Ney Lopes

Rumos da política brasileira

acessibilidade:

A cada dia aumenta a preocupação, com as sucessivas crises políticas no Brasil.

Ninguém avalia o que poderá acontecer.

O que se observa é o país polarizado. Uns vão para um lado e outros para o outro, enquanto a Internet dá voz às pessoas, gerando verdadeira guerra de versões distorcidas sobre os fatos.

Os últimos exemplos envolvem o presidente Bolsonaro e o general Eduardo Pazuello, nos acontecimentos de domingo, 23, no Rio de Janeiro e o atuação de certos parlamentares na CPI, ao inquirirem testemunhas de forma agressiva, além de usarem em suas declarações termos chulos, como vagabundo, mentiroso, canalha

Em momento tão delicado, com alertas de terceira onda da pandemia, a realização do chamado passeio de motos no Rio de Janeiro poderia ter sido evitado.

Como se não bastasse, o palanque de discursos subiu o general da ativa, Eduardo Pazuello, que recebeu ovações, como se fosse também candidato.

O próprio Exército insurgiu-se contra o General, que fizera depoimento seguro na CPI, quando deu as suas versões dos fatos da pandemia.

Com esse “novo” comportamento, ele auto justificou a sua reconvocação à CPI e chegará com o ônus de não usar máscara e discursar em palanque eleitoral, no Rio de Janeiro.

Acerca da CPI da Covid no Senado, um amigo de boa formação intelectual resumiu a sua opinião, afirmando: “É parecida com um ringue, com torcidas e plateia formadas. Não é esse o espírito republicano e democrático”.

Observe-se, que jamais pode ser desvalorizada a competência de uma CPI.

Entretanto, no rito dessa investigação, as testemunhas não podem tratadas como réu confesso e ameaçadas de prisão. É dogma constitucional, a presunção de inocência, que constitui “princípio de eterna justiça” (Carrara).

Para a CPI qualificar a testemunha de mentirosa terá que haver demonstração objetiva e clara das inverdades ditas, sendo o material colhido enviado ao MP para, se for o caso, encaminhar o procedimento legal cabível.

Observe-se que no crime de falso testemunho é questionável a prisão, tendo em vista tratar-se de delito que cabe retratação, no caso da CPI, até a aprovação do relatório final.

Caso não haja obediência ao rito de procedimento, gera-se dúvida sobre se o acusador estaria protegido ou não, pela imunidade parlamentar.

A Ministra Rosa Weber no Agravo de Instrumento Pet. 5.714 decidiu que “A verbalização da representação parlamentar não contempla ofensas pessoais, via achincalhamentos ou licenciosidade da fala. Placita, contudo, modelo de expressão não protocolar, ou mesmo desabrido, em manifestações muitas vezes ácidas, jocosas, mordazes, ou até impiedosas, em que o vernáculo contundente, ainda que acaso deplorável no patamar de respeito mútuo a que se aspira em uma sociedade civilizada, embala a exposição do ponto de vista do orador”.

Em análise, o “Nexo jornal” registrou, que as distorções notadas na CPI fazem com que a Comissão mobilize milhares de mensagens e cause a espetacularização da política.

A nação quer conhecer a verdade. Afinal, estão em jogo milhares de vidas humanas.

Porém, não será demasia lembrar, que para atingir tal objetivo, a investigação deverá repelir práticas autoritárias, somente usadas no Brasil, durante a vigência do AI 5, quando inexistia o devido processo legal, com as garantias individuais suspensas.

Esse período não pode ser ressuscitado.

Para isso, a CPI terá que usar métodos que respeitem o direito de defesa, o silencio do depoente, o princípio do “ônus provando”, que obriga quem faz a acusação prová-la e preservação das liberdades públicas.

O destempero e a agressividade nos trabalhos da CPI, colaboram com a reeleição de Bolsonaro, ao transformá-lo em vítima.

Por outro lado, o presidente ajuda a pavimentar o retorno de Lula ao poder, quando desafia condutas sanitárias, recomendadas durante a pandemia.

Verdadeiro jogo de “perde e ganha”.

Diante dessa conjuntura nacional conturbada, vem à mente o filme de Woody Allen “Roda Gigante”, cuja mensagem final é de que a “roda gira, gira, mas termina no mesmo lugar”.

Os brasileiros não desejam que a “roda gigante” da política nacional estacione sempre no mesmo lugar.

Esperam vê-la aperfeiçoada, em benefício de todos.

Ney Lopes – jornalista, advogado, ex-deputado federal; ex-presidente do Parlamento Latino Americano (PARLATINO); e- Presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara; procurador federal; professor de Direito Constitucional da UFRN – nl@neylopes.com.br – blogdoneylopes.com.br

Reportar Erro