Ney Lopes

Após pandemia, a vez do Estado necessário

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O discurso recentemente pronunciado pelo secretário-geral da ONU Antônio Guterres é um “grito de alerta”, lúcido e humano, para quem deseje repensar as relações internacionais, após a pandemia. Ele falou em pronunciamento virtual, na recente comemoração do nascimento prisão por lutar contra o regime de ‘apartheid’ na África do Sul, antes de se tornar, em 1994, o primeiro Presidente negro do país.

Vaticinou que o planeta, após pandemia, será totalmente diferente e previu futuro centrado na solidariedade, com novas regras no trabalho, emprego, educação e segurança social.

Antecipou “Novo Mundo” baseado numa “globalização justa”. Esse acordo global terá como alicerce oportunidades iguais e garantia de poder e riqueza divididos de forma mais justa.

Em 2019, 2.153 bilionários do mundo tinham mais dinheiro do que 60% da população do planeta.  Essa estatística é a prova de que falharam os sistemas econômico, socais e político globais, em áreas como saúde pública, clima, desenvolvimento sustentável, paz, igualdade social.

A análise de Guterres alcançou a própria ONU, ao considerar que as desigualdades começam em organizações como a que ele representa, onde não há representatividade igual para todos os países. A observação feita traduz a realidade sem retoques, do mundo contemporâneo. Quem não enxergar a necessidade de mudanças, no sentido de reforçar à solidariedade social, estará na contramão da história.

Como disse Guterres “a covid-19” é como um “raio-x”, que mostra as fraturas da sociedade global, expostas nos sistemas de saúde e educação inadequados, lacunas na proteção social, desigualdades estruturais, degradação ambiental e climática.

Não há mais espaço para os discursos ultraliberal, ou ultraesquerda, de um lado pregando a utopia de redução do Estado (estado mínimo) e de outro o crescimento mastodôntico do estado, negando as liberdades públicas.

A ordem social global certamente terá como alicerce o “ponto médio”, que parte do estado como fator indispensável de controle social, consorciado com as liberdades individuais e públicas, nos planos político e econômico.

Somente assim, será possível a busca por futuro melhor, com dignidade, oportunidade e prosperidade para todos.

Como disse o secretário geral da ONUa, a pandemia, expõe “falácias e falsidades”, como, por exemplo, a mentira de que mercados livres podem distribuir cuidados de saúde para todos, a ilusão de que vivemos num mundo pós-racista, ou ainda o mito de que estamos todos no mesmo barco.

Portanto, não há como repetir-se a “asneira” de Estado mínimo, que só favorece o capital, nem o “estado agigantado”, que estimula a corrupção.

A aspiração global de reconstrução será do “estado necessário”, que possa estar ao lado do cidadão, como estímulo e incentivo ao desenvolvimento coletivo, na construção de um mundo pacífico, sustentável e igualitário.

Ney Lopes – jornalista, advogado, ex-deputado federal; ex-presidente do Parlamento Latino-Americano, procurador federal – nl@neylopes.com.br – blogdoneylopes.com.br

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