na operacionalização da lavagem do dinheiro proveniente do crime contra o sistema financeiro nacional”.

“Há evidências que apontam que o Partido dos Trabalhadores influiu diretamente junto ao Banco Schahin na liberação do empréstimo fraudulento. Para chegar ao destinatário final Ronan Maria Pinto, os investigados se utilizaram de diversos estratagemas para ocultar a proveniência ilícita dos valores e a identidade do destinatário final do dinheiro obtido na instituição financeira.” (AE)

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