Faveco Corrêa

Brazilia rides again

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Excelente a entrevista da professora Deirdre McCloskey nas páginas amarelas da revista Veja da semana passada. Ela que, segundo a revista é “um ícone liberal”, lavou minha alma colocando o dedo na ferida, pontuando que “o peso desastroso do Estado brasileiro pode ser resumido em uma única palavra: Brasília”.

Eu sempre fui contra a construção da nova capital lá longe, no Planalto Central, principalmente porque ela iria separar o governo do povo.

Minha voz era uma das poucas distoantes num ambiente muito favorável ao sonho grandioso do Presidente Juscelino Kubitschek, que tinha conquistado a opinião pública com seu lema “50 anos em 5”. Garoto, ainda meio foca na redação do vespertino A Hora de Porto Alegre, eu defendia que, na minha opinião, o que Juscelino queria era erigir uma pirâmide para celebrar os feitos do seu período com o fizeram os faraós do Egito Queóps, Quefren e Miquerinos, há milhares de anos.

E que o Brasil pagaria caro por isso.

Vale citar novamente a professora McCloskey: “A ideia de construir uma capital no meio do nada pareceu gloriosa no momento em que surgiu. Mas gastanças comprometeram as gerações seguintes. Onde quer que haja megalomania governamental, é assim”.

Uma vez participei de uma comitiva de jornalistas gaúchos que foi ao Rio de Janeiro visitar o Palácio do Catete, então sede do governo, e entrevistar o Presidente. Naquele “entonces”, a simples viagem de Porto Alegre ao Rio já era uma aventura reservada a poucos: 6 horas de voo. Na reunião, não sei porque cargas d´água surgiu meu nome como o guri que escrevia furibundamente contra a obra. Por determinação de Juscelino, uma viagem ao canteiro no Planalto Central foi providenciada para os que quisessem enfrentar mais esta. E lá fui eu, sem nenhum tostão no bolso e com minha roupa do corpo, um terno azul marinho de nycron, que não amassava, completada por uma camisa volta ao mundo, daquelas que a gente lavava de noite e de manhã estava limpinha e impecável.

Embarcamos num DC3 da FAB e, muitas horas depois, chegamos lá.

Ainda do alto, quando nos aproximávamos do destino, dava para ver o imenso canteiro de obras da Novacap, uma imensidão de terra vermelha revolta que daria lugar à cidade projetada por Oscar Niemeyer, tida por muitos como uma obra prima da arquitetura moderna.

No que me diz respeito, o tiro saiu pela culatra. Fiquei revoltado com o que se estava fazendo e com a montanha de dinheiro que um país pobre como o nosso estava gastando. Na volta, toquei o pau com maior vigor ainda, e agora com conhecimento de causa.

E até hoje não mudei de opinião, para desagrado de dezenas de amigos meus que para lá foram e lá se estabeleceram. Muitos desses pioneiros ficaram ricos, mercê da sua visão, do seu trabalho e do seu mérito.

Vocês acham que se a Capital Federal fosse ainda no Rio de Janeiro muitos dos recentes desmandos produzidos pelas três esferas do poder teriam se consumado? Com o povo nas ruas, nas barbas dessa turma, marchando contra o Catete e o Palácio Monroe? Dificilmente. É bom lembrar que a proximidade da reação popular causou o fim do Governo Vargas e o seu suicídio.

Hoje estamos separados por milhares de quilômetros dos centros do poder, o que torna inviável uma marcha sobre a Capital Federal.  Só nos restam as redes sociais e as manifestações de rua, com esperança de que a voz do povo seja ouvida.

Enquanto isso o Congresso segue aprontando, como essa dos 30 bilhões de reais do orçamento impositivo, que retira das minguadas disponibilidades financeiras do Executivo uma parcela importante do que poderia aplicar discricionariamente no que julgasse melhor para a população, já que 94% dos recursos são destinados a despesas obrigatórias, entre as quais o pagamento da folha do funcionalismo e as aposentadorias. O presidente da Câmara tira fotos com reis e dignitários, como se Chefe de Estado fosse. Até parece que estamos num regime parlamentarista, que foi amplamente rejeitado em plebiscito.

O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, continua ignorando os reclamos da sociedade indignada, soltando ricos e poderosos a torto e a direito. A cada dia que passa, essa corte, na sua maioria, segue nos afrontando, como o fez no caso da possibilidade de prisão de criminosos condenados em segunda instância, que andam por aqui nas ruas ou viajando para o exterior às nossas custas, com o dinheiro que nos roubaram, como o ex presidente jararaca que se encontrou com o Papa e vai ser cidadão honorário de Paris. Que vergonha. É a santa impunidade, que conseguiram consolidar transformando o Brasil no país onde o crime compensa.

Agora estão com as barbas de molho, torcendo para que a manifestações programadas para 15 de março fracassem, com a inesperada ajuda do coronavirus.

Esquecem que quem semeia ventos colhe tempestades.

Faveco Corrêa é jornalista, publicitário e sócio da Brandmotion

Consultoria de Estratégia Empresarial, Fusões e Aquisições.

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