Francisco Maia

Recado do medo

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O mundo mudou de repente. É impossível que voltemos ao passado para consertar a história, mas todos nós podemos recomeçar agora e desenhar um novo fim. As grandes crises servem para construir o “novo normal” com inteligência e criatividade.

Todo o setor produtivo e particularmente o comércio está convalescendo da epidemia e enfrentando de perto uma nova realidade. Cinco pontos estruturais surgiram para organizar a vida nova. Os idosos e os pobres perderam o medo do computador e descobriram a trilha da Internet; os produtos nos chegam, em vez de
compra-los fora de casa; alguns trabalhadores mostraram produzir melhor e barato no trabalho em residências; e as máscaras ensinaram que o perigo está sempre perto e vive no ar.

Assim como nas tragédias gregas, o quinto ato é sempre ameaçador: a população adquiriu medo. Medo de sair de casa.

O comércio amarga o café frio que o destino serviu com a baixa presença de fregueses depois da reabertura.
Nos shoppings o prejuízo é palpável. Em Brasília, no início da pandemia, já havia a previsão de que 350 lojas não resistiriam, mas hoje a realidade pode beirar 850 estabelecimentos. Bares e restaurantes são o patinho feio da crise. Há uma estimativa de que 900 estabelecimentos não retornem ao novo normal, assim como os sobreviventes que abriram as portas, estão tendo mesas vazias, solitários clientes e garçons parados.

Aquilo que pode ser o fim para alguns, para outros é o início de um novo projeto. Os serviços de delivery estão tendo um crescimento de 40%. Esse serviço de entregas de refeição já inspira outros empreendedores: despachos avulsos à domicílio.

Atualmente, apenas grandes organizações de comércio, como magazines, loja atacados e supermercados, possuem uma organização logística que atenda nas residências. Por isso, empreendedores corajosos acham encontrar o endereço da mina. A exemplo dos entregadores de fast-foods, surgirá um exército de motoqueiros uniformizados na cidade para atender a quem comprou pela internet.

De forma geral o varejo variado sofre com o medo das ruas. No shoppings o choque é impactante por uma diminuição de vendas da ordem de 80%. Agora, em Brasília, cerca de 50% das lojas temem o pior, pois mostram como exemplo as taxas de crescimento das vendas em grandes datas. O Dia das Mães no ano passado vendeu aproximadamente 500 milhões de reais, em 2020, mal chegou aos 20 milhões. Agora para o Dia dos Pais, com otimismo pretendem chegar a 1% em relação ao movimento de 2019.
Velho provérbio chinês pode dar consolo nesses momentos cinzentos ‘jamais se desespere em meio as sombrias aflições de sua vida, pois das nuvens mais negras cai água límpida e fecunda.”

O nó da questão é que em economia não existe milagre nem almoço grátis. Essa chuva de água límpida só pode acontecer se alguém se dispuser a pagar a conta do garçom. Um valor tão significativo, que só o tesouro da União poderá socorrer, orientado por diretrizes políticas. Afinal, a economia é uma coisa tão séria, que não pode ser tratada só por economistas.

É necessário ter a plena consciência de que a pandemia Covid-19 empobreceu o mundo. Todos, indistintamente perderam vidas humanas e recursos financeiros. Assim como atingiu pessoas, acertou de frente os países. Cada nação precisa se antecipar e proteger sua economia, considerando, que economia é feita força de trabalho e capital. Antes que os cidadãos entrem em falência física, primeiro o Estado tem que diminuir suas reservas.

Para evitar o colapso da vida econômica de suas populações, o Conselho Europeu aprovou um pacote de 1,8 trilhão de euros ( R$ 11 trilhões ).

O Brasil, até junho deste ano, tinha 336,8 bilhões de dólares em divisas internacionais. Este é um dinheiro que serve de lastro para a saúde de nossa economia. Poupança internacional para tempos de paz, mas é bom lembrar, que estamos em economia de guerra. Guerra nos hospitais, cidades, nas ruas, casas e no comércio.

Todos estamos perdendo, mas o Estado deve vir em primeiro lugar. Ele é o escudo que primeiro protege o país.

O Brasil é um país que exibe a fé como cartão de visitas. Que possa valer nesse momento ao relembrar o carinhoso consolo do saudoso Dom Helder Câmara, cardeal im pectoris do Vaticano e arcebispo de Olinda e Recife: ” quanto mais negra é a noite, mais podemos acreditar que está chegando o amanhecer. “

Francisco Maia é presidente da Fecomércio-DF (Fecomércio, Sesc, Senac, Instituto Fecomercio).

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