Errado responsabilizar as hidrelétricas

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O Brasil está atravessando uma crise pluviométrica que estão chamando de hídrica. Em 2001 o setor elétrico passou por graves dificuldades chegando a proceder racionamento do suprimento de energia devido ao baixo nível dos reservatórios das hidroelétricas. A história se repete em 2021 e temos, segundo a última nota técnica do ONS, sérias dificuldades no suprimento de energia novamente devido ao baixo nível dos reservatórios.

Muitos especialistas têm surgido com opiniões sem a devida base técnica. Cada qual com uma recomendação diferente. Vários culpam a forte dependência de hidrelétricas como a causa desses problemas. E afirmam que isso seria resolvido simplesmente com o uso de outras fontes de energia.

ERRADO. A culpa não é das hidroelétricas. Se tivemos esse problema em 2001 porque voltamos a tê-lo em 2021?

A resposta é simples. Nesses vinte anos instalamos mais de 20.000 MW de hidrelétricas SEM RESERVATÓRIO.

O setor elétrico brasileiro iniciou seu planejamento de forma sistemática na década de 1960 pela contratação do grupo CANANBRA. Nosso sistema teve base hidroelétrica por décadas seguidas sem problemas devido a um planejamento adequado.  Tínhamos reservatórios de energia para enfrentar o chamado período crítico plurianual com repetição das baixas vazões de 1952-1956.

Nos últimos vinte anos a geração adicionada foi totalmente sem reserva de energia, principalmente em hidrelétricas sem reservatório, usinas de biomassa, eólicas e mais recentemente solares.

FALTA RESERVA AO SISTEMA. A simples introdução de outras fontes, principalmente por fontes intermitentes, não resolverá o problema da falta de reserva de energia.

A totalidade da capacidade de armazenamento de energia em todos os reservatórios de todas as regiões (Norte, Nordeste, Sudeste, Centro Oeste e Sul) representa 33,4% da geração total do SIN havida no ano de 2019. Somente a geração hidroelétrica havida em 2019 (que foi um ano seco) representa 90% a mais que toda a energia armazenada, ou seja, a geração hidroelétrica correspondeu a toda capacidade armazenada mais 90% resultante de energia afluente nesse mesmo ano.

Adicione-se a isso que, sem novos reservatórios e com grande capacidade de geração implantada nas usinas dos rios Madeira e Xingu, a operação modificou-se. O setor passou a priorizar (como deveria) a geração dessas usinas para evitar perda de energia por vertimento e com isso os reservatórios do sudeste (os maiores do sistema) passaram a operar em ciclo de deplecionamento anual e não plurianual.

A tabela abaixo demonstra:

Verifica-se que nesses vinte anos o total de energia armazenada não ultrapassou 90% em nenhum ano e a partir de 2012 com a entrada em operação das usinas do Norte o deplecionamento tornou-se forte anualmente.

Deve-se considerar também o efeito do aquecimento global que tem causado secas mais frequentes. Porém, também tem causado inundações mais frequentes. Portanto, reservatórios poderiam atenuar ambos efeitos.

A chamada Crise Hidráulica que tanto tem chamado atenção, não deveria ser surpresa pois trata-se de ocorrência natural e cuja tendência já se vinha observando nos últimos dez anos.

A possível escassez de água e de energia elétrica é mais o resultado da falta de planejamento, resultando em falta de reservatórios, e falta de adequada política operacional, tanto no uso da água quanto na geração de eletricidade.  A falta de reserva de energia no sistema elétrico tem obrigado ao deplecionamento dos reservatórios em todos os anos, o que aumenta o risco.

O próprio ONS indica no PEN (Plano de Operação Energética) 2020-2024 que “a capacidade de armazenamento do SIN e de 219 GWmês uma das maiores do mundo. Todavia o grau de regularização continuará reduzindo nos próximos anos, aumentando tanto a dependência de períodos chuvosos para o replecionamento dos reservatórios a cada ciclo hidrológico anual quanto a importância das condições de armazenamento iniciais no final da estação chuvosa (maio) para assegurar o pleno atendimento da carga”.

Esse trecho do PEN confirma o que afirmamos acima que a operação dos reservatórios passou ao ciclo anual e a capacidade de armazenamento não é suficiente para enfrentar períodos sucessivos de baixa hidraulicidade.

Ou seja, faltam reservatórios.

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