Ney Lopes

Ser ou não ser, Doutor

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É impressionante como o clima político brasileiro está marcado pela polarização. Agora, o que se discute, em tom de catástrofe, é se o novo ministro da Educação Carlos Alberto Decotelli é” doutor, ou não é doutor”.

De saída, cabe esclarecer, que esse não é um pré-requisito para alguém ser indicado para o MEC.

Não conheço o professor Decotelli, mas o relato da sua vida inspira confiança, independente dos títulos acadêmicos que tenha. Ele comandou o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), autarquia ligada ao MEC e, segundo secretários de educação de todo o país, fez excelente trabalho, marcado pelo diálogo democrático.

O fato de ser militar, em nada desabona. Vetá-lo por isso, seria discriminação. O que se se reprova são as indicações, quer sejam de militares, ou outros profissionais, beneficiarem pessoas, com cargos para os quais não tenham titulação, ou experiência para a área específica.

O sr. Donatelli é um acadêmico, professor há anos. Teve vínculo como docente, inclusive, na Fundação Getúlio Vargas, centro acadêmico de credibilidade internacional, além da Fundação Dom Cabral, considerada a 10ª melhor escola de finanças e economia do mundo, de acordo com o ranking de educação executiva, do jornal britânico “Financial Times”.

A história revela nomes, que mostraram competência, até sem serem “doutores”.

Olavo Bilac, parnasiano, fundador da Academia Brasileira de Letras, poeta (criador do hino à bandeira), frequentou as faculdades de Medicina e de Direito, entretanto, não concluiu nenhuma.

Machado de Assis, um dos maiores escritores brasileiros, um dos fundadores e também o primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras, sequer fez curso superior. Albert Einstein foi um dos autodidatas mais famosos do mundo, o pai da Teoria da Relatividade.

Bill Gates, que realizou a chamada revolução do computador, foi admitido na Universidade de Harvard, mas abandonou o curso. Por que somente o professor Carlos Alberto Decotelli deve ser considerado inapto para o exercício de um cargo, cujo objeto de trabalho (educação) ele exerceu toda vida?

É hora de poupar o Brasil de tanto “disse me disse”.

O pecado venial do indicado foi colocar o doutorado argentino no seu currículo. Mas, o fez de boa-fé. Em verdade, ele frequentou as aulas, durante dois anos. Apenas, não apresentou a tese final. Forçado, por circunstancias de sobrevivência familiar num país estrangeiro, teve que retornar ao Brasil.

É hora de “voto de confiança” no novo Ministro da Educação. A reconstrução, após a pandemia, dependerá da sensibilidade, sobretudo “social” do gestor da educação brasileira.

Afinal, essa área não pode ser usada como “negócio lucrativo”. Se a estatização é desaconselhada, com a mesma ênfase (ou mais) a privatização deve ser contida e regulada pelo Estado.

Veja-se o exemplo dos governos do PT, ao mudar o nome do “crédito educativo”, que financiava inclusive o estudante da universidade pública. Lula deu a denominação de FIES para favorecer Universidades privadas. A estratégia petista se transformou numa fonte de corrupção, ao destinar recursos exclusivamente às faculdades privadas. Os estudantes de Universidades públicas foram excluídos.
Relatório do TCU mostrou mais de 55 bilhões de reais desviados do FIES pela liberação privada de financiamentos “fictícios”.

“Ser ou não ser Doutor”, pouco importará para o professor Carlos Alberto Decotelli reconstruir pontes do MEC com Estados, municípios, Congresso e Judiciário. O seu perfil é de diplomata e de austeridade.
Que Deus o ajude!

Ney Lopes – jornalista, advogado, ex-deputado federal; ex-presidente do Parlamento Latino-Americano, procurador federal – nl@neylopes.com.br – blogdoneylopes.com.br

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