Paulo Castelo Branco

Ilhados

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Domingo, sol escaldante, e eu navegando no caiaque deixado por meu filho, quando se mudou para São Paulo. Não examinei o barco, e o reboquei até às margens do Lago Paranoá. Antes de entrar no barco, mergulhei na água fria e plácidas. Havia um bom tempo que não me animava a remar.

Saí, em remadas lentas, apreciando o movimento dos jovens em suas lanchas e jets sky  rápidos,  provocando pequenas marolas. Na altura da Ponte JK, um grupo disputava corridas, fazendo não mais marolas, mas sim ondas sucessivas e fortes. Na passagem por mim, fui surpreendido por uma vaga que fez virar a embarcação. Na água, sem o necessário colete, tentei pegar o caiaque, mas ele afundou. Olhei para os lados e decidi nadar para a margem esquerda que estava mais próxima. O preparo físico do então menino de praia, no Rio de Janeiro, já não fazia parte de mim.

Bem próximo à margem, percebi a presença de um homem sentado na minúscula ilha existente no lago. Cansado, decidi descansar um pouco na ilha. O homem ficou olhando impassível com cenho franzido.

Cumprimentei-o com um bom dia, ele fez sinal de ok. Sentei-me ao seu lado onde havia um cinto de mergulho equipado com pequenos bolsos. Abriu um deles e me ofereceu um copo de chá mate e um biscoito “Globo”.

Disse meu nome, ele respondeu, selva! Eu, pé marrom, indaguei: – Você é militar?

– Fui, respondeu.

– Eu também fui pqd. Abriu um sorriso e iniciamos um bom papo. Disse que foi pqd e chegou a capitão.

– Você mora aqui perto?

– Na Vila Planalto.

– Veio nadando?

– Sim, desde menino nado em mar aberto.

– Eu também. Aí o papo ficou animado. Havíamos vivido próximos na Barra da Tijuca. Relembramos o tempo bom do Rio de Janeiro. Disse que vivia de uma pequena pensão e não precisava de mais nada. Nunca pensou em ser grandes coisas, queria viver livre, andar pelas ruas, comer pastel, beber caldo de cana e falar com as pessoas.

– Sofri uma intervenção cirúrgica que me deixou esta tatuagem horrorosa, mas que convivo bem com ela.

A cicatriz era realmente extensa, mas eu não quis manter o assunto. Falamos de futebol, família, religião e gente.

Afinal, ele abriu o coração e contou-me a sua incrível história de vida. Só acreditei que ele era o presidente, quando alguns jets e um barco da Marinha se aproximaram. Antes de os homens encostarem na ilha, perguntou-me:  – O que eu faço?

Faça como eu, nada! E pulamos na água em direção à margem.

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