Processo penal lento

Governador do Rio pede aperfeiçoamento de audiências de custódia

Segundo Wilson Witzel, audiências tornam o processo penal brasileiro mais lento

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Governador do Rio de Janeiro. Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, disse nesta terça-feira (9) na Câmara dos Deputados que as audiências de custódia realizadas no País precisam ser aperfeiçoadas, porque tornam o processo penal brasileiro mais lento e adotam como regra a cultura de liberar o preso em flagrante delito.

A audiência de custódia consiste na apresentação do preso em flagrante delito a um juiz de Direito no prazo máximo de 24 horas. O instrumento está previsto no Pacto de San José da Costa Rica – tratado internacional sobre direitos humanos firmado em 1969 – e compreende a perspectiva de humanização dos procedimentos judiciários.

Witzel, que atuou por 17 anos como juiz de Direito – dez deles na área criminal – participou de reunião que debateu, na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, o fim das audiências de custódia. “Acaba sendo um momento em que o juiz, sabendo que não há vagas no sistema prisional e que o preso vai sair dele pior do que entrou, segue uma cultura de evitar ao máximo que o sujeito fique preso”, disse.

Projeto

A reunião foi sugerida pelos deputados Léo Moraes (Pode-RO) e Gurgel (PSL-RJ), para discutir o Projeto de Decreto Legislativo 317/16, em análise na Casa. O projeto pretende anular a Resolução 213/15, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que regulamenta a realização dessas audiências no País.

É na audiência de custódia que o magistrado analisa se houve tortura ou maus-tratos, entre outras irregularidades, durante a prisão. Segundo Witzel, esses atos arbitrários praticados por policiais são exceção. Ele defendeu uma reforma do sistema penitenciário brasileiro e criticou ainda a lentidão do Ministério da Justiça em aprovar projetos de novos presídios.

“O sistema penitenciário no Brasil está uma bagunça. Se não arrumar esse sistema, não adianta criar penas mais graves nem equipar as polícias”, afirmou.

Defensoria Pública

O presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos, Pedro Paulo Coelho, rebateu os argumentos de Witzel. “No Rio de Janeiro, apenas 26% das pessoas [presas em flagrante] são soltas, o restante continua preso e respondendo ao processo preventivamente”, disse.

Segundo ele, mais de 70% das pessoas que passam pelas audiências de custódia são pretos e pardos que têm nesse mecanismo uma oportunidade única de orientação jurídica. “O que não podemos aceitar como civilização é um catador de lixo ficar preso por dez meses até ter o primeiro contato com sua defesa. Isso não é civilização”, acrescentou.

Coelho defendeu a resolução do CNJ e disse que ela não pode ser sustada por projeto de decreto legislativo, já que a Constituição não prevê a sustação de atos do Judiciário pelo Legislativo.

PM-DF

O corregedor da Polícia Militar do Distrito Federal, Leonardo dos Santos, atribuiu às audiências de custódia o aumento no número de inquéritos contra policiais militares (IPMs) nos últimos anos.

Segundo ele, isso se deve, em parte, ao fato de os juízes apresentarem perguntas de conteúdo afirmativo durante as reuniões. “O juiz pergunta: o senhor foi agredido? Dessa maneira, o preso pode ter a impressão de que, se afirmar que foi agredido, ele não será preso”, disse.

Santos informou que 82% dos IPMs levados ao Instituto Médico Legal (IML) para verificar agressão ao preso não resultaram em oferecimento de denúncia. “Somente 17,33% constituem materialidade para oferecimento da denúncia.

Magistrados

O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Jayme de Oliveira, criticou o fato de o CNJ ter previsto o instrumento sem criar a devida estrutura para o seu funcionamento.

“Os juízes de primeira instância, que fazem as audiências de custódia, estão insatisfeitos com a imposição de mais um instrumento em sua atividade sem a devida estrutura”, disse. Oliveira defendeu um processo penal mais eficaz e eficiente e também afirmou que a sustação da resolução do CNJ via projeto de decreto legislativo é inviável.

Fim das audiências

O vice-presidente do Conselho de Segurança Pública do Rio de Janeiro, Marcelo Monteiro, defendeu nesta terça-feira (9) o fim das audiências de custódia da maneira como são realizadas hoje.

“Não vejo necessidade da audiência de custódia para que se cumpra o pacto de San José. Existe uma outra autoridade, que é o delegado, que pode fazer esse controle”, disse Monteiro, que é procurador de Justiça.

Para ele, a resolução 213/15 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que criou as audiências de custódia, não pode ser usada para definir regras processuais penais. “Mais uma vez, a democracia representativa está sendo colocada de lado”, acrescentou ele, durante audiência pública que debateu o assunto na Câmara dos deputados.

CNJ defende resolução

O representante do CNJ na audiência pública, Luís Geraldo Lanfredi, ressaltou que, ao editar a resolução, o órgão não desrespeitou a Constituição, apenas buscou dar densidade legal a um tratado internacional. O instrumento está previsto no Pacto de San José da Costa Rica – tratado internacional sobre direitos humanos. (Agência Câmara)

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