José Antonio Severo

Tucanos e petistas, abraçados na oposição

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Aécio Neves e Gleisi Hoffmann trocando afagos no plenário da Câmara? Tucanos e petistas de mãos dadas? Cena inconcebível até hoje, mas que daqui a dias será vista por todos. A única dúvida é qual dos dois partidos, PSDB ou PT, terá maior protagonismo na oposição ao governo de Jair Bolsonaro. A disputa já começou.

Embora alguns candidatos tucanos tenham declarado que votarão em Jair Bolsonaro e convidando seus eleitores a fazem o mesmo. Oficialmente, o PSDB está na oposição, a julgar pelos posicionamentos de seus líderes, como o presidente nacional, Geraldo Alckmin, o senador José Serra e, destacadamente, dentre outros, o emérito Fernando Henrique Cardoso.  O PT nem se fala, pois será o antagonista nato do novo governo.

O quadro geopolítico que emerge das eleições  é claro: São Paulo perde o comando da tropa, que pega a Via Dutra e segue para o Rio de Janeiro. Apenas um esclarecimento: essa situação não sai dos Jardins para aterrissar em Copacabana ou Ipanema/Leblon. O centro do poder nacional estará em nos bairros de Deodoro e Grajaú, Zona Norte do Rio.

Esses subúrbios citados, que compõem a região mais populosa e conservadora da antiga Guanabara, integram-se na macrorregião carioca que se expressa com o bairro símbolo da Zona Norte do Rio, a Tijuca. Seu líder histórico é o falecido Carlos Lacerda.

A futura aliança oposicionista ainda não foi tecida. Está sendo mencionada em encontros furtivos nos restaurantes da rua Haddock Lobo, em São Paulo, onde as lideranças tucanas e petistas relaxam nas suas horas de folga. Ainda não chegou à Vila Madalena, onde estão os lulistas empedernidos, que se arrepiam só de ouvir falar na ave do bico comprido. Entretanto, são disciplinados. Logo-logo estarão na linha de frente.

Esse realinhamento já pode ser observado em Minas Gerais, reduto do tucanato moderado e do petismo flexível: O governador Fernando Pimentel já mandou seus seguidores fecharem com o candidato Antônio Anastasia, do PSDB. Minas, como sempre, desde os tempos do café com leite, dá lições de política aos paulistas.  Pouco adianta, mas abre a porta que estava com dobradiças enferrujadas, dando passagem para antigos encontros.

Com isto também começa a recomposição da vertente de centro-esquerda gestada em São Paulo ainda nos meados dos anos 1960, que deu origem aos partidos da Aliança Liberal, que enterrou a ditadura militar em 1984.

Essa frente rompeu-se a partir de 1980 com a defecção do PT das fileiras do antigo MDB, depois outra vez cindido com a dissidência dos tucanos. Esses três formavam o núcleo desse sistema de forças que era também integrado pelos comunistas, brizolistas (no Rio e RGS) e outras facções menores. Agora pode se juntar de novo para enfrentar a direita real.

Naqueles anos de chumbo, a base de resistência ao regime militar vinha do antigo MDB, organizado e liderado pelos deputados paulistas Ulisses Guimarães e André Franco Montoro, com apoio do empresariado liberal.

Nesse tempo constituiu-se o famoso Grupo dos Oito, que fez uma dissidência empresarial que tomou o poder na Fiesp, elegendo Luiz Eulálio de Bueno Vidigal, liderada por Antônio Ermírio de Morais, Severo Gomes, Claudio Bardella e alguns apoios expressivos em outros estados, como Jorge Gerdau Johannpeter e Paulo Velhinho, no Rio Grande do Sul.

Essa frente de empresários e políticos da oposição, já nos anos 1970 recebeu a adesão de novas lideranças poderosas vindas da esquerda, como do acadêmico Fernando Henrique Cardoso e do sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva.

Essa vertente paulista foi agora derrotada nas urnas neste primeiro turno de 2018, pela reação vertiginosa das classes médias conservadoras, capitaneadas pelo líder das pesquisas, Jair Bolsonaro. A se confirmarem os resultados destas enquetes, tucanos e petistas uma vez mais estarão na mesma vala. Tudo como dantes, no quartel de Abrantes.

José Antonio Severo é jornalista. Foi editor executivo da revista Exame, editor e diretor da Gazeta Mercantil, editor chefe do Jornal da Globo e diretor geral de Jornalismo da Rede Bandeirantes. É autor, dentre outros, dos livros “Os Senhores da Guerra” (L&PM Editores) e “Cem Anos de Guerra no Continente Americano” (Editora Record). 

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