Ipojuca Pontes

Um jornalista admirável

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O que é jornalismo?

Uma das definições em voga é a de que ele é uma atividade profissional que visa coletar, investigar, analisar e transmitir aos leitores informações atuais difundindo-as por meio de veículos como jornal, revista, rádio, televisão e sites eletrônicos (que formatam o moderno jornalismo digital).

Mas há quem generalize e o defina por atacado. Para William R. Hearst, dono da maior cadeia de jornais dos Estados Unidos durante meio século, “jornalismo é publicar tudo aquilo que alguém não quer que se publique. O resto é publicidade”.

A definição letal de Hearst, que inspirou Orson Welles a realizar o inventivo “Citizen Kane”, no entanto, é tida como suspeita pois Hearst, no histórico, foi considerado o pai da “imprensa marron”.

Nota: há algum tempo foi incensado com insistência o chamado  jornalismo literário, ou “novo jornalismo”, cuja pretensão era associar o jornalismo à narrativa ficcional dos fatos em detrimento do jornalismo do lead (ou lide, guia fundamental para redação do texto de jornal). Carregado pelo subjetivismo, o “novo jornalismo” pretende (pretendia) confrontar a objetividade jornalística tradicional. O engodo deu margem, por exemplo, ao escritor norte-americano Gay Talese, um dos seus cultores mais badalados, escrever uma entrevista-reportagem com Frank Sinatra sem nunca tê-lo visto ou com ele trocado palavra.

No Brasil, o “novo jornalismo” experimentado pela “Época”, deu na canela sufocado pelo ativismo ideológico – o que deixa suas reduzidas 66 páginas, pelo desprezo do leitor, encalhadas nas bancas de jornais.

E o jornalista?

Por extensão, considera-se jornalista o profissional responsável pela busca, apuração, investigação e redação de notícias, reportagens, entrevistas, artigos e notas que  tragam informações de interesse público.

Há jornalista de todo tipo: grande, pequeno, farejador, polêmico, selvagem, fofoqueiro, sério, ágil, amestrado, ideologizado, inocente (útil e inútil), corajoso, digno, consciente, venal, sensacionalista e picareta.

No Brasil, desde o pioneiro

Hipólito José da Costa, fundador do “Correio Braziliense”, tivemos jornalistas do porte um de José do Patrocínio, Evaristo da Veiga, Alcindo Guanabara, Carlos Dias Fernandes, Euclides da Cunha, Rui Barbosa, Júlio Mesquita Neto, Assis Chateaubriand, Aníbal Fernandes, Prudente de Moraes Neto, Macedo Soares, Carlos Lacerda, Joel Silveira, David Nasser, Hélio Fernandes e Roberto Marinho, entre outros menos votados.

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Bem, escrevo e escrevo e não chego ao cerne do artigo. Aqui, o meu foco  e assinalar a excelência do jornalismo praticado pelo paraibano Martinho Moreira Franco (foto), um ser humano  dotado de talento excepcional para o exercício da profissão jornalística.

Antes de tudo vale assinalar que   Martinho cresceu em redação de jornal. Iniciou-se cedo no ofício pela  tarefa de traduzir telegrama enviado por teletipo, coisa que exigia presteza e muita rapidez. Em seguida, virou revisor atento e só então, numa batida firme, se fez redator e copydesk respeitado pelo domínio do lead,  além de repórter especial e correspondente de jornais e revistas de prestígio nacional.

Experiente, exímio conhecedor da língua portuguesa e dos meandros da atividade, logo se tornou editor e secretário de redação por reconhecimento dos pares e exigência dos diretores dos jornais. Era um mestre comandando uma redação,

Sempre com paciência e bonomia. Na trilha ascensional, a despeito de sua vontade, foi intimado a dirigir a Secretária Especial de Comunicação Social – cargo que exerceu com eficiência, empenho e capacidade de liderança. No dia a dia, discutia a pauta, escalava repórteres e estimava com eles as possibilidades de cada matéria. Era, ofício,  um mestre.

