Independência incômoda

Reconciliação de Renan Filho não garantiu rendição de deputada do clã Pereira

Jó Pereira expôs governador como a favor de mais impostos e contra mais recursos para pacientes com câncer

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A sessão ordinária desta terça-feira (9) deu mais uma demonstração de que a deputada estadual Jó Pereira (MDB-AL) não está disposta a amolecer sua postura contestadora de medidas do governo de Renan Filho (MDB), mesmo depois de o governador de Alagoas se reconciliar com o terceiro maior clã político do Estado, incluído entre as vítimas da retaliação do chefe do Executivo ao parlamento, em janeiro, por rejeitar apoio à proposta de eleger seu tio Olavo Calheiros (MDB-AL) para presidir o Legislativo.

A atuação parlamentar da deputada Jó Pereira contraria a lógica da velha política praticada por Renan Filho, ao seguir defendendo a derrubada de vetos do governador. E voltou a expor ontem que o governador foi contra uma emenda que destina 1% do Orçamento do Estado, mais de R$ 100 milhões, para o atendimento a pacientes com câncer.

Na sessão de hoje (10), Jó Pereira não deve mudar seu entendimento de que foram ilegais os descontos previdenciários feitos pelo governador nos valores do rateio do Fundeb pagos aos professores. Tudo isso depois de a deputada ter o irmão Fernando Pereira no centro da tentativa de “toma lá, dá cá” de Renan Filho, que o exonerou do comando da Assistência Social e o renomeou como secretário do Meio Ambiente, ao sabor das suas conveniências de tentar colocar seu tio Olavo na linha de sucessão e de suas dificuldades após a reação dos deputados à atitude coronelista.

Ao Diário do Poder, a deputada ponderou sobre ser oposição ou situação. Mas lembrou que já destacou em discurso recente na tribuna da Casa, que Alagoas precisa exercitar menos palanques e mais gestão. Na ocasião do discurso, Jó Pereira reagia justamente à crítica do tio de Renan Filho, que tentou colocar-lhe a pecha de oposicionista.

“Discordo das posturas de oposição por oposição e situação por situação. É preciso equilíbrio, independência, coisas que sempre busquei nos últimos quatro anos e três meses de mandatos, e vou continuar buscando. Tenho compromisso com Alagoas e com cada alagoano e cada alagoana. Não sou oposição ao governo, nem ao governador, a quem desejo sucesso, e também não sou situação por ter familiares ou aliados contemplados no governo. Essas alianças fazem parte do processo democrático e tenho certeza que o grupo político do qual faço parte, com orgulho, pode colaborar com o sucesso do governo e não para pautar minha atuação parlamentar. Continuarei fazendo oposição a erros, ausências e omissões e valorizando acertos, realizações e caminhos que levem a melhoria da qualidade de vida dos alagoanos, principalmente os mais necessitados”, respondeu Jó Pereira, à reportagem.

Antes de se reaproximar da família Pereira, o governador sinalizou apoio ao prefeito de São Miguel dos Campos (AL), Pedoca Jatobá (DEM), no único grande município que o clã da deputada ainda não conquistou em seu reduto político em Alagoas. Dependendo de como a relação de poder se desenvolva, Fernando Pereira deve ser o nome a ser apoiado pelo governador para ser prefeito de São Miguel, em 2020, fechando o domínio dos Pereira na região que já é administrada por Joãozinho Pereira (MDB), em Teotônio Vilela (AL); pelo sucessor de Fernando Pereira, Carlos Augusto, em Junqueiro; e Pauline Pereira (PMB), em Campo Alegre.

Governador Renan Filho com o secretário de Meio Ambiente, Fernando Pereira. Foto: Márcio Ferreira/Agência Alagoas

Independência e orçamento impositivo

Ao defender o que Renan Filho negou para os pacientes com câncer, Jó Pereira evidenciou as dificuldades, dores e desafios do combate ao câncer e a possibilidade que a derrubada do veto traria para a devolução da esperança para essas pessoas. E ressaltou que derrubar veto é também a garantia do exercício de uma fundamental prerrogativa parlamentar, de propor emendas ao orçamento. No caso dos pacientes oncológicos, a deputada lembrou que destinar 1% do Orçamento para a ação seria a correção de um déficit histórico de atenção à saúde do alagoano.

“Não é esse governo que critico, e sim um histórico de só gastar os 12% na saúde, previsto como mínimo na Constituição, prática de todos os governos passados. Alagoas precisa mudar isso, e podemos contribuir com o governador, derrubando o seu veto a essa nossa emenda”, defendeu Jó Pereira, em plenário.

Quando questionada se ainda há ambiente e disposição do parlamento para reeleger o presidente Marcelo Victor (SD-AL) e votar orçamento impositivo ainda neste mês de abril, apesar do esforço de reaproximação de Renan Filho com sua antiga base aliada, a deputada disse entender que, independente de qualquer cenário, o Poder Legislativo deve manter a sua independência.

“O orçamento impositivo, essa é uma tendência nos parlamentos estaduais, seguindo o que já ocorre no Congresso Nacional, inclusive com avanços recentes conquistados na atual legislatura. As emendas parlamentares são prerrogativa do parlamento, o fato de torná-las impositivas, por meio de gradual implantação, fortalece o parlamento e o aproxima da população. […] Esse é um processo democrático, que protege comunidades de retaliações políticas, sendo essas emendas um instrumento que proporciona um percentual do orçamento para contemplar a representação de todos os deputados”, respondeu Jó Pereira ao Diário do Poder.

A deputada argumenta ainda que, assim como o Executivo foi escolhido pelo projeto apresentado para o Estado, cada parlamentar tem sensibilidade e representatividade das necessidades de regiões, municípios e comunidades, podendo contribuir com emendas para solução dessas necessidades. “Entendo como natural e importante que cada parlamentar trabalhe no sentido de ver aprovada essa conquista do Congresso, também aqui no estado”, concluiu.

Também na sessão de ontem, Jó Pereira defendeu a derrubada do veto parcial ao Projeto de Lei nº 686/2018, que institui o Programa Contribuinte Arretado, concede remissão, anistia e reinstituição de benefício fiscais do ICMS e altera leis estaduais. O objeto do veto do governador era manter a cobrança de ICMS sobre o deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte, já pacificada como não gerador de importo pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), segundo a parlamentar.

O líder do Governo, deputado Sílvio Camelo (PV-AL), pediu o adiamento dos vetos que seriam apreciados ontem. E só deve retornar com as matérias para inclusão na pauta na próxima terça-feira (16).

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