Ney Lopes

Um novo Bolsonaro

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Embalado pelas pesquisas, o Presidente Bolsonaro começa a agir como deveria ter agido, desde o início do seu governo. Ele deixa claro que manda no país, inclusive na política econômica. Para isso, não precisa ser técnico, ou graduado. Vale a experiência acumulada ao longo de sua vida política, no Congresso Nacional.

Este é o caminho do presidencialismo. E não se diga que é autoritarismo. Excessos e equívocos serão corrigidos pelos poderes constitucionais, imprensa livre, opinião pública e legítimos grupos de pressões sociais.

A menção é feita, pelo fato do Presidente ter pedido ao seu Ministro da Economia novo desenho do programa Renda Brasil, sem mexer no abono salarial e reduzindo ao máximo o impacto em programas sociais, já existentes. Decisão correta.

Não se trata de desprestigio à equipe econômica. Ao contrário, chama-se conciliar a indispensável austeridade econômica, com as preocupações sociais. A construção desse modelo começa com a conciliação entre regras de economia estável e a segurança social.

O Papa Francisco tem razão: “Não há democracia com fome. Nem desenvolvimento com pobreza, nem justiça na desigualdade.

O mundo mostra que as democracias quando não priorizam o social, correm o risco das ruas desmoronarem o poder eleito. O “Consenso de Washington” inspirado nas ideias do economista Milton Friedman recomendou, no final do século passado, como a “receita de bolo” para o desenvolvimento da América Latina, o desmantelamento dos serviços públicos e a aplicação da máxima de que “o crescimento é bom para os pobres”, porque acabarão se beneficiando de seus efeitos.

Após a crise financeira dos países emergentes da Ásia (1997), o declínio econômico da Rússia, Argentina e a crise americana (2008), comprovou-se o total fracasso desse Consenso de Washington.

Atualmente, até os defensores no passado dessas teses (FMI, Banco Mundial etc.) estão se transformando em promotores da economia social, convencidos de que, diante da catástrofe atual, agravada pela pandemia, será necessária a prevalência dos imperativos sociais.

“Business Roundtable”, uma associação norte-americana, na qual estão grandes empresas de todos os setores, divulgou comunicado, no qual revoga, de fato, o critério único de maximização dos lucros na tomada de decisões empresariais, substituindo-o por outro mais inclusivo, que também leve em consideração o bem-estar de todos os grupos de interesse, tais como, trabalhadores, clientes, fornecedores e às comunidades.

Como priorizar políticas sociais nos governos?

Sem dúvida é um desafio, que não pode resumir-se a “falsa premissa”, de que não há “milagre” no manejo dos recursos orçamentários e por isso a “tesoura” tem que alcançar os menos favorecidos.

Sabe-se que existem outras possíveis fontes de receita, que não significarão onerar o contribuinte.

Entretanto, os “lobbies” estruturados para a manutenção do “status quo”, quando “ameaçados”, logo alardeiam e denunciam “populismo e irresponsabilidade com gastança”. Usam como “falso escudo” o teto de gastos, que é importante, mas não pode transformar-se em regra inflexível.

Na verdade, esses “lobbies” temem que para encontrar outras fontes de receita pública, os seus atuais privilégios sejam atingidos. São sistematicamente contra a “divisão de sacrifícios”. Defendem a “rua de mão única”!

A sensibilidade política, aliada ao preparo técnico, encontrarão alternativas, como foram identificadas no socorro dado no recente auxilio emergencial. É uma questão de vontade política. Nada mais que isso.

O próprio capitalismo só prospera em sociedades que não sofram abalos sociais constantes. Essa história de que o mercado é quem dita as regras da estabilidade, não passa de conversa “para boi dormir”.

O mercado é importante influi, abre espaços de negócios, atrai ou rejeita investimentos, porém para que exerça o seu papel é imprescindível a existência de um Estado fortalecido, que não significa Estado intervencionista, mas sim regulador.

O ex-ministro Delfim Netto tem razão ao afirmar não existir mercado, sem estado.

Hoje, o Brasil enfrenta dramática recessão econômica, que exige do governo respostas ousadas para responder as consequências da pandemia. Essa tarefa pressupõe muito cuidado nas “dosagens” das políticas econômicas adotadas, para que não se transformem “em veneno” social.

Nessa ótica, agiu certo o presidente Bolsonaro ao deixar claro que o governo não despreza o social.

A “renda Brasil” é um programa necessário, nessa época de pandemia. Mas, os recursos não podem ser retirados unicamente dos assalariados, e, sobretudo, da classe média, que a cada dia vem definhando.

A primeira vítima dessa visão errônea de política econômica é o “mercado”, na medida em que, com receita reduzida, essas classes se afastam do consumo e as indústrias, lojas, departamentos, shoppings sofrem e vão à falência. O consumo das rendas elevadas vem de produtos adquiridos no exterior.

Está provado que não “se pode cobrir um santo e descobrir outro”, em matéria de gestão pública.
Por tais razões, não se justifica alimentar crise entre o Presidente Bolsonaro e o seu ministro da Economia.

Apenas, o estilo presidencial, agora se manifesta de forma mais clara. Pode-se admitir que surge um “novo Bolsonaro”, mais identificado com as suas origens de servidor público e classe média.

Não há demérito em relação ao sr. Paulo Guedes e sua equipe, cuja formação técnica é inquestionável.

Apenas, pretende-se que, no planejamento da economia, seja obedecida a regra, de que só haverá justiça, com prioridade social.

Ney Lopes – jornalista, advogado, ex-deputado federal; ex-presidente do Parlamento Latino-Americano, procurador federal – nl@neylopes.com.br – blogdoneylopes.com.br

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