(Na Paraíba, poucos livros foran  editados sem antes passar por sua revisão atenta – revisão que dava fluência gramatical e, não raro, sentido lógico ao texto (para alívio e glória do autor).

Apaixonado por cinema, Martinho Moreira Franco foi um dos fundadores, no Liceu Paraibano, do pioneiro Cineclube Charlie Chaplin, também responsável pela criação do “Borrão de Cinema”, revistinha impressa em mimeógrafo onde escreveu, ainda adolescente, seus primeiros artigos sobre filmes. Tais investidas críticas, mais tarde, serviram de passaporte para assinar qualificadas colunas de cinema nos jornais da cidade. Ele dizia: “Através do cinema, me divirto, viajo pelo mundo e aprendo coisas sem sair de casa”.

Mas o que diferencia o jornalismo de Martinho Moreira Franco daquele que, no dizer de Eça de Queiroz, exerce de forma ubíqua as funções do defunto de Satanás – ou seja, a faculdade de desinformar pelo falseamento da notícia e a interpretação fake dos fatos?

Simplesmente, manter o respeito pela realidade dos fatos e a busca incessante em levantar dados e elementos os mais completos para oferecer a informação exata e confiável ao leitor, princípios que dão substância e objetividade ao assentamento da boa ética jornalística comprometida com a busca da verdade.

Claro, há que considerar por trás de tudo o caráter, a consciência e o conhecimento inerentes à condição de de quem exerce o ofício. O jornalista Martinho Moreira Franco reunia todos esses atributos, creio que por formação e herança familiar. Leal como poucos, íntegro, solidário,  responsável e cônscio da própria dignidade, soube, durante meio século, transferir tais virtudes à labuta de fazer jornal .

O fato é que jornalismo hoje, com a ascensão do que chamam “direita” (conservadorismo), tornou-se um campo de batalha sem quartel alargado pelas hostes esquerdistas que, na dura realidade, perderam a “hegemonia” e o poder que os  mantinham intocáveis em boa parte do mundo. No histórico, Marx, Lenin  Gramsci e vestais do gênero tisnaram  a aura comunista. Como alternativa  estratégica, na mídia ou fora dela, a agenda esquerdista aponta agora para o confronto de valores culturais, justo no espaço onde a trincheira do conservadorismo se ergue alicerçada na perenidade da tradição judaico-cristã e nos valores consagrados pela  democracia levantada pelos gregos e seus filósofos – em particular, Sócrates, Platão e Aristóteles.

Na minha visão, o jornalista Martinho Moreira Franco se recusou entrar na guerra sem quartel da mídia dominada pelo “fake news” e pela militância partidária que avassalou a imprensa escrita. (Só para demonstrar o óbvio, jornais tidos como “grandes”, que circulavam com até 200 mil exemplares diários, hoje estão com vendendo entre 50 e 80 mil exemplares – casos do “Estadão”, “O Globo” e “Folha de S. Paulo”, evidência inequívoca da falta de credibilidade e a inelutáel decadência da mídia impressa.

Enfim, eis a nota pesarosa: o jornalista Martinho Moreira Franco  morreu no início do mês em odor de santidade aos 74 anos, em João Pessoa-PB, vitimado por câncer intestinal após duas cirurgias. Nos últimos tempos, escrevia crônicas semanais com verve e observações sutis sobre arte, vida, tipos humanos e contradições da existência cotidiana. Tinha público cativo e era lido com prazer.

O nosso saudoso amigo também não quis escrever em sites nem compartilhar contas em redes sociais.

Homem de tinta e papel, tampouco aderiu ao jornalismo digital. Ficou na dele.

Mas, curiosamente, é no amplo espaço do jornalismo digital de sites, blogs e youtubers – alguns com milhares visualizações – que se desmonta as pretensões totalitárias da desinformação revolucionária. E o melhor: é lá que se pode confrontar a manipulação da grande mídia e suas torcidas interpretação dos fatos.

Martinho Moreira Franco, Deus o guarde em bom aconchego.

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