Sylvain Levy

Bolsonaro, o aprendiz

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Tudo indica que o Presidente Bolsonaro, ao contrário de seu congênere americano Donald Trump, consegue aprender no e com o exercício da presidência.

É possível a um presidente não pertencer a um partido político – Getúlio Vargas fez isso, mas não é possível ele não fazer política. Ao procurar o Centrão e nomear Ricardo Barros para líder do governo, Bolsonaro está fazendo política. Pode-se discordar dos objetos, dos objetivos e dos meios, pode-se denuncia-lo por trair seu discurso de campanha, mas é uma indicação segura que ele aprendeu que por mais individualista que seja, não é possível nem governar nem fazer política sozinho.

Isto nos leva a uma segunda observação: individualismo na política traz uma aproximação ao isolacionismo nas relações exteriores. Mesmo defendendo uma pauta conservadora de costumes o Itamaraty interrompeu sua pregação contra os organismos internacionais e o multilaterarismo. Outro aprendizado.

Mas talvez o mais importante dos ensinamentos venha com o programa Renda Brasil. No bojo das ações de combate ao coronavirus o Auxilio Emergencial foi percebido como uma estratégia de governo que poderia ser aplicada em maior escala e de forma mais permanente. A busca pela sua implantação deve estar mostrando ao presidente que ele pode sim fazer muitas coisas como governante e não se escudar em diatribes para manifestar a impossibilidade de fazer algo.

Bolsonaro deve estar se dando conta que fazer, que administrar, que se aproximar de outros níveis e setores de governo – estados, municípios e parlamento – o aproxima da população, muito mais que o belicismo de suas atitudes.

Agradar seus simpatizantes é muito menos que contribuir com o restante da população. As mais recentes pesquisas de opinião comprovam isso.

Bolsonaro ao brigar contra governadores e prefeitos, contra o isolamento e defender irrestritamente a cloroquina deixou passar uma oportunidade de liderar a luta contra o COVID 19 e passar a história como aquele que venceu o maior desafio deste século. Ao se fixar em suas impossibilidades de fazer (“o que o STF sentenciou”) Bolsonaro abdicou das suas capacidades de realizar. O Renda Brasil é a prova que suas mãos não estão amarradas.

Outro elemento para exemplificar esse “rito de passagem” é a sua atitude em relação as dificuldades orçamentárias e financeiras desse programa. Bolsonaro não está brigando contra os fatos, contra os números. Ele não manda fazer de qualquer maneira, ditatorialmente. Reconhece os problemas e briga sim, mas com o Ministro Paulo Guedes para que ele consiga os recursos. Briga com os fatos e números, não contra eles.

E esse parece ser o grande aprendizado. O maior poder do Presidente não está no grito nem no autoritarismo.

Se a oposição não for capaz de perceber essa transformação do Presidente suas dificuldades em 2022 serão muito maiores.

Sylvain Levy é psicanalista da SPB.

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