Os Sessenta de Brasília

De cartas nunca enviadas a sindicalista. Brasília deu muito a Chico Vigilante

Quando atuava no movimento sindical, Chico afirma que jamais pensou em ser político

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O deputado Chico Vigilante tem na coerência o principal atributo e uma marca indelével: ninguém representou mais os interesses da classe trabalhadora no Distrito Federal - Foto: Dênio Simões.

Brasília mudou a vida e mexeu com o imaginário de muitos brasileiros desde que Juscelino Kubitschek aceitou o desafio de construí-la. E não foi diferente a um menino maranhense que, em meados de 1964 e mesmo sem nunca ter pisado na nova capital, escrevia cartas para sua mãe como se já vivesse no Planalto Central. Do pequeno município de Vitorino Freire, aos 20 anos de idade, Francisco Domingos dos Santos partiu para Roraima em busca de oportunidades. Não ficou muito tempo por lá e, em setembro de 1977, chegou à terra tão sonhada desde criança: Brasília.

Mesmo depois de adulto, o imaginário do filho da dona Josefa e do seu Raimundo o acompanhava. “Eu pensava que em Brasília não tinha melancia. Em Santa Inês, a caminho da capital, comprei uma melancia. Fiquei três dias com a melancia no colo. Já no meu primeiro domingo fui à Feira da Ceilândia e avistei uma fila de melancias. A minha era pequena perto daquelas”, conta, sorrindo.

A precariedade no início de sua vida na cidade também o marcou. Francisco lembra que não havia água quente na casa em que morava, em Ceilândia. Acordava cedo e tomava um banho com água gelada que, segundo ele, arrepiava todo o corpo ao primeiro contato com a pele.

Ao começar a trabalhar, Francisco só pensava em economizar dinheiro para voltar ao Maranhão e comprar um pedaço de terra. Em busca por mais direitos aos trabalhadores, participou e liderou greves que o trouxeram uma nova identidade. Nasceu, então, o Chico Vigilante. “Fizemos uma greve em 1979, em plena Ditadura Militar. O risco era grande, mas precisávamos defender nossos direitos”, relembra.

Chico Vigilante com o seu compadre.

Sempre ligado ao movimento sindical, Chico afirma que jamais pensou em ser político. Coisa que ele repugnava. “Entrei para o sindicato sem nunca ter lido livro sobre política ou participado de partido político. Tinha raiva porque os políticos no Maranhão apareciam a cada 4 anos, matavam uma vaca e faziam churrasco para gente. Depois, nunca mais apareciam”, conta.

A luta pelos trabalhadores o fez conhecer Luiz Inácio Lula da Silva, em outubro de 1979. Lula estava na cidade para votação da política de reajuste salarial. O filho de Chico foi quem chamou Lula para ser seu padrinho e, assim, os dois se tornaram compadres. “Lula gosta de Brasília e sempre se preocupou com a cidade. Ele mesmo trabalhou para que a gente tivesse o Cristovam Buarque no PT e, assim, ganhássemos a eleição para o GDF”.

Depois de 43 anos em Brasília, casado e pai de dois filhos, Chico se emociona ao declarar que a capital construída por JK e pelos trabalhadores brasileiros representa tudo em sua vida. “Saí lá do interior do Maranhão, filho de retirantes, o Chiquinho da Dona Josefa. Graças a Brasília e à nossa luta, esse menino que sonhava e escrevia cartas ficou conhecido por muita gente, no Brasil e no mundo, como Chico Vigilante”, relata, emocionado.

Para os 60 anos de Brasília, Chico espera que o povo brasileiro volte a ter consciência do que a capital e JK representam para a história do Brasil. “Brasília foi um fator de integração nacional. A visão do JK mudou nosso País. Aqueles que agrediram JK, que o chamaram de ladrão, espero que estejam pagando pela maldade e injustiça que fizeram com ele. O Brasil não seria o que é hoje se não fosse Brasília”, finaliza.

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