Maria Cristina Irigoyen Peduzzi

Condição feminina no universo do trabalho

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Fatos remotos e recentes são evocados para justificar o Dia Internacional da Mulher, oficializado pela ONU na década de 1970 e representativo da luta por igualdade e justiça, não só no universo do trabalho, mas em todas as áreas da vida humana.

As conquistas pela igualdade foram edificadas a partir do constitucionalismo desencadeado pelas revoluções americana e francesa e respectivas Declarações de 1776 e 1789, até alcançar a de gênero, como já protestava Olympe de Gouges em sua Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, de 1791.

A tradição histórica e cultural da desigualdade de gênero é bem retratada na literatura, desde Shakespeare, na tragédia em que Otelo matou Desdêmona por suspeita de infidelidade.

No século XIX começaram as primeiras conquistas feministas. O movimento pode ser visto como uma reação ao simbolismo do romance realista, em Madame Bovary, O Primo Basílio e Ana Karenina. Mulheres insatisfeitas com a exclusiva condição de esposas e donas de casa foram associadas à prática do adultério e advertidas, pela pena máxima.

Ainda na tradição do século XIX, autores de renome, como George Eliot e George Sand, eram mulheres que se utilizaram de nomes masculinos para ganhar espaço e visibilidade no mundo literário.

No século XX, Jorge Amado foca essa desigualdade em romances como Tocaia Grande e Terras do Sem Fim, assim como recente filme intitulado “A Esposa”, baseado em livro homônimo.

Como foi e está sendo continuamente superado esse processo histórico de desigualdade?

O Estado de Direito congrega duas noções de igualdade. Na acepção formal do Estado liberal burguês, é suficiente a regulamentação dos direitos pela lei,  igual para todos. Na acepção material, o Estado deve promover efetiva igualdade por meio de políticas e leis que considerem as necessidades particulares dos grupos desfavorecidos.

No Brasil, a conquista dos direitos políticos pelas mulheres, em 1932, foi precursora. Os direitos sociais tiveram relevante expressão a partir da CLT, em 1943. No plano dos direitos civis, a igualdade remonta ao ano de 1977 e se consolida com a Constituição da República em 1988. Normas constitucionais, internacionais e legais contemplaram a igualdade de gênero, como espécie do princípio da isonomia.

Hoje, a condição feminina no universo do trabalho tem ampla proteção legal, inclusive por meio de normas direcionadas à maternidade e impeditivas de discriminação.

Apesar disso, pesquisa realizada na Universidade de Harvard, observando um grupo de homens e mulheres com semelhante ou idêntica formação e expectativa profissional, constatou que ainda hoje existe uma menor proporção de mulheres em posições de liderança corporativa.

Como igualar os números e assegurar igualdade nas admissões e promoções?

É preciso considerar os fatores de disparidade. Por exemplo, a licença maternidade varia entre 4 e 6  meses, ao passo em que a licença paternidade varia entre 5 e 20 dias.

Países como Alemanha e Suécia estabelecem licença parental, com um período mínimo para a mulher e o restante compartilhado entre a mãe e o pai. Redesenha-se a divisão sexual do trabalho e desonera-se a mãe da exclusividade no cuidado da criança. Efetivam-se condições de igualdade no mercado de trabalho. É política inteligente, que afasta a circunstância do gênero na contratação, não compromete a Previdência e distribui encargos entre os empregadores da mãe e do pai.

Certo é que a concretização da igualdade de gênero alcança diversas esferas da vida humana, como o trabalho, a família, o convívio social, e exige permanente vigilância. O “8 de março” é dia de celebrar conquistas e persistir na busca por avanços.

Maria Cristina Irigoyen Peduzzi é a ministra presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Artigo publicado também no jornal
Folha de S. Paulo.

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