Provas não analisadas

MP recorre ao STJ para condenar ex-deputado João Beltrão por pistolagem, em Alagoas

Recurso quer revogar decisão do TJAL que inocentou pai do ex-ministro Marx Beltrão

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Tratado como a “maior personificação do crime organizado de Alagoas” pelo procurador-geral de Justiça de Alagoas, Alfredo Gaspar de Mendonça Neto, o ex-deputado estadual João Beltrão (PRTB) voltará a ser julgado pelo crime de pistolagem contra o cabo José Gonçalves da Silva Filho, executado há quase 23 anos. O chefe do Ministério Público de Alagoas (MP/AL) ajuizou, nesta quarta-feira (9), um recurso especial junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para contestar decisão do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL), que inocentou o pai do deputado federal Marx Beltrão (PSD-AL), alegando ter faltado “provas robustas” à acusação do órgão ministerial.

Alfredo Gaspar garante que há, sim, provas importantes juntadas aos autos, e que o TJAL alegou não ter obrigação de analisar todas elas, apesar de estas alicerçarem a acusação. E relata que a Corte Alagoana aceitou apenas em parte um recurso anterior que já havia sido ajuizado pelo MP de Alagoas, no ano passado, quando o deputado estadual João Beltrão ainda respondia à ação penal que o acusava de ter sido o autor intelectual do assassinato do Cabo Gonçalves, em 1996. (Veja a íntegra do recurso no final da matéria)

Em outubro de 2017, quando o TJAL inocentou o então parlamentar neste caso, o chefe do MP argumentou que, apesar de ter julgado a ação, os desembargadores alagoanos ignoraram “provas importantes juntadas aos autos” e, por isso, o acórdão que trouxe a decisão continha omissões e contradições.

“Observe-se, inicialmente, que, a decisão ora atacada se omitiu quanto a duas importantes provas levantadas pelo Ministério Público: a primeira, o depoimento de Garibalde Santos de Amorim (fls. 200/202) e, o depoimento da vítima José Gonçalves da Silva Filho, tomado antes de sua execução (fls. 203/210). Conquanto o acórdão recorrido tenha feito breve menção, em relatório, quanto à existência de tais depoimentos, não os considerou em sua fundamentação, não levando em conta os elementos de convicção contidos no depoimento de testemunha inquirida a título de prova antecipada, nem mesmo o depoimento da própria vítima, ouvida cerca de dois anos antes de ser morta”, alegou o chefe do MP de Alagoas.

Além do caso do Cabo Gonçalves, o MP sustenta que também teriam sido assassinados a mando de João Beltrão, as vítimas Pedro Daniel de Oliveira Lins, conhecido como “Pedrinho Arapiraca”, morto no dia 09 de julho de 2001, em Taguatinga-TO; e o bancário Dimas Hollanda, trucidado por pistoleiros em 03 de abril de 1997.

Alfredo Gaspar de Mendonça Neto chefia o MP de Alagoas. Foto: Márcio Ferreira/Agência Alagoas

Farra e ‘gangue fardada’

Alfredo Gaspar explica que Garibalde Santos de Amorim era motorista e segurança do ex-tenente-coronel Manoel Francisco Cavalcante, acusado de chefia a ‘gangue fardada’. E confessou ter ouvido conversas sobre a morte do cabo Gonçalves, que teria ocorrido após a vítima se recusar a matar uma pessoa.

“Marcos Cavalcante, o Jeovânio e o próprio Cavalcante comentaram com o depoente que passaram dois dias fazendo farra no Pontal, comemorando a morte do cabo Gonçalves e que, após o assassinato, ouviu comentários de policiais dizendo quem participou daquele assassinato e que sabe que o problema entre o cabo Gonçalves e as pessoas do Cavalcante e João Beltrão começou porque o Cavalcante e João Beltrão mandaram cabo Gonçalves matar uma determinada pessoa, que ele não lembra quem, e ele não aceitou, daí surgiu o incidente”, diz um trecho do embargo, que cita outras partes do processo.

Nesses mesmos embargos, o procurador-geral de Justiça também alegou que os desembargadores cometeram contradição, uma vez que, ora eles disseram que o Ministério Público se valeu “unicamente de indícios exclusivamente policiais e sem prova judicial”, ora reconheceram, em diversos momentos, que a “acusação é embasada, dentre outros, por prova antecipada”.

Ainda assim, o TJAL, ao julgar o mérito, resolveu, a unanimidade, acolher em parte os embargos, segundo o MP de Alagoas, unicamente para suprimir a contradição apontada quanto à produção de prova antecipada, deixando, no entanto, de conceder efeitos modificativos à sua decisão anterior de absolvição. O que motivou o recurso à instância superior.

“O acórdão recorrido viola diretamente o art. 619 do Código de Processo Penal, na medida em que não reconhece as omissões apontadas nos embargos de declaração opostos pelo Parquet, e os arts. 121, §2º, I e IV, e 29 do Código Penal, na medida em que ignora a adequada valoração das provas colhidas absolvendo o réu por falta de provas”, argumentou Alfredo Gaspar.

Julgou sem checar provas

O chefe do MP contesta a postura do TJAL de alegar que não cabia à Corte se pronunciar acerca de todos os depoimentos existentes no processo, sem, no entanto, conhecer todas as provas que alicerçam a acusação.

“Não há lógica em afirmar que o feito deve ser extinto por falta de provas e, concomitantemente, afirmar que não tem o dever de avaliar todas as provas contidas nos autos. O julgador só não precisa rebater todas as questões suscitadas pelas partes, unicamente quando já possua fundamentação bastante para proferir a decisão. E, no caso em tela, a corte de Justiça local deixou de considerar os elementos de convicção colhidos em sede de produção antecipada de prova em conjunto com as demais arrecadadas em juízo, ignorando, assim, argumentos aptos a infirmar a conclusão adotada”, detalhou Alfredo Gaspar, ao pedir a reforma do acórdão que negou vigência de artigos do Código de Processo Penal e do Código Penal, para que João Beltrão seja condenado como autor intelectual do crime que trucidou Cabo Gonçalves. 

O MP relata que, no dia 09 de maio de 1996, por volta das 11h, no Auto Posto Veloz, localizado na Avenida Menino Marcelo, no Tabuleiro dos Martins, as pessoas de Paulo Ney de Moraes, Jaires da Silva Santos, Valdomiro dos Santos Barros, Talvanes Luiz da Silva, Eufrásio Tenório Dantas, Daniel Luiz da Silva Sobrinho, Marcos Antônio Cavalcante, José Luiz da Silva Filho e Manoel Francisco Cavalcante, utilizando-se de armas de fogo, disparam vários tiros contra o Cabo Gonçalves, que teve morte instantânea, sem chance de defesa.

Veja a íntegra do recurso ajuizado por Alfredo Gaspar junto ao STJ. (Com informações da Comunicação do MP de Alagoas)

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