Maria José Rocha Lima

Por um Pacto Suprapartidário pela Educação 

acessibilidade:

O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, clamou por um pacto suprapartidário pela educação. Depois de se pronunciar sobre o momento difícil que vive o Brasil, o ministro  afirmou que “ o novo presidente deve procurar denominadores comuns, consensos básicos capazes de unir todos os brasileiros”.
Para  o ministro,  são três:  a) um pacto de integridade para substituir o pacto oligárquico que tem prevalecido até aqui. Um pacto de integridade para elevar a ética geral do país envolve duas regras: (i) na ética pública, não desviar dinheiro nem ceder às chantagens fisiológicas da velha política; e (ii) na ética privada, não passar os outros para trás. O pacto de integridade precisa de uma reforma política capaz de baratear o custo das eleições, aumentar a representatividade democrática do Congresso e facilitar a governabilidade. Eu continuo a achar que deveríamos experimentar o voto distrital misto, no modelo alemão; b) um pacto pela responsabilidade fiscal. Foi o descontrole das contas públicas que nos trouxe a este quadro de recessão, desemprego e desinvestimento. A urgência da reforma da previdência não é uma questão ideológica, mas aritmética. Se não fizermos logo, vamos entregar um país arruinado para os nossos filhos. Também é preciso acabar com o aparelhamento político das empresas estatais com gente desonesta. Provavelmente, a melhor solução será vender boa parte delas;  c) um pacto suprapartidário pela educação.

Professores “são
músculos e ossos”
do sistema educacional

Chama-nos a atenção este ponto.  O ministro  Barroso relembra  quando da sucessão da presidente Dilma Roussef, pelo presidente Michel Temer, que a grande discussão entre os formadores de opinião era quem seria o ministro da Fazenda, quem seria o presidente do Banco Central, quem seria o presidente do BNDES. A educação, que todos dizem que é prioridade, entrou no racha geral. Precisamos dos melhores nomes, dos projetos que deram certo pelo mundo afora e precisamos blindar a educação do varejo da política. Tivemos cinco ministros da Educação em quatro anos e meio. Não há política pública que resista a essa descontinuidade.
Disse ainda, o ministro, que, ao contrário de outras áreas, em tema de educação já temos alguns diagnósticos precisos: (i) não alfabetização da criança na idade certa; (ii) evasão escolar no ensino médio; e (iii) déficit de aprendizado, isto é, os jovens terminam o ensino fundamental e o ensino médio sem ter aprendido o essencial. E há uma solução que tem sido chancelada por pesquisas recentes: a ênfase na educação infantil de zero a três anos, fase em que o cérebro da criança é uma esponja que absorve todas as informações que lhe são passadas. Esta é a hora de dar nutrição, afeto, respeito, valores e capacidades cognitivas”.
O ministro propõe o pacto, aponta soluções de alguns problemas e expõe a demagogia da maioria dos governantes, executivos e legisladores brasileiros, que discursam sobre educação como prioridade, mas a prática atropela o discurso. Eu achei admirável a denúncia acompanhada de proposta. Corroboramos a posição do ministro Barroso de que nos discursos a educação é prioridade, os professores “são músculos e ossos” do sistema educacional , mas nos atos políticos e legislativos são mantidas a dedicação de má qualidade e largas parcelas da população analfabetas.
Incrível que, sendo um profissional do Direito, recite com convicção os grandes males que afligem a nação, no campo da educação: a não alfabetização das crianças; a evasão, especialmente no ensino médio, o déficit de aprendizagem e o não atendimento na educação infantil, especialmente nos 1.000 dias de vida que decidem o futuro das crianças e  do país.
Tem razão o ministro quando aponta os problemas  e o que já sabemos sobre as soluções. No dia 15 de maio de 2018, o ex-ministro da Educação Rossieli Soares foi à Comissão de Educação do Senado e apresentou dados catastróficos sobre educação. Foram inimagináveis as taxas de insucesso escolar apresentadas pelo ex-ministro do Governo Temer:  no 3º ano do ensino fundamental, 370 mil crianças são reprovados ou abandonam a escola. No 6º ano, 570 mil crianças são reprovadas ou abandonam. No terceiro ano, no Norte e Nordeste, 70% das crianças de 8  anos são  analfabetas. E nas demais regiões do Brasil são analfabetas 50% das crianças, no 3º ano, isto é, não sabem ler e escrever com 8 anos.

Escola brasileira
é um depósito
de crianças

No 1º ano do ensino médio, 791 mil adolescentes são reprovados ou abandonam a escola. Temos perdido muitos jovens nesse percurso, que se encaminham para o subemprego ou para o tráfico de drogas. Também foi do senador Roberto Muniz a conclusão, acompanhada de desapontamento, de que escola brasileira é um depósito de crianças. O insucesso, o fracasso na alfabetização é um desafio gigantesco.
Desde 2011, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica –IDEB- brasileiro está estagnado. As taxas de insucesso na educação básica são assustadoras. Eu nunca tinha visto um ministro denunciar tantos problemas e com tanta elegância e desassombro como Rossielli.
Como afirmava um professor baiano, o catedrático Hermes Teixeira  Melo:  “Importante registrar que os problemas são seculares e profundamente conhecidos, suas soluções também, entretanto, entre os discursos elaborados pelos políticos e suas ações no exercício do poder, identificam–se as suas verdadeiras intenções. Corroborando as  afirmações de Hermes Teixera  de Melo(1994), cito um relatório do Império, de 1848, do Ministro José Carlos de Almeida Torres, no qual ele registra: O quadro da instrução pública primária oferece um aspecto melancólico e triste e isto tem quatro causas: falta de idoneidade e conhecimento dos mestres; o profundo descontentamento dos mestres por falta de proteção do poder público e de recompensa pecuniária; a deficiência dos métodos de ensino  e a inadequação dos prédios para as escolas. (LIMA apud Freire, 1994)
Qualquer pacto que trate da educação inclui quatro das condições:  formação sólida inicial e continuada dos professores, especialmente para as classes de alfabetização. Está mais do que claro que alfabetização não é tarefa para leigos;  condições salariais dignas e carreira atraente;  condições condignas de trabalho, com  jornada que inclua a reserva de horas para estudo, planejamento, atividades extra – classe; ambiente escolar e equipamentos e materiais adequados. Escolas nas quais os professores se sintam satisfeitos e os alunos tenham gosto de frequentá-las. Nenhuma dessas causas dos problemas e soluções  pode  ser considerada novidade, uma vez que já figuravam nos relatórios de ministros do império e da República.

Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em educação. Foi deputada estadual da Bahia de 1991 -1999 e é Fundadora da Casa da Educação Anísio Teixeira.

Reportar Erro