André Lopes

Em tempo de ataque às instituições, um convite à reflexão

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A confiança, aquela sensação apenas possível e confortada no ambiente da democracia, expressa o conteúdo da esperança no desenvolvimento social e econômico de uma nação soberana. Na cena pública, compreendida como sentimento, e fundada na segurança do texto constitucional, essa confiança se materializa na realização das ações do Estado em favor do interesse comum, orientadas pela pauta normativa e conformadas segundo um regime de atribuições para os titulares de atividades públicas, definido criteriosamente e ao conhecimento e alcance de todos

O processo democrático, essa marcha que se aprende e se aprimora no tempo, revela naturalmente imperfeições e sugere que boa dose de tolerância cuide de evitar distúrbios que possam nos levar a lugares onde o arbítrio pretenda habitar. Compreender o fenômeno democrático pressupõe, portanto, a consciência de que inconformismos com posturas institucionais não autoriza a agressão e ofensa às estruturas democráticas. Interessante entender que tolerância e paciência não se confundem com a resignação e aceitação de imposições à margem da Constituição, mas a compreensão dos protocolos normativos ao lado da exigência de observância da lei de modo indistinto por todos.

Os recentes ataques ao Supremo Tribunal Federal, ao Congresso Nacional ou aos seus integrantes não permitem a interpretação de que o exercício da manifestação do pensamento se aperfeiçoou em conformidade com os comandos constitucionais que versam sobre liberdades. A livre expressão, direito fundamental tão caro à democracia não se legitima em atos de intolerância e nem se concretiza com ataques ao patrimônio público ou às pessoas. A crítica e o desejo por mudanças estruturais nas instituições do Estado são bem-vindas, salutares na evolução da consciência política e, bem por isso, devem ser estimulados, alimentados como resultado de uma alteração de paradigmas em um despertar de consciência coletiva, da vontade de um povo que clama por justiça social.

A liberdade de exteriorização do pensamento e o direito à informação em sentido amplo devem ser garantidos a todos e sem distinção de qualquer ordem. Convém advertir que essas liberdades não se confundem com atos que indiquem práticas delituosas e que vulnerem a paz social e a ordem pública, ou ainda movimentos que possam insinuar estratégias para conquistas eleitorais sob o preço da perturbação da lógica democrática. Nesse contexto, as instituições precisam ter a devida atenção ao fenômeno e o povo, credor da vontade constitucional e das boas práticas políticas, deve rechaçar posições voluntaristas, atuações e aventuras que não correspondem ao interesse da coletividade.

As instituições merecem credibilidade e respeito de todos, assim como também delas, é preciso exigir comportamentos adequados, atuações que honrem com as legítimas expectativas geradas ao povo, verdadeiro titular do poder do Estado. Na hipótese segundo a qual as expectativas não se mostrem configuradas, é necessário que se compreenda que existem meios jurídicos aptos para a renovação desses mecanismos de satisfação de vontade popular, sendo certo que a agressão não se entremostra um deles e a violação customizada contra a democracia não pode ser considerada luta.

O ordenamento jurídico do Estado estabelece regras de convivência que representam salvaguardas das liberdades públicas e essas liberdades apenas podem ser exercidas em plenitude diante das proteções institucionais. É nesse contexto que se afigura a importância das instituições, porque, elas se complementam na diversidade e protagonizam um papel importante no controle de tensões de interesses múltiplos. O relacionamento entre os poderes e órgãos do Estado segundo a legitimidade que as normas lhes conferem sedimenta o regime de direitos e obrigações que dá a compostura do Estado de Direito, e, isso sugere a paz, a ordem e a harmonia na convivência entre as pessoas.

O desrespeito às decisões judiciais frustra mandamentos conquistados no tempo e que são caros à manutenção da estabilidade democrática. O acinte à autoridade da norma aplicada ou interpretada representa um rompimento com os rumos da sociabilidade, um convite à tribalização das relações interpessoais e um retrocesso no processo civilizatório. As consequências para além da insuportabilidade política reverberam na dinâmica da economia cujo pragmatismo não aceita os desaforos das ideologias radicais excludentes.

A tutela de todos os poderes constituídos, Executivo, Legislativo e Judiciário é missão de todos, uma tarefa que se materializa na atividade contributiva e fiscalizatória de cada um, independentemente de agremiação partidária, sempre na aceitação das vontades constitucionais como resultantes de escolhas populares. Essa proteção às instituições é robustecia com o processo de conhecimento, um dever de todos para que se assimile sua importância na construção e amadurecimento de nossa ainda jovem democracia e não aceite se qualquer ato que importe em sua negativação.

André Lopes é professor de Direito Constitucional e analista político.

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